:: O homem médio e o mínimo a ser feito :: Alguém chega para um homem e diz para que ele “se respeite”?:: A violência dos nossos filhos não é “só uma brincadeira”
É um baita de um clichê, eu sei, mas, diante de algo que aconteceu com uma amiga recentemente, me pus a pensar o quanto perdemos de viver por medo. Medo do ridículo, medo de rejeição, medo de bagunçar a vida. Medo.
Vou contar brevemente essa história.
Minha amiga passou anos numa roubada afetiva. Anos. Aí, depois de um vacilo histórico do cara, ela finalmente conseguiu deixar pra lá e se abrir pro mundo. Se abrir não significa sair em desespero atrás de algo que talvez nem esteja lá, significa apenas se abrir mesmo, ver o que tem, respirar e olhar em volta. E apareceu um cara. E eles se apaixonaram loucamente. Eles tinham tudo a ver e estavam vivendo um romance fofo. Numa sexta, ela mandou mensagem, ele não respondeu, ela ficou meio bolada... e descobriu que ele tinha sofrido um acidente de moto e morrido.
Eles viveram uma coisa. Mas imagina se não tivessem vivido e ficassem enrolando? Ain não vou responder agora, ain não quero pressionar, ain não quero me envolver?
Não consigo parar de pensar nesses vacilos da vida, de enrolar, de deixar pra depois, no tempo que perdemos e deixamos de estar com as pessoas que gostamos por... nada, por besteira, às vezes por preguiça. E eu nem estou falando só de relacionamentos, estou falando também das pessoas com quem temos a sorte de conviver, de ter nascido na mesma época e ter na nossa vida, nossas amigas, nossos amigos, a família escolhida ou não, sabe? Qualquer um pode morrer a qualquer momento. Semana passada eu fui assaltada, reagi e briguei com uns caras. Levei uma garrafada na cabeça e uns pontos, mas podia ter sido pior. Dei sorte. Apenas.
A gente só vive uma vez, eu acredito que depois daqui acaba tudo, e muitas vezes me vejo vivendo muito mal, trabalhando demais, negligenciando quem eu gosto, escolhendo dormir. Outro dia a Elvira Vigna, grande escritora brasileira, morreu. E a última mensagem que trocamos foi uma bronca dela com um cano meu. Eu ia na casa dela e não fui. E agora não vou poder ir nunca mais, porque ela morreu.
É óbvio. Todos sabemos que estamos aqui por tempo limitado, que a única certeza da vida é a morte, mas será que estamos aproveitando nosso tempo ao lado de quem queremos mesmo ou estamos vivendo umas vidinhas meia-boca, exaustos de trabalhar, de viver na cidade, de pensar demais, de conjecturar demais? O clichê só é clichê porque é verdade, afinal de contas, e eu não consigo parar de pensar que estamos aqui agora, mas podemos não estar mais em um piscar de olhos, e quem a gente ama também.
Ainda vou ficar pensando nisso por um bom tempo. É natural que a morte traga esse tipo de questão, e isso é bom, é um sacode, é uma maneira de nos fazer acordar e ver se não estamos já meio mortos. Eu não quero isso. Minha vida sempre foi intensa, e eu até já disse que queria saber viver menos, mas eu não quero, não. Não sei e não quero.
Evitarei vacilos, meus amigos e meus amores. Evitem também. Alguns são inevitáveis, mas outros você pode resolver agora mesmo pegando seu telefone e mandando aquela mensagem entalada na sua garganta, no seu peito. Não vivam menos. Vivam mais. Só dá pra fazer uma vez.
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