Após a confirmação da perda do grau de investimento pelo Brasil, operadores do mercado financeiro chegaram a temer uma disparada brusca do dólar e queda acentuada da bolsa nesta quinta-feira pelo receio de forte fuga de capitais do país. A moeda americana chegou a subir 2,5% e encostar nos R$ 3,90 às 9h30min, mas depois amenizou alta e fechou em R$ 3,85 (+1,34%).
O Banco Central também agiu e fez leilão de US$ 1,5 bilhão para tentar conter a valorização. O inverso aconteceu com a bolsa . O índice Ibovespa chegou a cair 2,25% no início do pregão, mas reagiu a partir da abertura do mercado americano. Chegou a passar para o terreno positivo, mas fechou em queda de apenas 0,33%.
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Entenda o que acontece com o país daqui para a frente após a perda do grau de investimento:
A reação indica que a perda do grau de investimento estava precificada?
Em grande parte, sim. Segundo especialistas em finanças, isso é possível verificar com a movimentação dos últimos meses que inclui escalada do dólar, alta do juro e queda da bolsa a partir de maio. Ou seja, o mercado dava como certo a perda do grau de investimento, mais cedo ou mais tarde.
- O que ocorreu ontem (quarta-feira) foi apenas a chancela de algo que era esperado para os próximos meses - diz Michael Viriato, coordenador do laboratório de finanças do Insper.
Qual deve ser o efeito no câmbio daqui para a frente?
Como a perda do selo de bom pagador já vinha sendo embutida nos preços, para Michael Viriato, do Insper, é possível que o dólar esteja próximo de um ponto de equilíbrio. Rodrigo Zeidan, professor de economia e finanças da Fundação Dom Cabral, também entende que o câmbio está perto de um teto razoável dadas as atuais condicionantes da economia brasileira. A piora do quadro fiscal e da atividade econômica e o agravamento da crise política, porém, teriam o potencial de valorizar ainda mais a moeda americana.
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Qual deve ser o reflexo na bolsa?
O cenário segue desfavorável em função da recessão atravessada pelo país e baixo preços das commodities, mas não há expectativa de quedas dramáticas causadas pela decisão de Standard & Poor's. As altas taxas de juros no país também estimulam investidores a optarem pela renda fixa, onde não há risco. Para Viriato, no entanto, como a bolsa brasileira convertida em dólares está em patamar mais baixo do que o verificado em 2008, quando eclodiu a crise financeira global, pontualmente os papéis de algumas empresas brasileiras podem ser considerados baratos e atrativos para os estrangeiros.
Ainda há risco de saída maciça de capitais?
Tudo indica que não. Como a perda do grau de investimento pelo Brasil era considerada certa, muitos fundos estrangeiros, que têm em seus estatutos a exigência de aplicarem apenas em países considerados bons pagadores, começaram a bater em retirada meses atrás. Por outro lado, investidores mais agressivos podem enxergar oportunidades em aplicações brasileiras atreladas às altas taxas de juros.
As outras duas grandes agências de classificação de risco, Fitch e Moody's, também devem rebaixar o Brasil para grau especulativo? Quando?
A maior probabilidade é que sim. Seria em um horizonte de até seis meses
Qual é nota do Brasil nessas outras duas agências?
Pela Fitch, é BBB, dois degraus acima da perda do grau de investimento, mas em abril a agência colocou o país em perspectiva negativa, o que significa ameaça de redução da avaliação em caso de continuidade da deterioração do quadro fiscal. Pela Moody's, o Brasil é Baa3, a última nota antes de perder o certificado de bom pagador. Até o mês passado, o Brasil era Baa2 pela Moody's.
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Se uma das duas ou ambas retirarem o grau de investimento do Brasil haverá grande impacto?
A tendência é que não, porque não haveria novidade no rebaixamento.
Qual é o efeito para as empresas brasileiras?
As companhias nacionais terão de se submeter a juros mais caros se quiserem captar recursos no Exterior. Com a economia brasileira em recessão, isso desestimula ainda mais investimentos, o que diminui a capacidade de crescimento da economia do país no futuro e gera menos receita para o governo.
Há algo de positivo a ser extraído da decisão da agência?
Os especialistas em finanças avaliam que a materialização da perda do grau de investimento, mais cedo do que o imaginado, ao menos retira uma incerteza do cenário. Com a confirmação do rebaixamento da nota do Brasil para um degrau especulativo, espera-se que agora governo e Congresso tenham uma melhor coordenação para aprovar e colocar em práticas medidas que possam fazer o país ampliar receitas e diminuir despesas.
- Agora não há mais plano B - afirma Zeidan.
Como a nova classificação do Brasil influi na vida do cidadão comum?
A retirada do carimbo de bom pagador do Brasil é apenas o desfecho de um cenário que inclui recessão e crise política, o que se traduz em juros maiores, inibindo o consumo, levando à perda de renda, desemprego e menor confiança dos empresários em investir, o que limita a capacidade de crescimento da economia no futuro.
Há mais espaço para o governo cortar gastos no orçamento?
Apesar da pressão para o Planalto reduzir gastos, a margem de manobra do governo hoje é mínima, entende a pesquisadora de contas públicas Vilma da Conceição Pinto, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas (FGV). Isso porque 90% das despesas contidas no orçamento são não discricionárias. Ou seja, não podem ser cortadas devido à determinação legal ou constitucional, como nas áreas de saúde e educação, que têm gasto obrigatório mínimo. Outros exemplos são benefícios previdenciários e trabalhistas. Os 10% restantes englobam investimentos (incluindo PAC e Minha Casa Minha Vida) e custeio, como material de consumo e consultorias.
- O governo já cortou o investimento. Hoje está quitando apenas restos a pagar de anos anteriores. O que ainda pode ser cortado é muito pouco em relação à necessidade - diz Vilma.