Estão passando longe do consumidor os efeitos diretos da queda da Taxa Básica de Juros (Selic). Desde que o Banco Central deu início à sequência de cortes, em outubro do ano passado, o juro básico, que indica o custo do dinheiro que os bancos tomam para depois emprestar, caiu de 14,24% para 11,25% ao ano. Era de se esperar que os empréstimos pessoais, o cheque especial e o parcelamento no comércio também ficassem bem mais baratos, correto? Não necessariamente.
Levantamento mais recente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac) indica que a redução do juro nas linhas de crédito mais populares foi irrisória – em alguns casos, a taxa até subiu. Em abril do ano passado, o juro anual para empréstimos bancários chegava a 72,3%. Em abril deste ano, deslizou para 68,6%. Em outros casos, como o cheque especial, a taxa subiu. A única taxa que caiu com alguma força foi a do rotativo do cartão de crédito, mas em razão das mudanças nas regras que transformaram essas dívidas em parcelamentos convencionais.
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– Apesar da Selic estar caindo, outros fatores que compõem o juro estão subindo, e até em ritmo mais acelerado – explica Alexandre Espirito Santo, economista da Órama Investimentos.
O mais importante destes fatores é a inadimplência. Quando mais alta, maior o risco de os bancos levarem calote, portanto, mais cobram para se proteger. Quase 40% dos adultos têm alguma conta em atraso, conforme o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL). Isso significa que 59 milhões de pessoas no país estão devendo para bancos ou lojistas. Assim, o preço do dinheiro sobe, e quem paga a conta são as pessoas que quitam suas dívidas em dia, com juros e encargos.
Comprometimento da renda
Está querendo saber se a situação tende a mudar? Dificilmente, no curto prazo. Com o desemprego cada vez maior, o endividamento e o comprometimento da renda com parcelas só faz crescer – erguendo também o risco da inadimplência. Pesquisa da Fecomércio-RS mostra que o endividamento das famílias gaúchas registrou alta nos últimos 12 meses, passando de 70,4% para 75,2% do total. O levantamento indica ainda que a parcela da renda comprometida com dívidas em abril, na média em 12 meses, foi de 32,7%, acima dos 25% considerados "limite" por analistas financeiros.
– Tendo em vista o cenário econômico atual, com aumento do risco de elevação dos índices de inadimplência e desemprego elevado, isto aumenta também o risco de novas elevações das taxas de juros aos consumidores – afirma Miguel Ribeiro Oliveira, diretor da Anefac.
A reportagem entrou em contato com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) para buscar os motivos que levam as instituições a manterem os juros elevados. Conforme a entidade, em posicionamento oficial, mais do que a alta taxa de inadimplência, é o custo dela para os bancos o principal fator determinante do alto spread bruto (a diferença entre o que os bancos pagam pelo dinheiro e quanto cobram no empréstimo): chega a ser quatro vezes maior do que a média de um conjunto de 12 países relevantes analisados em pesquisas da Febraban.
"A taxa de recuperação dos créditos de inadimplentes é muito baixa no Brasil, consequência da lentidão de um Judiciário sobrecarregado e de um viés, tanto na legislação quanto na jurisprudência, em favor do devedor inadimplente. Apenas 16% dos créditos garantidos são recuperados no Brasil em casos de falência, comparado com uma taxa média de recuperação de 69% nos demais países", cita a entidade, que menciona, ainda, os elevados tributos cobrados sobre operações financeiras como causa do juro elevado.