A deflação de junho reforça a tendência de corte na taxa de juro básico do país no próximo mês. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) caiu 0,08 no mês passado, segundo dado divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta terça-feira (11). Esse foi o primeiro recuo no indicador no ano e a menor variação para o mês de junho desde 2017.
A retração na média dos preços, que se aproxima das projeções do mercado, amplia o ambiente favorável para o Banco Central começar a curva de queda da Selic na próxima reunião, marcada para os dias 1º e 2 de agosto. Agora, a dúvida paira sobre o tamanho da primeira lasca, aguardada por boa parte dos setores econômicos no país.
O economista André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), afirma que o IPCA de junho conversa com as expectativas, que apontavam queda de 0,10%. A deflação é explicada pela queda nos preços dos alimentos, dos combustíveis e dos veículos novos, impulsionada por benefício do governo federal. Braz destaca a desaceleração dos núcleos de inflação, que mostram uma informação preciosa ao BC na linha de que está realmente cedendo:
— Com o resultado de hoje (terça-feira), acho que tem uma relativa segurança para a autoridade monetária rever a Selic. Não só pelo número negativo, mas sim pelo efeito generalizado de descompressão da inflação.
Braz projeta corte a partir de agosto, mas de maneira mais tímida, em 0,25 ponto percentual. Revisões mais profundas devem ocorrer ao longo do segundo semestre, segundo o economista do FGV Ibre.
O que é o IPCA
A pesquisa, que é usada como inflação oficial do país, leva em conta as famílias com rendimentos de um a 40 salários mínimos residentes nas principais regiões do Brasil. O índice faz um levantamento mensal dos preços de diversos itens, que são comparados com os valores do mês anterior. A média desta cesta gera o índice geral. Na prática mostra a alta ou queda média dos preços ao consumidor.
Como é usado pelo governo
O governo federal usa o IPCA como referência para as metas de inflação, regime utilizado na maioria dos países para balizar a política monetária para controlar a alta de preços, e para as alterações na taxa de juro básico, a Selic.
Qual a influência do IPCA na Selic
Quando a inflação está alta, a autoridade monetária sobe a Selic para frear o crédito e a demanda da população, estabilizando os preços. No movimento contrário, o BC diminui a taxa para estimular o consumo e investimentos.
Menos incertezas
O economista-chefe da Suno Research, Gustavo Sung, afirma que a deflação de junho se soma a uma série de fatores que convergem para o cenário mais otimista para o início da reversão da curva da Selic no país. Dentro desse rol de influências, ele cita o câmbio mais favorável e a manutenção das metas de inflação, que reduz as incertezas:
— Isso fez com que as expectativas de inflação de longo prazo caíssem. Isso somado ao IPCA de junho abre uma janela boa de oportunidade para o Banco Central começar a cortar a Selic em agosto.
Sobre o tamanho do corte, Sung também estima uma redução de 0,25 ponto percentual na reunião de agosto. O economista justifica a projeção no histórico dos últimos posicionamentos da autoridade monetária, que prezou pela paciência e moderação:
— Acho que a diferença entre a minha visão e a de muitos que esperam 0,50 ponto percentual é um pouco do que o Banco Central vem comunicando nas últimas reuniões. De não tomar nenhuma decisão precipitada, muito incisiva e prezar por essa parcimônia no início do ciclo de queda de juro.
O economista André Perfeito também enxerga cenário de inflação sob controle, mesmo com situação um pouco incômoda em alguns núcleos, como o de serviços. Nesse sentido, a soma de preços contidos e horizonte mais otimista amplia as condições para talho na taxa de juro básico do país já na próxima reunião do Copom :
— O último Boletim Focus, divulgado na segunda-feira, mostrou a oitava semana seguida de queda na projeção de IPCA para 2023. Em linhas gerais, você tem uma situação mais favorável para iniciar o corte.
Perfeito reforça que a dúvida do momento paira sobre a intensidade do primeiro corte. O economista avalia que existe espaço para um corte mais robusto, de 0,50 ponto percentual, na próxima reunião. Ele calça essa possibilidade no histórico mais alongado do BC, que cortou o juro de maneira mais forte no início da pandemia e subiu com mais intensidade ante outros países nos últimos anos:
— Uma vez formada a convicção da autoridade monetária, eles tendem a agir de maneira bastante intensa. Se isso é verdade, eles podem iniciar o corte já por 0,50 na próxima reunião, na minha opinião.
IPCA nos próximos meses
Para os próximos meses, especialistas consultados pela reportagem de GZH estimam inflação com novas altas na variação mensal após a deflação de junho. Isso ocorre porque não serão mais registrados alguns fenômenos, como queda no preço dos combustíveis e no valor dos carros novos.
No acumulado de 12 meses, o índice também deve subir. Isso porque acaba o efeito das deflações observadas no segundo semestre do ano passado após renúncias fiscais em alguns itens, como combustíveis, na corrida eleitoral, conforme explica Braz:
— A partir do mês que vem começa a acelerar. Isso porque em julho, agosto e setembro do ano passado o IPCA registrou queda. E é difícil que neste ano, mesmo com a inflação mais controlada, a gente tenha quedas mais expressivas.
Braz afirma que, mesmo com a aceleração em 12 meses, isso não mostra descontrole da inflação, que segue perdendo fôlego, com descompressão inflacionária mais espalhada.