A prisão dos hackers suspeitos de vazamento das fotos de Carolina Dieckmann fez aparecer o trabalho das polícias focadas em crimes digitais. Mas os especialistas gaúchos nesse tipo de investigação alertam: se você não é uma atriz global, ninguém está lá muito interessado nos seus ensaios domésticos. O que esse tipo de criminoso quer mesmo é o seu dinheiro.
Vinculado ao Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), o combate aos delitos virtuais no Rio Grande do Sul é centralizado na Delegacia de Repressão aos Crimes Informáticos (DRCI) da Polícia Civil. Titular da delegacia, Marcínio Tavares Neto é taxativo sobre o foco dos trabalhos:
- Cerca de 80% é contra fraudes bancárias. Contra quadrilhas especializadas em furtar senhas, por exemplo - esclarece o delegado.
A demanda por esse tipo de investigação surgiu na metade da década passada, mas apenas no segundo semestre de 2010 a DRCI ganhou a estrutura que tem hoje: com um delegado e sete agentes.
- Mais do que bom conhecimento técnico, é preciso policiais com um perfil "fuçador". Eu mesmo trabalho nesta área desde 2005 e não tenho nenhuma formação acadêmica em informática - avalia Emerson Wendt, primeiro delegado da DRCI.
Ele hoje ministra cursos para polícias de outros Estados e está prestes a lançar o livro Crimes Cibernéticos - Ameaças e Procedimentos de Investigação.
Embora enxuta, a equipe gaúcha contabiliza vitórias importantes contra delitos que, justamente por utilizar a rede mundial, pode envolver criminosos de toda parte. Virou referência na delegacia a operação que, no início de 2011, chegou a um hacker baiano que investia contra o Banrisul.
- Após criar uma página falsa do banco para interceptar as senhas, pessoas aqui do Estado eram recrutadas para efetuar os saques, ficar com uma comissão e enviar o restante à quadrilha - relata Edler Gomes dos Santos, um dos agentes da DRCI.
A prioridade no resguardo ao sistema bancário condiz às atribuições do Deic, cujo foco é atuar contra o crime organizado, mas também há investigações na DRCI sobre outras chagas da internet, como pedofilia e racismo. Como o trabalho requer prisões, depoimentos fora do Estado sede da investigação e quebras de sigilo, por vezes a celeridade fica comprometida.
- Em uma investigação de racismo, eu solicitei autorização à Justiça faz cerca de um ano e só agora recebi os IPs (endereços das conexões de internet) - conta Santos.
Conforme a delegada de Defesa Institucional, Diana Calazans Mann, há casos específicos em que a investigação virtual chega ao âmbito da Polícia Federal. Os mais comuns são quando há dano a instituições federais ou violação de direitos humanos. Como assegurar o bem da criança é um compromisso internacional, casos de pedofilia costumam ser investigados pela PF.
- Foi o que aconteceu na Operação Carrossel, por exemplo (executada em 2008, a partir da CPI da Pedofilia no Congresso). A própria polícia desenvolveu o software para identificar computadores de pedófilo. Foram cerca de 20 prisões aqui no Estado - relata Diana.
Sem legislação específica
A internet no Brasil ainda é vista apenas como um veículo para outros crimes, sem legislação específica. Os criminosos que violaram a privacidade de Carolina Dieckmann, por exemplo, poderão ser processados pelo dano à imagem da atriz e por extorsão, mas não por terem usado um e-mail spam para violar o computador dela.
- Não é crime enviar correio eletrônico para roubar senhas e dados, ou invadir um sistema de computador. Só quando faz uso da senha em uma transferência bancária, por exemplo, a pessoa pode ser enquadrada por furto qualificado. A internet é o meio, mas não o fim - explica o delegado Emerson Wendt, das Delegacia de Repressão aos Crimes Informáticos (DRCI).