Liliana Cardoso Duarte, 43 anos, é a primeira mulher negra nomeada patrona dos Festejos Farroupilhas do Rio Grande do Sul. A declamadora e ativista cultural é a quarta representante feminina a receber a homenagem desde 2005, quando o título passou a ser concedido – as outras indicadas ao posto foram Nilza Lessa, Elma Sant'Ana e Alessandra Motta. E não para por aí. Pela primeira vez, a atual presidente do Movimento Tradicionalista Gaúcho, o MTG, também é uma mulher: Gilda Galeazzi tomou posse no ano passado ao derrotar Elenir Winck em eleição histórica, com duas cabeças de chapa femininas.
Se antes elas ficavam restritas aos bastidores de CTGs, encontros populares e festivais nativistas, hoje as mulheres conquistaram cargos estratégicos e ganharam poder de decisão no fomento das tradições. Convidamos seis apaixonadas pela cultura gaúcha para indicar quais figuras femininas foram inspiração em suas caminhadas.
Veja a seguir:
Shana Müller, cantora e apresentadora do Galpão Crioulo, da RBS TV
"Uma grande referência que me inspira, desde os tempos em que era prenda, é a artista Loma Pereira. Seu trabalho como ativista cultural, artista, mulher agregadora do feminino e da negritude sempre foi e segue sendo referência. Acredito que ela representa o significado de artista completa, que canta, se posiciona e, sobretudo, incentiva as novas gerações.
Liliana Cardoso Duarte, declamadora, ativista cultural e patrona dos Festejos Farroupilhas de 2021
"Tudo começou dentro da minha família. Minha mãe, Dione, faleceu no ano passado e era à frente do seu tempo, pelotense de raiz, forte e aguerrida. Ensinou que o lugar da mulher negra é onde ela quiser, inclusive na cultura gaúcha. Minhas duas irmãs também são referência na minha caminhada: Larissa foi primeira prenda e me colocou dentro do CTG, e Lissandra é professora e faz um trabalho de resgate às raízes com poesia nas escolas. Já a Lara Cilene, ex-primeira prenda, me impactou porque defendia a importância da presença da mulher no movimento tradicionalista desde os anos 1980. Ela me empoderou para chegar até aqui, assim como a cantora nativista Maria Luiza Benitez. A Gabrielli da Silva Pio Bertoldi foi pioneira por ser mulher negra e conquistar o posto de primeira prenda do RS. Representou a resiliência, a luta, a cultura e a força de ter vindo da periferia e chegado a esse lugar de destaque. Para finalizar: não poderia esquecer das irmãs Margarete e Rose Rodrigues, de Guaíba. As duas promovem a cultura negra dentro dos CTGs por meio da literatura e da poesia".
Roberta Jacinto, vice-presidente de Cultura do MTG e Primeira Prenda do RS (2016/17)
"Sempre quis ser prenda, era curiosa e estudava bastante. Em 2008, conheci a Janine Appel, ela tinha sido recentemente prenda do Rio Grande do Sul. Foi muito importante na minha caminhada porque ela mostrou ser uma prenda completa: tinha inteligência, olhar crítico, força, sensibilidade e simplicidade. A Janine mostrou que era possível eu representar o Estado um dia sendo quem eu sou, sem tentar buscar um padrão, e isso me inspirou muito. Sempre levantei a bandeira de que a prenda precisa ser respeitada pelo intelecto, por estar alinhada com os valores do movimento, pelo seu trabalho e comprometimento. Não apenas se o vestido tem renda, se o cabelo está impecável, ou a maquiagem perfeita. Isso é individual de cada mulher, há aquelas em que a simplicidade está na essência e outras que gostam de se produzir mais, isso precisa ser respeitado. A Janine representava tudo em que eu acredito".
Sandra Regina Bitencourt Abech, vice-presidente da Ordem dos Cavaleiros do RS e patrona dos Festejos Farroupilhas de Porto Alegre de 2020
"Muitas mulheres inspiradoras passaram pelo meu caminho no tradicionalismo, mas vou falar sobre a Gilcéia de Lurdes Souza. Ela é prenda veterana do CTG Glaucus Saraiva e do DTG Lenço Colorado. O que me inspira é ela trabalhar numa parte tão nobre, que é o voluntariado. É engajada na promoção da cultura popular e apoia diferentes segmentos junto do tradicionalismo, como os povos negro e indígena. A Gilcéia é artesã, escotista, artista plástica e joga truco como ninguém. Desde 1985, está envolvida no tradicionalismo, indo além do Rio Grande do Sul: em 2003, chegou a integrar um CTG no Pará. E o trabalho da Gilcéia muitas vezes não aparece. Ela é firme nos seus propósitos, faz tudo de coração e merece ser valorizada".
Alessandra Carvalho da Motta, primeira prenda do Estado nos anos 1980, engajada no movimento tradicionalista gaúcho e patrona dos Festejos Farroupilhas de 2020
"Muitas mulheres me inspiraram no meio tradicionalista, mas a professora Vera Lúcia Tittelmaier Balardin se destaca. Nos conhecemos quando iniciei a participação nos concursos de prendas ainda na adolescência em Cachoeira do Sul. A Vera tem formação em música, educação artística e é pós-graduada em folclore. Ela me inspirou pela sua garra, seu conhecimento, sensibilidade, simpatia, coragem, companheirismo, fidelidade e amizade. Na minha época de prenda, a Vera costumava dizer: 'Esta prenda é cria minha'. Como uma mãe, me ensinou, cuidou e guiou. A professora Vera e o tradicionalismo estão ligados em sua essência".
Gabriela Sarturi Rigão, atual primeira prenda do RS representando o Departamento de Tradições Gaúchas Noel Guarany, da UFSM
"Dentre tantas mulheres que marcaram meu caminho, indico Dinara Xavier da Paixão, que atualmente é professora na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Na minha adolescência, ouvia histórias sobre ela, via fotos, Dinara era uma inspiração de prenda. Já na vida adulta, deixou marcas sólidas em meu ‘ser tradicionalista’. Ela me fez refletir e me desafiou a evoluir para além do tradicionalismo, como nos âmbitos pessoal e profissional. Por meio do seu livro, Caminhos: Percorridos, Construídos, Vislumbrados, pude conhecer ainda mais a vida dessa mulher e sua relação com as raízes gaúchas. Ela é pura inspiração!"