Enquanto o governo discute maneiras de incentivar a queda do juro como impulso à retomada da atividade econômica, números do Banco Central (BC) mostram que a concentração bancária no Brasil, com os últimos negócios registrados no setor, continua a crescer. Dados relativos a setembro de 2016 revelam que os quatro maiores bancos no país – Banco do Brasil, Itaú, Caixa Econômica Federal e Bradesco – concentram 72,4% dos ativos totais das instituições financeiras comerciais, de acordo com dados do BC. Em 2000, os quatro maiores bancos do Brasil detinham uma participação de 50,4% no total de ativos.
Basta lembrar do passado recente para perceber o alcance do processo de reorganização da banca brasileira. Nas ruas, diversas instituições financeiras desapareceram após serem absorvidas. O Unibanco, por exemplo, se juntou ao Itaú. A Nossa Caixa foi incorporada pelo Banco do Brasil, a maior instituição financeira do país em ativos.
Recentemente, as placas do HSBC foram substituídas pelas do Bradesco. Há casos ainda mais simbólicos: o antigo Banco América do Sul foi comprado pelo italiano Sudameris, que foi adquirido pelo ABN Amro Real que, por sua vez, foi integrado ao Santander Brasil – hoje o quinto maior banco brasileiro. O resultado desse processo é que os bancos grandes ficaram ainda maiores.
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Os números do Banco Central mostram que a participação dos quatro maiores bancos brasileiros deu um novo salto com a incorporação do HSBC pelo Bradesco. Com essa operação, a participação dos quatro grandes bancos aumentou quase 5 pontos, já que o porcentual estava em 67,5% em setembro de 2015. A fatia deve crescer novamente em breve, quando o Itaú (segundo maior banco em ativos) absorver oficialmente a operação recém-adquirida do Citibank Brasil (décima maior instituição financeira).
O top 4 do sistema financeiro nacional detém 80% do crédito concedido no país. Além disso, esses quatro bancos possuem 75 de cada 100 agências espalhadas pelo país.
Preocupação
O BC reconhece que há "algum nível" de concentração no sistema bancário brasileiro. No mais recente relatório de estabilidade financeira, a instituição cita um índice para medição da concentração bancária internacional, o IHH (Índice Herfindahl-Hirschman), que mostra número "dentro do intervalo considerado como de moderada concentração". Além dos ativos, o BC também admite que há uma "concentração moderada" nos empréstimos e depósitos do sistema financeiro.
Para os consumidores, a concentração de qualquer setor não costuma ser uma boa notícia. Isso porque maior concentração significa que menos agentes detêm uma fatia mais expressiva do mercado. E, quanto menos concorrência houver, maiores são as chances de preços e custos praticados serem parecidos, enquanto ofertas e oportunidades diminuem.
– Bancões comprando outros bancos têm ganhos de escala, o que abriria possibilidade para oferecer taxas e tarifas menores aos clientes, mas isso não acontece na prática – diz Henrique Lian, gerente de políticas públicas da Proteste, associação de defesa do consumidor. – Essa concentração é um perigo para o consumidor, que não tem para onde correr – complementa.
Ele lembra que a concentração no sistema financeiro vai além dos serviços bancários, uma vez que os mesmos grupos oferecem ainda produtos como seguros, previdência privada e cartões de crédito.
– Mesmo as medidas do governo para incentivar a concorrência, como a portabilidade de crédito e redução de spreads, têm efeito limitado num setor que não tem um cartel, mas onde poucos atores conseguem estabelecer regras comuns – diz.
Todos os quatro maiores bancos – Banco do Brasil, Itaú, Caixa Econômica Federal e Bradesco – foram procurados pela reportagem, mas não se pronunciaram. Alegam que o tema é tratado pela Febraban, entidade que os representa.
Febraban nega concentração
A Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) nega que haja concentração excessiva no mercado bancário. Para a entidade, o cenário nacional é semelhante ao de economias como Austrália e Canadá. Enquanto isso, o governo federal avalia iniciativas para tentar atrair mais bancos estrangeiros. Segundo o Banco Central (BC), duas instituições internacionais aguardam autorização para abrir filial no Brasil. Interessados têm olhado especialmente o mercado de nichos, como operações estruturadas e atacado.
A entidade que representa grandes e pequenos bancos não entende que exista problema de concentração no país. A Federação cita estudo do Fundo Monetário Internacional (FMI) de 2014 que menciona que a concentração das três maiores instituições financeiras brasileiras "estava abaixo do Canadá, Japão, Reino Unido, França e Espanha".
A Febraban reconhece, porém, que a concentração aumentou após a crise de 2008. Inicialmente, bancos problemáticos foram absorvidos por instituições mais saudáveis. Depois, a regulação passou a exigir capital extra das instituições financeiras, o que acelerou a saída de outras casas.
"Diante do forte aumento regulatório, bancos passaram a rever operações em outros países e a concentrar suas atividades nas áreas mais lucrativas e representativas", cita a entidade, em nota.
Estrangeiros
Na equipe econômica, há estudos para tentar facilitar a entrada de bancos estrangeiros no país. Com o argumento de que esse movimento pode aumentar a concorrência e reduzir as taxas de juros cobradas de empresas e famílias, o governo cogita reduzir algumas exigências.
O interesse dos estrangeiros, porém, não parece muito intenso. Atualmente, há apenas dois pedidos de autorização para entrada no mercado nacional, diz o BC.
Uma fonte do setor bancário explica que estrangeiros têm interesse, mas o foco é segmentado.
– Não há banco internacional que avalia entrar para concorrer com os cinco grandes. O olhar que continua é de nicho – diz o executivo de uma instituição internacional.
Entre os segmentos que atraem mais atenção, estão operações estruturadas e atendimento às grandes empresas – segmento em que o HSBC e Citibank continuarão no país – e atendimento de setores específicos – como no agronegócio.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.