Desde o acordo de delação premiada fechado em 2020 e a falência da MMX em 2021, há poucas informações sobre como Eike Batista faz "para pagar as contas". Até então, o ex-bilionário tentou, entre 2018 e 2019, uma carreira de influencer de empreendedorismo — um pouco palestrante, um pouco consultor, um pouco youtuber. Já são três anos longe das redes sociais e dos holofotes, apesar de ter 1,1 milhão de seguidores no Twitter. No entanto, nesta quinta-feira (22), o empresário retornará ao showbiz com Eike: Tudo ou Nada, com o ator Nelson Freitas no papel do ex-bilionário. A cinebiografia tem o roteiro baseado no livro da jornalista Malu Gaspar sobre a ascensão e a queda de seu império.
Questionados sobre as atuais fontes de renda dele, os advogados do empresário, por meio da assessoria de imprensa, não responderam até a publicação deste texto. Nos bastidores, advogados que deixaram de trabalhar com o empresário já relataram a existência de dívidas, enquanto outros trabalham na expectativa de receber honorários ao fim dos processos.
Pelo menos um dos assessores financeiros que se sucederam na tentativa de deslindar os problemas também investiu recursos próprios e não tem esperanças de recuperar o dinheiro. Do lado das receitas, é certo que o empresário se manteve como controlador da OSX e do Mr. Lam, restaurante chinês mais renomado do Rio.
Após sair da recuperação judicial, a OSX opera com modelo enxuto. De fabricante de navios e operadora de sondas de exploração de petróleo do Grupo X, a empresa hoje vive da gestão da locação de áreas operacionais no Porto do Açu — a OSX seguiu gerindo a área arrendada para a construção do estaleiro que nunca saiu do papel, dentro do porto desenhado por Eike e hoje controlado pela Prumo Logística, uma sociedade do fundo americano EIG com o Mubadala, o multibilionário fundo soberano de Abu Dabi.
A área arrendada pela OSX hoje é alugada para diversos clientes. No primeiro trimestre, registrou receita líquida de R$ 8,2 milhões, mas um prejuízo líquido de R$ 145,5 milhões. Deficitária, a empresa não tem repassado dividendos aos acionistas nos últimos anos. Questionada se Eike recebeu alguma outra forma de remuneração, a OSX informou que "não se pronuncia sobre questões referentes a nenhum dos seus acionistas".
Já o Mr. Lam, fundado em 2006 mais como um hobby pessoal do que como um negócio para dar lucro, sempre foi minúsculo perto dos números do grupo. Seu capital social hoje é de R$ 8,2 milhões, conforme dados públicos da Receita Federal — uma gota perto de uma fortuna que atingiu US$ 30 bilhões em 2012.
Atualmente, o restaurante segue funcionando e atraindo clientes. Enfrentou dívidas trabalhistas, mas parece longe de problemas financeiros mais graves. Por outro lado, tampouco parece claro se rende lucro suficiente para repassar dividendos capazes de manter o padrão de vida de quem já teve bilhões de patrimônio.
O trabalho para sair do inferno astral passa pelo cumprimento do acordo de delação premiada — que inclui o pagamento de uma multa de nada menos que R$ 800 milhões — firmado com a Procuradoria-Geral da República (PGR).
A percepção de assessores financeiros que trabalharam recentemente com o empresário é de que apenas com as pendências criminais resolvidas ele poderá voltar a trabalhar em novos negócios. A volta por cima passa também por uma solução para a MMX, porque seu último ativo de valor mais elevado, um lote de títulos de dívida da mineradora Anglo American avaliado na casa de centenas de milhões, foi parar no processo de falência da companhia. Os dois temas andam juntos, porque o processo de falência da MMX tomou os títulos das mãos do empresário logo após ele oferecer os papéis como garantia de pagamento da multa milionária do acordo de colaboração.
Contatos
Desde 2021, Eike tem mantido contatos com envolvidos no processo de falência, principalmente por causa do processo de venda dos títulos da Anglo. O empresário chegou a ir a Belo Horizonte, no mês passado, na sede da vara do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG), onde corre um dos dois processos de falência da mineradora. Ele foi à audiência para abrir envelopes com os lances na terceira tentativa de leiloar os títulos da Anglo no processo de falência da MMX.
Ao lado de seus advogados, Eike assistiu a mais um fracasso. Em seguida, a 1ª Vara Empresarial de Belo Horizonte do TJ-MG determinou uma quarta tentativa de vender as debêntures e recebeu uma proposta do banco BTG Pactual. O próprio Eike e a Argenta Securities, corretora que fez uma das propostas ao longo das quatro tentativas de venda, recorreram da decisão. O processo acabou suspenso por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Pelo menos dois interlocutores de Eike nos últimos meses destacaram, sob condição do anonimato, sua postura otimista diante dos problemas. Segundo uma dessas pessoas, ele "está sempre pensando no futuro" e demonstra "muita vontade de voltar a empreender".
Influencer
Em uma tentativa de volta por cima como consultor e influencer, entre 2018 e agosto de 2019, o empresário publicava vídeos motivacionais, dava entrevistas e garantia que tinha mais de 10 projetos de negócios no forno.
— Já desenhei mais de 10 empresas de US$ 1 bilhão — disse Eike, em julho de 2019, quando se apresentou em um evento sobre empreendedorismo, em Florianópolis (SC), no qual foi recebido sob o grito de "ladrão". — São na área de mineração, onde sempre tive sucesso, não só no Brasil, mas também no Chile e nos Estados Unidos. Estou mexendo na área de nanotecnologia, química e de materiais, como o grafeno, que é o material do futuro.
Naquela entrevista, Eike falou sobre os "10 unicórnios", numa referência às startups que crescem rapidamente até valer US$ 1 bilhão, mas desviou de perguntas sobre quanto investiu nos projetos, quanto atraiu em investimentos de terceiros ou sobre quantos profissionais trabalhavam com ele.
Um ano antes, em agosto de 2018, já havia falado nos novos projetos de negócios, em longo depoimento ao Conexão Repórter, do SBT. Numa reportagem que mostra seu cotidiano em meio a essa tentativa de volta por cima, abrindo as portas de sua mansão no Jardim Botânico, na zona sul do Rio, Eike relata uma situação de patrimônio dilapidado, mas garante que ganha "muito bem" com suas consultorias. Em outro momento da entrevista ao SBT, chega a dizer que o trabalho de consultoria "vale" US$ 1 milhão por mês, porque "minha cabeça vale dinheiro", mas não fica claro se essa é a sua renda mensal.
Já em 2019, Eike voltaria a ser preso, em mais uma fase da Operação Lava-Jato tocada pela Procuradoria Regional fluminense do Ministério Público Federal (MPF). Esta segunda prisão logo seria revogada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), segunda instância do caso, mas parece ter marcado o fim da carreira de consultor e influencer.
Também chamou atenção para a necessidade de afastar de vez o fantasma de novas prisões, focando na negociação do acordo de colaboração premiada e no processo de recuperação judicial da MMX. O acordo de delação seria firmado em março de 2020 e, em novembro daquele ano, homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por envolver políticos com prerrogativa de foro privilegiado. Já a falência da mineradora foi decretada em 2021.