Anos atrás, quando eu acabara de me formar, constatei que meu salário era três vezes menor do que o antigo colega que ocupava a posição. Na época, enviei um e-mail à empresa explicando a situação. Eles preferiram me demitir a adequar o valor. De vez em quando, lembro desse episódio, pois a situação me empurrou a buscar novas oportunidades, que foram muito melhores para mim. Nem todos têm a chance de fazer o que fiz: eu era jovem, morava com a família e podia partir para o enfrentamento. Ganhar menos do que um homem de mesmo cargo não foi um privilégio meu, a maioria das mulheres ganha menos do que os homens na mesma posição. Pior do que isso: quanto mais elas estudam, mais sofrem diferença de salários, como acaba de revelar um estudo.
A pesquisa feita pela Fundação Getúlio Vargas mostrou que, no Brasil, os homens ganham em média 28% a mais que mulheres na faixa etária dos 40 anos, mesmo que ambos não tenham diploma de ensino médio. Se tiverem diploma universitário, homens ainda ganham 47,4% a mais do que as mulheres com o mesmo nível de escolaridade. A diferença entre salários não varia apenas com o quanto estudam, mas também com a idade. Nessa categoria, mulheres seguem ganhando menos. Homens ganham 10% a mais que mulheres aos 25 anos. Aos 35 anos, eles ganham 20% mais e aos 40 anos a diferença é ainda maior, 22% a mais nos salários. A diferença só diminui ao redor dos 50 anos, com homens ganhando 18% a mais do que mulheres.
A explicação para as mulheres ganharem menos, segundo o levantamento, pode estar ligada ao perfil da empresa, ao tipo de cargo e ao setor que ocupam. Creio que a diferença de salários ainda persiste por uma negação do problema, pela falta de transparência. Essa situação me faz lembrar do livro de Dan Ariely, A mais pura verdade sobre a desonestidade, em que ele explica que vários prejuízos em organizações e na sociedade resultam de pequenas trapaças que as pessoas costumam achar "ok" fazer e mesmo assim se consideram honestas. Pagar menos a uma profissional apenas por ela ser mulher é trapaça, é má-fé. São esses deslizes, as ditas trapaças de Dan Ariely, que causam impactos no todo.
Ainda vejo gente duvidando que isso, de fato, aconteça. Acredito que de agora em diante pode ser diferente. Para evitar que essas situações se repitam, sugiro que as mulheres não se envergonhem de pesquisar a média de salários na sua empresa e entender claramente por quais atribuições estão sendo pagas. Pode ser chocante descobrir que você faz parte da estatística e se enquadra no grupo que ganha menos do que seus pares do sexo oposto. Prefiro saber a ignorar.
Empresas sérias vão premiar a competência, a entrega, o comportamento, os resultados. E, claramente, isso não tem relação com gênero. O que vale é o esforço ser premiado, a cultura ser mudada e quem se dedica mais merece ganhar mais. É nisso que eu acredito. Quando aquela empresa lá me demitiu porque me atrevi a pedir o ajuste do salário, entendi que aquele não era meu lugar. Mudei-me.
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