A paralisação de uma série de atividades em decorrência da pandemia de coronavírus intensificou nas últimas semanas a busca por renegociação dos contratos de aluguel em Porto Alegre. Diariamente, as imobiliárias da Capital vêm recebendo pedidos de inquilinos para flexibilizar os pagamentos de imóveis residenciais e comerciais. O principal motivo que leva os locatários a realizarem este movimento é a perda parcial ou total de renda.
O movimento começou a ganhar força na segunda quinzena de março, conforme restrições nas atividades comerciais começaram a ser implementadas pela prefeitura e pelo governo do Estado. O presidente do Sindicato Intermunicipal das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis e dos Condomínios Residenciais e Comerciais no Estado (Secovi-RS), Moacyr Schukster, lembra que a renegociação é uma alternativa para evitar a inadimplência durante o período de crise.
— Estamos vivendo uma situação atípica, mas os proprietários, em sua maioria, estão se mostrando dispostos a negociar os valores. Eles estão entendendo a dificuldade do inquilino — afirma Schukster.
Segundo o Secovi-RS, a média de inadimplência mensal em Porto Alegre é de 4% dos contratos de aluguel. A entidade ainda não tem dados sobre a falta de pagamentos após a pandemia, já que o fornecimento das informações pelas imobiliárias está interrompido neste momento.
A renegociação costuma ser intermediada pelas imobiliárias e cada caso é avaliado individualmente, já que não existe nenhuma lei ou diretriz única sobre como proceder em um contexto como o atual.
A diretora de aluguéis da Guarida Imóveis, Júlia Dal Santo, calcula que mil imóveis alugados dos 8 mil que a imobiliária tem em carteira já passaram por algum tipo de renegociação. E a tendência é que o número siga aumentando nas próximas semanas.
— Antes do coronavírus tínhamos um número muito pequeno, quase irrelevante, de pedidos de negociação de aluguel. Agora, a demanda está fora da curva — ressalta Júlia, enfatizando que há equilíbrio no número de contratos comerciais e residenciais com pedidos de mudanças.
Negociação
Com duas salas alugadas em um prédio da Capital, a sócia da Cegonha Imagens Ana Meinhardt contatou sua imobiliária com o objetivo de reduzir despesas durante a crise. O faturamento da empresa, que tem nos ensaios fotográficos seu carro-chefe, caiu a zero por conta da pandemia. Em um dos imóveis locados, o proprietário topou suspender o pagamento do aluguel por dois meses, gerando uma economia de R$ 3,4 mil. No outro, pertencente a um dono diferente, Ana enfrenta dificuldades para alterar valores e segue com a tratativa aberta.
— A suspensão do aluguel nos dá uma folga para passar pelo pior momento da pandemia — aponta Ana.
Gerente de operações das marcas Balanceado, Bella Gula e Saúde no Copo, Giuseppe Frizzo diz que a renegociação feita nas nove lojas próprias da rede gerou uma economia de R$ 51 mil reais em aluguel, condomínio e outras taxas. Para as outras 35 unidades espalhadas pelo Estado, sob responsabilidade de franqueados, foram obtidos descontos médios de 50% no aluguel e, em alguns casos, a suspensão temporária do pagamento.
— De todas as unidades da rede, temos somente nove abertas trabalhando com tele-entrega. Fazemos o possível, mas estamos vendendo metade do que vendíamos antes — justifica Frizzo.
O gerente de operações destaca ainda que a estratégia de renegociação foi válida para o pagamento de março. As condições para a quitação das despesas locatárias de abril ainda deverão ser estabelecidas até o final do mês.
O caminho para renegociar
- O avanço do coronavírus está fazendo com que o mercado imobiliário passe por uma situação inédita no Brasil. O advogado especialista em contratos Fabio Milman explica que, até o momento, não há nenhuma medida jurídica que regulamente a situação dos aluguéis em meio à pandemia.
- Está tramitando em Brasília, um projeto de lei que prevê a proibição de despejos por atraso no pagamento do aluguel durante a pandemia. A matéria foi aprovada no Senado, mas ainda irá passar pela Câmara dos Deputados. Portanto, não está em vigor.
- Milman lembra que a Lei do Inquilinato destaca que é obrigação do proprietário entregar o imóvel em condições de utilização ao inquilino. Como há decretos governamentais que inviabilizam a abertura de determinados tipos de negócios, essa condição pode não estar sendo garantida em alguns casos. Ainda assim, antes de qualquer discussão judicial, o advogado ressalta que o ideal é que o locatário busque uma alternativa junto ao proprietário.
- O primeiro passo para estabelecer uma negociação do contrato de aluguel é buscar a imobiliária em que foi fechado negócio. Caso não haja intermediário no contrato, a recomendação é estabelecer contato direto com o proprietário.
- No atual momento, deve prevalecer o bom senso entre as partes, na avaliação de Milman. As condições do novo acordo dependem exclusivamente das partes. O proprietário não é obrigado a reduzir o valor. No entanto, o advogado ressalta que, neste momento, perder o inquilino pode gerar prejuízos ainda maiores para o dono da propriedade. Isso porque com a iminência de recessão, a procura por imóveis tende a cair.
- Para imóveis residenciais, imobiliárias da Capital apontam que há casos em que os proprietários estão concordando em reduzir temporariamente entre 20% e 30% o valor do aluguel. Já nos imóveis comerciais, os acordos negociados contemplam descontos sobre o preço da locação e a suspensão temporária do pagamento. Cada caso é avaliado individualmente.