A procura por recuperação judicial segue apresentando retração no Rio Grande do Sul. Com pequeno recuo em relação ao primeiro quadrimestre do ano passado, o total de empresas que buscaram socorro judicial para reequilibrar as contas é o menor para esse período no intervalo dos últimos cinco anos.
De janeiro a abril, o RS anotou 11 pedidos de recuperação judicial. O número é 73,2% menor na comparação com o primeiro quadrimestre de 2020, pico das solicitações nesse recorte de quatro meses entre 2018 e 2022. Opções de negociação fora da Justiça e atualização de lei estão entre os principais pontos que explicam essa mudança de cenário, segundo especialistas.
Com os 11 pedidos de recuperação registrados no primeiro quadrimestre, o Estado apresentou certa estabilidade ante igual recorte de tempo de 2021, quando anotou 12 solicitações – queda de 8,3%. No país, o cenário é parecido, com recuo de 1,4% entre os dois períodos e menor volume nos últimos cinco anos. A recuperação judicial é um instrumento usados pelas empresas na tentativa de evitar a falência, pedindo ajuda a tribunais para reequilibrar as contas em meio à renegociação de dívidas e manter a operação e empregos.
Nesse sentido, Rabi explica que, no contexto atual, os números de pedidos de recuperação judicial não são os melhores indicadores para analisar a situação das empresas. No momento, a inadimplência das companhias, que vem crescendo nos últimos meses, seria um dos melhores termômetros dentro dessa avaliação, acrescenta.
— A recuperação judicial é algo custoso. Tudo que envolve Justiça é mais caro. Então, o mercado veio desenvolvendo ferramentas muito mais eficazes. Não só do ponto de vista de cobrança, mas também de renegociação de dívidas. Renegociar dívidas na Justiça acaba sendo uma alternativa mais cara.
O advogado especialista em recuperação judicial Eduardo Schumacher, sócio da Demóstenes Pinto Advogados, reforça que a reforma da lei de falências e recuperações judiciais, que entrou em vigor no ano passado, ajuda a explicar a queda nos pedidos. A nova legislação trouxe o fisco, que até então ficava de lado, para dentro da recuperação judicial, segundo o especialista. Alguns pontos do novo regramento dentro desse processo, como a obrigatoriedade de apresentação de certidão negativa de débitos fiscais para a homologação do plano travam a procura por esse auxílio, conforme explica Schumacher:
— Mesmo que o fisco não esteja sujeito à recuperação judicial, ele é um credor, diria entre aspas, privilegiado, porque você precisa estar acertado com o fisco para homologar o plano. Isso travou muitas recuperações, tirou um pouco do brilho da recuperação judicial.
Além desse ponto, o advogado afirma que o uso de outros acordos para renegociar dívidas em estágios antes de acionar a Justiça também diminui o apetite por esse socorro. Schumacher destaca que trazer a alienação fiduciária por parte dos bancos para dentro do processo tornaria a recuperação judicial mais atrativa.
No âmbito das falências, o Estado ficou zerado nos pedidos nos primeiros quatro meses do ano – mesmo acumulado do ano passado para o período. No país, o total de requerimentos para essa ferramenta caiu 9%. A falência costuma ser o último estágio para empresas que não conseguiram manter a operação diante do comprometimento da situação financeira. Rabi lembra que o uso desse recurso vem caindo nos últimos anos diante das alternativas de tentar recuperar a saúde dos negócios:
— Pedidos de falência estão caindo em desuso. Igual o uso de cheque. Quase mais ninguém usa, só para algumas situações específicas.
Cenário de alta à frente
O economista da Serasa Experian Luiz Rabi afirma que a inadimplência das empresas apresenta aumento nos últimos meses no país. Rabi estima que existe cenário para avanço nos pedidos de recuperação judicial nos próximos meses, caso essa dificuldade de pagar as dívidas em dia siga crescendo entre as companhias.
Ele explica que isso ocorre porque existe uma defasagem de tempo entre a piora nas contas das empresas e a busca por medidas mais fortes para evitar a falência. Caso ocorra, esse movimento vai reforçar a avaliação de um ambiente de aumento de inadimplência corporativa:
— Acho que é isso que deve acontecer. A gente está vendo esse aumento mais consistente da inadimplência, que provavelmente vai ser confirmado daqui a alguns meses por um crescimento nesse indicador de recuperação judicial e não meramente uma oscilação.
O advogado Eduardo Schumacher diz que há uma incerteza sobre o comportamento dos pedidos de recuperação judicial nos próximos meses. Ele avalia que os entraves atuais, principalmente no âmbito do fisco e da alienação fiduciária, podem manter certa estabilidade nas solicitações. Já em relação aos requerimentos de autofalência, o especialista considera que existe espaço para incremento nesse indicador em um futuro próximo. O artigo que permite ao falido pedir a extinção de suas obrigações após três anos depois da decretação de quebra é um dos pontos que abre mais espaço para a autofalência, segundo Schumacher:
— A pessoa que não vê mais uma saída para o negócio pode pedir a autofalência, fazer a liquidação do patrimônio e, depois de três anos, pedir a extinção das obrigações do falido e começar uma nova vida como empresário, não sendo mais um caso de “pena perpétua” como ocorria antes da reforma da lei. Hoje, a autofalência é visto mais como um recomeço do que um fim ao empresário.