Nunca joguei bola. A Marta jogou a vida toda. E ao término do jogo contra França, ainda no gramado do estádio Océane, na cidade de Le Havre, após a eliminação da Seleção Brasileira na Copa do Mundo feminina, ela fez um desabafo, que interpretei como um pedido. “O futebol feminino depende de vocês”. Parecia que a Marta estava falando diretamente comigo. “Depende de ti, Alice”.
Imediatamente lembrei das muitas mulheres com quem conversei recentemente sobre o tema. “Isso me dá orgulho de ser mulher”, disse uma durante um jogo da seleção. “Eu me sinto representada”, outra completou. “Queria ser uma delas”, afirmou a menina que acompanhava um dos jogos em meio aos colegas no pátio da escola.
Nunca joguei bola. Não consigo fazer mais de duas embaixadinhas. Era a última a ser escolhida nos times da escola. Como sempre fui alta, quando entrava, era goleira. E gritava assustada cada vez que uma atacante se aproximava. E nunca joguei, porque nunca fui muito boa mesmo. Mas isso não me impedia de participar, incentivar, gritar, fazer o agito. Porque o ambiente de jogo é bom pra todo mundo. Até as maiores pernas de pau, como eu, se divertem, aprendem, crescem.
Se na infância eu só podia admirar as minhas amigas driblando e fazendo lindos gols, nas últimas semanas, pude assistir encantada aos jogos da Copa do Mundo feminina sendo transmitidos pela TV Globo e RBS TV. Os números corroboram a emoção que senti ao ver as gurias do Brasil em campo.
Estou começando a entender o impacto que as jogadoras, repórteres, comentaristas e todas as mulheres envolvidas nessa história, causam em todas as outras".
Em dias de jogos da nossa seleção, a audiência da RBS TV na Grande Porto Alegre atingiu um crescimento de 52% no número de telespectadores por minuto nas faixas em que foram exibidos. Foram 162 mil novos telespectadores por minuto ligados nas jogadas da Cristiane, da Marta, da Andressinha, da Mônica e da Formiga. O maior crescimento, de 70%, foi no público masculino. O público feminino cresceu 35%. Cada partida alcançou uma média de 658 mil telespectadores diferentes ao longo das transmissões. Esse é o tamanho da grandeza do que esse time de mulheres fez na França. As pessoas pararam para vê-las daqui do Brasil.
Nunca joguei bola. Mas estou começando a entender o impacto que as jogadoras, repórteres, comentaristas e todas as mulheres envolvidas nessa história, causam em todas as outras. Quantas meninas que jogam ou nem jogam bola vão passar a se ver e ver a amiga de um jeito diferente? É uma onda de sororidade. De apoio mútuo. Daquele reforço tão necessário de que, sim, podemos o que quisermos, quando quisermos, como quisermos.
O desabafo da Marta, maior artilheira da história das Copas, seis vezes eleita melhor do mundo, ao fim do jogo que eliminou a Seleção Brasileira na França, é um chamado a todas as mulheres. Não só para jogarem, mas para acreditarem no futebol feminino.
Nunca joguei bola. E, ainda assim, por conta da minha profissão, vivo o mundo da bola diariamente. A cada jogo da Copa na França todas entramos em campo. E esse jogo está só começando.
Eu nunca joguei bola. Mas, mais do que esse nunca, eu também quero fazer um pedido.
Vamos jogar juntas?