A provocação das professoras do Colégio Santa Dorotéia, na zona norte de Porto Alegre, rendeu mais do que um projeto escolar: por meio da abordagem do novo Ensino Médio (que reúne áreas distintas do conhecimento no currículo), os estudantes criaram um meio de locomoção para cães e gatos com deficiência. São cadeiras de rodas que têm como estrutura tubos de PVC colados nos encaixes e afixados a um eixo de ferro. O assento é de elástico, preso por uma fita de velcro.
Fabricados integralmente em sala de aula, os primeiros modelos foram doados nesta quinta-feira (29).
— É gratificante, participamos de todas as etapas: da liberdade de criar, escolher os materiais, colocar a mão na massa, até o resultado final — celebra Vítor Broker da Cunha, 15 anos, um dos 73 alunos das duas classes de 1º ano do Ensino Médio envolvidas na iniciativa.
Dez suportes ficaram prontos em cerca de dois meses e meio de trabalho. Ajudarão a vira-latas Moana e o gato paraplégico Pretinho a correrem atrás dos outros 80 animais acolhidos no sítio da Patrícia Hackmann, 51 anos.
— O projeto é muito bacana. Foram os alunos mesmos que me procuraram, pelo Instagram, e fizeram a proposta — afirma a protetora.
Moana vive há três anos no espaço de Patrícia, no bairro Belém Velho, zona sul da Capital. Pretinho chegou durante a pandemia, após ser abandonado pelo antigo tutor no Hospital Veterinário da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
— Algumas pessoas acham que não vale a pena investir em um animal com deficiência — lamenta a proprietária do lar para pets.
Enquanto contava a história do gatinho especial, a cuidadora foi interrompida pela estudante Rafaela de Souza, 15 anos. Precisava medir o tamanho do felino na cadeirinha. Após ouvir que “ele tá bem gordinho”, a estudante levou o equipamento de volta para a mesa e fez os ajustes necessários.
— É uma coisa muito especial. Quando a gente olhou, sabíamos que era esse o projeto — relembra a aluna.
Chegar ao protótipo exigiu uma série de encontros, formulados a partir da metodologia STEM – sigla que, em inglês, reúne as áreas de Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática. Com estes campos em mente, os alunos tiveram de criar, do zero, algo que lhes desse protagonismo, começando pelo brainstorm, a chuva de ideias.
Três propostas foram finalistas. A preferida, uma prótese para animais, acabou virando o projeto das cadeiras de rodas, executada em um espaço que lembra uma carpintaria bem equipada, de paredes repletas de ferramentas como parafusadeiras, pincéis e capacetes. Os objetos são manejados com supervisão dos educadores.
Além da responsabilidade, a gurizada precisou ir atrás de como construir e adaptar os suportes, explica a professora Aline Fagundes, 42 anos:
— Ensinar pela pesquisa é isso. Inspirar o interesse, fazer com que busquem a viabilidade, sustentabilidade e, como resultado, causar uma mudança na sociedade.
Enquanto os colegas se aglomeravam ao redor das mesas onde as cadeirinhas foram fabricadas, Davi Subtil, 15 anos, contribuía através de seus dons musicais: no caderno, ele compôs uma melodia, executada no piano da escola. O objetivo, segundo ele, é acalmar o estresse que a multidão venha a gerar nos animais.
— Me sinto bem com a música — garante o artista.