A Secretaria Estadual de Educação (Seduc) pretende chamar professores voluntários e aposentados para darem aulas em escolas públicas do Rio Grande do Sul. Na próxima terça-feira (21), o governo deve publicar, no Diário Oficial, uma portaria para detalhar a seleção e o processo de voluntariado nas instituições. Analistas da área educacional questionam as medidas e afirmam que contribuem para precarizar o sistema e alertam para o risco de insegurança jurídica.
Pesquisadores da área da educação consultados desconhecem projetos em outros lugares iguais aos apresentados pelo governo estadual. De forma semelhante, o programa Amigos da Escola, promovido pela Rede Globo, é citado. Criada em 1999, a iniciativa consiste em incentivar voluntários a dar aulas no contraturno.
Na avaliação de Juca Gil, professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e especialista em políticas educacionais, a convocação de voluntários e de professores aposentados traz insegurança jurídica para todas as partes e, em comum, precariza o sistema.
— Para aulas de reforço, tudo bem, porque não são aulas formais. Mas e o resto? Escolas privadas não têm professor voluntário assim, isso não existe. Do ponto de vista político, é uma ação que descumpre a Constituição e demonstra desrespeito com a docência, porque voluntários e aposentados vão embora, não ficam ligados à escola. Juridicamente, o poder público coloca alguém sem responsabilidade funcional para cuidar dos estudantes. Como ela vai responder pelo que ocorre em sala de aula perante a escola e os alunos? Você não entra em um lugar e pede para falar com o voluntário. Essa situação é temerária para Estado, voluntário e estudantes — avalia.
Para Nara Nörnberg, doutora em Educação e professora na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), professores aposentados podem estar desatualizados e não aptos a acompanhar estudantes de uma geração hi-tech. Ela alerta, ainda, que voluntários têm alta rotatividade, o que pode prejudicar o aprendizado dos alunos.
— O professor faz a mediação do processo de aprendizagem, consciente dos conteúdos do plano de curso da escola. Como vou chamar um voluntário e largá-lo em sala de aula? Ele não tem o mesmo compromisso com a instituição. Ele vai só dar aula? Vai elaborar a prova também? O problema não é burocracia, é falta de planejamento do governo. Até porque a burocracia é o próprio governo que faz.
Saiba mais
• Os voluntários, a depender da carga horário disponibilizada, poderão ministrar aulas no campo em que sua licenciatura permite ou ministrar atividades no contraturno, como de reforço escolar. Pessoas não formadas na educação devem ficar de fora.
• A medida, neste caso, é baseada em duas legislações: a Lei Federal 9608/1998, que regrou o trabalho voluntário em empresas privadas e públicas, e a Lei Estadual 11.732/2002, sobre o voluntariado no serviço público gaúcho.
• No caso dos aposentados, a intenção do governo estadual é formar um banco de cadastro reserva. O profissional seria acionado para atuar, de forma temporária, em momentos específicos de necessidade da escola, como licença-prêmio, licença-saúde ou licença-maternidade de algum professor.
• O cadastro para aposentados, diz o governo, é baseado na Lei Estadual 11.126/1998, que institui o Cadastro de Colaboradores do Ensino, formado por membros inativos do Magistério Público Estadual. Pela lei, eles recebem valor em dinheiro pela "execução de programas e projetos especiais transitórios".
• Hoje, o governo estadual pode contratar professores para situações pontuais em um contrato emergencial. O contrato é temporário e tem tempo fechado, em geral para cobrir licenças.