Um avatar pode ser agredido sexualmente? Com a expansão dos metaversos, universos de realidade virtual, surgiram também os primeiros casos de assédio sexual, uma experiência que pode ser traumatizante.
— Entrei no espaço comum e quase imediatamente três ou quatro avatares masculinos grudaram em mim: me senti encurralada — diz a empresária britânica Nina Jane Patel. —Eles tocaram e apalparam meu avatar sem meu consentimento. Enquanto isso, outro avatar estava tirando selfies.
Seu agressor então lhe mostrou as fotos virtuais da cena. Foi neste momento que a empresária, que também é vice-presidente de pesquisa de metaversos da empresa de realidade virtual Kabuni Ventures, percebeu que havia sido vítima de "uma agressão sexual".
— A realidade virtual é essencialmente fazer seu cérebro acreditar que o mundo virtual ao seu redor é real — explica Katherine Cross, doutoranda na Universidade de Washington e especialista em bullying online. — Quando falamos de assédio na realidade virtual, agressão sexual, por exemplo, o que realmente significa é que seu corpo inicialmente o considera "real" antes que a parte consciente do seu cérebro perceba que não aconteceu fisicamente.
As implicações legais são vagas, embora esta pesquisadora considere que a legislação contra o assédio sexual poderia ser aplicada nestes casos. Nina Jane Patel lembra que, depois de exigir que seus agressores parassem, ela tirou o capacete de realidade virtual. Pelos alto-falantes da sala ainda podia ouvir as vozes masculinas: "Não finja que não gostou" ou "É por isso que você veio aqui".
Essa cena aconteceu em novembro passado no "Horizon Venues", o metaverso da Meta, empresa controladora do Facebook, que hospeda eventos virtuais organizados por marcas, como shows, conferências ou jogos de basquete. Seu depoimento não é um caso isolado, outros visitantes de metaversos de diferentes plataformas também relataram incidentes semelhantes.
Bolhas de proteção
Meta e Microsoft anunciaram em fevereiro que aplicarão uma bolha de proteção que envolverá os avatares para evitar que alguém se aproxime mais de um metro de distância. A Microsoft, inclusive, removeu os espaços de encontro de seu metaverso Altspace VR.
— Acho que o problema do assédio será resolvido porque os jogadores selecionarão as plataformas com base em seus próprios critérios — estima Louis Rosenberg, engenheiro que desenvolveu o primeiro sistema de realidade aumentada em 1992 para os laboratórios de pesquisa da Força Aérea dos EUA.
Mas Rosenberg, que mais tarde fundou uma empresa especializada em inteligência artificial, confidenciou à AFP que está mais preocupado com "o assédio das empresas privadas", interessadas em extrair o máximo de dados possível, desde o movimento dos olhos até à frequência cardíaca dos visitantes.
Alguns players do setor, como o centro de análise Oasis Conortium, já começaram a refletir sobre os códigos de segurança.
— Quando as plataformas identificam conteúdos que possam representar um risco real, é essencial notificar as autoridades — indica uma das suas recomendações.
Para Rosenberg, o modelo de um metaverso livre e gratuito não é viável.
— Seu modelo de negócios precisa deixar de ser baseado em publicidade para baseado em assinatura — afirma.