Os sete municípios do Estado que mais dependem das prefeituras para gerar empregos com carteira foram criados entre 1992 e 1996. Na ocasião, o movimento em busca de emancipação foi favorecido pela Constituição de 1988, que alterou regras relacionadas ao processo. No total, ao longo desses cinco anos, o Rio Grande do Sul assistiu à geração de 163 municípios, mostram dados da Fundação de Economia e Estatística (FEE). Ou seja, 32,8% das atuais 497 cidades gaúchas surgiram à época.
— Municípios sem capacidade para gerar arrecadação própria não deveriam estar emancipados. Ficam dependentes de recursos transferidos por União e Estado — analisa o economista Liderau dos Santos Marques Junior, da FEE.
Eleito em 2016, o prefeito de Sete de Setembro, Márcio Politowski (PT), considera que, embora o município tenha dificuldades de criação de empregos fora do setor público, a separação de Guarani das Missões e Giruá, decretada em 1995, trouxe avanços para a população.
— Em termos de acesso a serviços, o município ficou 100% melhor. Não tinha posto de saúde antes. Era um abandono total — declara Politowski.
A cerca de 200 quilômetros de Sete de Setembro, São Pedro das Missões conseguiu se emancipar de Palmeira das Missões um ano depois, em 1996. Hoje comerciante, Elcides José Brun, 53 anos, lembra-se da época:
— Fui vice-presidente da comissão de emancipação. A mudança foi boa para o município. Antes, o acesso a serviços de saúde e educação dependia de Palmeira.
Apesar dos elogios ao movimento, Brun aponta problemas na cidade. Em razão da carência de empresas, viu um de seus filhos sair de casa em busca de trabalho e estudo. Sem perspectivas de encontrar emprego, o comerciante, que deixou o cargo de secretário de Agricultura em 2015, também resolveu apostar. Há um ano e meio, ao lado da loja de roupas da esposa, abriu uma lancheria e sorveteria, que vende pratos como xis e oferece wi-fi na tentativa de atrair clientes.
— É muito bom viver aqui. O problema é a falta de indústrias — relata.
Segundo o Tribunal de Contas do Estado (TCE-RS), as despesas com pessoal em São Pedro das Missões cresceram de 51,1% da receita corrente líquida, em 2015, para 51,79% no ano passado. Em termos percentuais, foram os maiores valores dos sete municípios.
Desde 2000, a Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece a marca de 48,6% como limite para emissão de alerta. A partir de 51,3%, como foi o caso de São Pedro das Missões em 2016, as prefeituras ultrapassam a barreira prudencial de gastos com o funcionalismo. Acima de 54%, superam o nível permitido.
— Quando um município ultrapassa o teto, não recebe mais transferências voluntárias. Pode não conseguir firmar convênios com o Estado, por exemplo — explica a auditora Andrea Doval da Costa, supervisora de instrução de contas municipais do TCE-RS.
Advogado e contador, Antonio Ferreira (PP) tomou posse na prefeitura de São Pedro das Missões neste ano. Por conta das dificuldades no caixa da administração municipal, comenta que a rotina desde janeiro tem sido "desgastante".
— Assumimos a prefeitura com 237 empregados. Hoje, são 194. Cortamos 43 funcionários, entre cargos comissionados e emergenciais. Precisamos arrumar a questão administrativa antes. Recursos para trazer indústrias, infelizmente, não temos. Tentamos parcerias com o comércio local. Neste ano, dois restaurantes e duas agropecuárias abriram no município — salienta Ferreira.
Prefeito de Rio dos Índios, Salmo Dias (PP) também comanda a Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs). Para o dirigente, apesar das dificuldades de incentivo à criação de empregos na iniciativa privada, as prefeituras de pequenas cidades cumprem "importante função social", com projetos voltados a características locais, como ações de auxílio à agricultura familiar.
Asfalto é esperança
O município sem ligação asfáltica é como aquele filho que completa a idade para se emancipar, mas não sai da casa do pai. Não está emancipado de fato
Antonio Ferreira
prefeito de São Pedro das Missões
Um trecho de cerca de seis quilômetros de estrada de chão conecta o centro de São Pedro das Missões à BR-386, conhecida como estrada da produção. No município do noroeste gaúcho, a falta de ligação asfáltica com os vizinhos é apontada como um dos principais bloqueios para o desembarque de empresas.
— Donos de mercados relatam à prefeitura que muitos distribuidores não entram aqui por conta do acesso — afirma o prefeito de São Pedro das Missões, Antonio Ferreira (PP).
As articulações em busca de repasses para asfaltar o trecho começaram há cerca de 20 anos. Segundo o prefeito, as tratativas continuam, mas dificuldades financeiras do Estado travam o investimento. O valor para as obras seria de R$ 4,5 milhões, diz Ferreira.
— O município sem ligação asfáltica é como aquele filho que completa a idade para se emancipar, mas não sai da casa do pai. Não está emancipado de fato — compara.
No norte gaúcho, Cruzaltense faz a mesma reivindicação para tentar atrair indústrias. Segundo a prefeitura, a busca por asfalto na RS-483 também leva duas décadas.
— É um trecho de seis quilômetros. Se o asfalto não sair até a metade de 2018, temos pretensão de fazê-lo com nossas próprias forças. A ideia é comprar uma usina asfáltica e tocar as obras. O povo está esperando — afirma o prefeito de Cruzaltense, Kely José Longo (PP).
Em Itapuca, no nordeste do Estado, a ligação asfáltica chegou há cinco anos. Apesar de o entrave ter ficado no retrovisor, outras dificuldades diminuem a velocidade da busca por empresas.
Uma delas, aponta o prefeito Marcos Scorsatto (DEM) é a capacidade reduzida para oferecer incentivos à instalação dos negócios.
— As empresas vão para onde encontram melhores condições. É uma concorrência injusta com grandes municípios. Como vamos ter negócios de grande porte aqui? Solicitam imóveis, pavilhões, um monte de coisa — argumenta.
Em pelo menos três dias, GaúchaZH tentou contato com o prefeito de Mampituba, Dirceu Gonçalves Selau (PT), mas não obteve retorno.