A ideia do governo Jair Bolsonaro de incluir em uma proposta de reforma tributária a criação de um imposto sobre movimentações financeiras, similar à extinta Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) vem sendo rechaçada com veemência pelo empresariado. Um dia após o secretário especial adjunto da Receita Federal, Marcelo de Sousa Silva, detalhar que se cogita a implantação de alíquotas a partir de 0,2% para operações de crédito e débito e de 0,4% para saques e depósitos bancários, dirigentes de entidades empresariais subiram o tom das críticas à medida. Em meio à repercussão negativa, o secretário especial da Receita, Marcos Cintra, acabou demitido nesta quarta-feira (11).
Para dirigentes de entidades empresariais gaúchas, nem mesmo a desoneração da folha de pagamentos, que o governo sinaliza como contrapartida, compensaria a implementação do chamado Imposto sobre Transações Financeiras (ITF). O presidente da Federação do Comércio de Bens e Serviços do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS), Luiz Carlos Bohn, avalia que toda redução de carga na folha de salários é bem-vinda, mas não em cima da criação de um imposto incidente sobre toda a população. E pretende articular frente de mobilização contra o retorno do tributo aos moldes da CPMF.
- Nenhum país desenvolvido tem isso. Não tem explicação. É um imposto que não consegue desonerar exportação, pega todo mundo linearmente e não consegue diferenciar os produtos. Só é fácil para arrecadar - considera Bohn.
A presidente da Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul), Simone Leite, classifica o ITF como “engodo” e diz que ele vai contra o princípio de simplificação esperado em uma reforma tributária. A dirigente considera que o ITF geraria ônus extras para empreendedores e trabalhadores. Nesse sentido, a taxação tende a ser repassada ao preço final de produtos e serviços, tornando-os mais caros para o consumidor.
- As pessoas vão tentar buscar outras alternativas para movimentar o dinheiro. A gente pode voltar para um sistema de escambo, trocando mercadorias - ironiza Simone.
Outra crítica recorrente está na cumulatividade do imposto, já que ele seria aplicado em toda transação financeira. Em uma indústria de cadeia produtiva longa, como a metalmecânica, poderia até gerar aumento de carga tributária, mesmo com a redução dos encargos na folha, segundo o presidente da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), Gilberto Petry. A empresa pagaria a alíquota cada vez que comprasse insumos, por exemplo.
- A indústria, como todo o resto da população, é contra o ITF. Se esse imposto viesse para retirar os demais, aí seria outra coisa. Mas o governo não vai fazer isso, por não ter folga de caixa. No final, seria um imposto a mais sobre os outros existentes - pondera Petry.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, chegou a mencionar que a criação do ITF geraria R$ 150 bilhões em arrecadação anual. Entre economistas especializados nas contas do governo, a percepção é de que ainda é cedo para calcular os impactos que o tributo e a desoneração da folha teriam na arrecadação.
Para o analista de finanças públicas da consultoria Tendências, Fabio Klein, os planos do governo deixam dúvidas em uma série de aspectos:
- Ainda não está clara a base de incidência do imposto. Pagamento de salário vai entrar? - exemplifica.
Klein analisa que o ITF poderia afetar, principalmente, as camadas mais pobres da população, que são as que mais sacam dinheiro em espécie para realizar as transações. Além disso, o economista lembra que a proposta de reforma da Previdência foi estruturada em cima do modelo atual de arrecadação sobre a folha de pagamentos. Por isso, ele vê “incongruência” entre as mudanças previdenciárias que estão tramitando no Senado e uma possível desoneração.
O imposto
- Ao começar as discussões de proposta de reforma tributária, o governo Jair Bolsonaro voltou a cogitar a criação de um imposto nos moldes da antiga CPMF, em troca da desoneração da folha de pagamentos das empresas. A proposta seria um dos pilares da reforma a ser encaminhada ao Congresso.
- O tributo vem sendo chamado de Imposto sobre Transações Financeiras (ITF) e poderia ter alíquota de 0,2% até 1%, dependendo do tipo de transação, segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes.
- Nesta terça-feira (10), o secretário especial adjunto da Receita Federal, Marcelo de Sousa Silva, apontou que saques e depósitos em dinheiros poderiam ser taxados com alíquota inicial de 0,4%, enquanto pagamentos no débito e crédito teriam alíquota a partir de 0,2% paga quem paga e para quem recebe o valor.
- Com a repercussão negativa, o Ministério da Economia anunciou, nesta quarta-feira (11), a exoneração do secretário especial da Receita Federal, Marcos Cintra.