Após três meses de queda ou estabilidade, o comércio gaúcho teve um sinal positivo em fevereiro. Na comparação com janeiro, o volume de vendas do varejo cresceu 0,5% no Estado, informou nesta terça-feira (13) o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O resultado traz uma dose alívio, mas a combinação entre piora da crise sanitária e corte de estímulos à economia turbina incertezas e gera preocupação.
Se comparadas a fevereiro de 2020, as vendas seguiram no vermelho. Nesse tipo de recorte, a baixa atingiu 12% no Rio Grande do Sul. Já no acumulado de 12 meses, até fevereiro, a redução foi de 4%.
Os números do IBGE mostram que o comércio perdeu fôlego entre o fim do ano passado e o começo de 2021. Prova disso é que, em novembro, os negócios ficaram estáveis no Estado. Na sequência, em dezembro e janeiro, caíram 4,2% e 3,1%, respectivamente (mais detalhes no gráfico abaixo).
A piora da pandemia chegou a provocar o fechamento de lojas na reta final de fevereiro. O comércio considerado não essencial foi reaberto no final de março, mas ainda encara restrições geradas pela covid-19.
Ao mesmo tempo, o setor tende a sentir reflexos da redução de programas de estímulo à economia. Paralisado na virada do ano, o auxílio emergencial foi retomado apenas em abril pelo governo federal. Em razão das restrições fiscais do país, o programa passou por redesenho, com corte de recursos e público atendido.
Empresários também aguardam a volta de iniciativas como o Benefício Emergencial (BEm). Ao longo de 2020, o BEm permitiu a suspensão de contratos de trabalho e a redução de jornada e salários, em troca da manutenção de empregos com carteira assinada. O governo já sinalizou a retomada do benefício, mas o projeto não saiu da gaveta até o momento.
— No final do ano passado, já estava prevista uma perda de fôlego em setores como o comércio, devido ao fim de estímulos à economia, especialmente o auxílio emergencial. Algo que não se esperava era o surgimento de novas restrições na pandemia. Isso diminui investimentos e pode causar perda adicional de emprego e renda — pontua o economista Gustavo Inácio de Moraes, professor da Escola de Negócios da PUCRS.
No Brasil, as vendas do varejo também voltaram a avançar em fevereiro, após três meses de queda ou estabilidade, apontou o IBGE. Na comparação com janeiro, o comércio teve elevação de 0,6% no país. Frente a fevereiro de 2020, a situação foi diferente. Nesse recorte, houve baixa de 3,8%. Já no acumulado de 12 meses, a variação foi positiva, de 0,4%.
Alta de 0,6% no Brasil
Professora da Universidade de Caxias do Sul (UCS), Maria Carolina Gullo lembra que a pandemia desalinhou cadeias produtivas globais, causando escassez de insumos para a indústria. A situação acaba reduzindo a variedade de produtos para o comércio, conforme a professora, que também integra a Diretoria de Economia e Finanças da CIC Caxias do Sul. A inflação em alta é desafio adicional, acrescenta Maria Carolina:
— O poder de compra do consumidor fica menor. Ou seja, se você ia ao supermercado com R$ 100 antes, não consegue comprar a mesma quantia hoje. A inflação é um combustível que inibe o consumo.
Especialistas na área da saúde cobram avanço no ritmo de vacinação contra a covid-19, em uma tentativa de reduzir internações em hospitais, o que ajudaria a economia. No Rio Grande do Sul, outro possível estímulo ao comércio vem da agropecuária, frisa Moraes.
Após a falta de chuva castigar as lavouras em 2020, o Estado deve colher safra recorde de soja neste ano. A melhora no campo tende a espalhar reflexos positivos na economia, compensando parte dos efeitos da crise sanitária, conclui o professor.
Só duas atividades têm desempenho positivo na pandemia
Das oito atividades que compõem o varejo, apenas duas tiveram crescimento no acumulado ao longo da pandemia no Rio Grande do Sul. Os segmentos comerciais com resultados positivos são o farmacêutico e o de supermercados e hipermercados, segundo o IBGE.
A crise sanitária começou em março de 2020 no Estado. De lá para cá, no acumulado de 12 meses até fevereiro de 2021, as vendas de artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos, de perfumaria e cosméticos tiveram alta de 6,4%. Trata-se do maior avanço entre as atividades pesquisadas. No caso de supermercados, hipermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo, o crescimento chegou a 3,7% no mesmo período.
A elevação nos dois segmentos tem relação com as mudanças de consumo geradas pela pandemia. Durante a crise, farmácias e supermercados seguiram em operação.
O setor supermercadista, por exemplo, chegou a suprir a demanda de estabelecimentos como restaurantes, que amargaram paralisação no atendimento presencial. Devido ao isolamento, parte da população trocou a alimentação fora de casa pelo preparo de refeições dentro do lar.
Entre as atividades pesquisadas pelo IBGE, o segmento de livros, jornais, revistas e papelaria teve a maior queda no acumulado até fevereiro, de 46,2%. Tecidos, vestuário e calçados registraram baixa de 30,8%, enquanto equipamentos e materiais para escritório, informática e comunicação recuaram 25%.