O Amazonas vive duas realidades distintas na educação do Estado desde que as aulas presenciais foram retomadas em meio à pandemia de coronavírus. No ensino privado, que recomeçou há dois meses, quase não há registros de covid-19 na comunidade escolar, apesar de a rede admitir não ter testado profissionais e alunos. Ao contrário das instituições particulares, as escolas estaduais, que retomaram as aulas do Ensino Médio em 10 de agosto, veem o número de casos aumentar diariamente. O Amazonas foi o primeiro Estado no Brasil a confirmar a volta às aulas presenciais.
Entre os 2.051 testes realizados em profissionais da educação que atuam nas escolas estaduais apenas de Manaus, entre 18 e 28 agosto, 629 testaram positivo para covid-19, segundo a Fundação de Vigilância em Saúde (FVS-AM). Destes, 476 estavam fora do período de transmissão e 153 com infecção recente. A FVS realizou um mutirão de testes rápidos depois da retomada das aulas.
Foram os primeiros resultados da testagem em massa e a pressão dos profissionais que levaram a Secretaria de Estado de Educação e Desporto (Seduc) a adiar o retorno presencial dos estudantes do Ensino Fundamental, previsto para ocorrer em 24 de agosto. Agora, não há data para a volta. Em entrevista ao G1, o governo afirmou que a mudança ocorreu para que as unidades de ensino passassem por preparação, e citou a necessidade de testar um número maior de profissionais da educação.
Desde o retorno às aulas da rede estadual, professores têm se mostrado contrários às atividades presenciais, alegando falta de testes e de preparo das escolas. Um grupo ligado ao Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Amazonas (Sinteam) chegou a acampar por 30 horas dentro da Seduc, entre quarta (2) e quinta-feira (3), para exigir uma reunião com o secretário da Educação, Luis Fabian Pereira Barbosa, que os atendeu uma única vez antes de anunciar a volta das atividades. Depois de uma negociação que contou com a intermediação do subsecretário da Casa Militar, coronel Audiney Oliveira, ficou agendada para a próxima quarta-feira (9), às 15h, a reunião com o secretário e com instituições como Ministério Público do Trabalho e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
— Antes de o governo nos proibir de visitarmos as escolas, fiscalizamos 24 instituições. Destas, constatamos que 21 estavam sem condições de receberem os alunos, pois não tinham janelas e funcionavam com o ar-condicionado ligado, já que, numa temperatura de 36ºC, com sensação térmica de 40ºC, fica impossível não ter ventilação. Além disso, nenhum profissional do interior do Estado ou aluno participou da testagem rápida realizada pelo governo — relata a presidente do Sinteam, Ana Cristina Rodrigues.
Outro problema apontado pelo Sindicato é a falta de sanitização das salas de aulas e dos prédios em geral. Enquanto o governo afirma que a higienização tem sido feita, a entidade alega que os próprios funcionários das escolas relatam não existir uma higienização diária. Na retomada das aulas, as máscaras distribuídas aos estudantes viraram assunto nacional por serem de tamanho muito maior do que o necessário. Alguns alunos chegaram a postar nas redes o rosto completamente coberto pelo equipamento de pano disponibilizado pelo governo.
Segundo o Sinteam, a rede básica estadual do Amazonas tem 447 mil alunos. Destes, 224 mil estão na capital Manaus. Entre os profissionais, são 30.117 em todo o Estado, sendo 22 mil professores. Só em Manaus são 11 mil docentes. Na quinta-feira (3), o sindicato obteve na Justiça a liberação para que os professores com mais de 60 anos ou com comorbidades continuem atuando de forma remota. O governo estaria obrigando esses profissionais a tirarem licença médica, o que lhe causaria perdas salariais.
— É um governo sem diálogo, mas vamos seguir reivindicando a volta das aulas remotas — garante Ana Cristina.
Durante dois dias, a reportagem de GZH tentou contato com a assessoria de imprensa da Seduc, por telefone e e-mail. Porém, não obteve retorno até o fechamento desta reportagem.
Na rede privada, combate surte efeito
Ao contrário da estadual, a rede municipal de Manaus manterá as atividades a distância por tempo indeterminado. E enquanto a situação não se resolve nas instituições estaduais, na rede privada o combate à covid-19 parece ter surtido efeito. De acordo com a presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino Privado do Amazonas (Sinepe), Elaine Saldanha, as 70 instituições afiliadas — da Educação Infantil ao Ensino Superior — se uniram para investir na aquisição de serviços de sanitização e produtos como termômetros, luvas, álcool gel 70%, óculos e máscaras, entre outros equipamentos de proteção individual (EPIs), para serem usados por alunos, professores e funcionários.
Escolas com até 500 alunos investiram pelo menos R$ 30 mil para a retomada das aulas. Em instituições com 4 mil alunos, o gasto ultrapassou R$ 150 mil — foi preciso comprar, por exemplo, câmeras e ampliar o cabeamento da rede de internet para atender alunos que preferiram continuar os estudos de forma remota.
No rígido protocolo assumido pelas entidades — cada uma também pode ter regras próprias além da linha geral — está o comprometimento de seguir no modelo híbrido, com metade da turma em sala e o restante em casa, além da determinação para os alunos usarem máscaras e ficarem descalços dentro da sala de aula.
A rede privada conta com 89.700 estudantes e cerca de 7 mil professores. Antes da retomada das aulas, o Sinepe fez um levantamento entre os docentes e constatou que 25% deles já haviam sido infectados pelo coronavírus. Desde o recomeço das aulas presenciais, em 6 de julho, porém, a entidade não realizou mais nenhum estudo para saber quantos profissionais e alunos tiveram covid-19.
— Toda semana, encaminhamos à Vigilância em Saúde um formulário indicando casos suspeitos e possíveis novos casos. É preciso gestão para fazer dar certo. A pandemia não foi controlada e, por isso, não podemos baixar a guarda. É atenção o tempo inteiro — finaliza Elaine.