Aquela mulher usando uma burca preta totalmente fechada, com apenas uma telinha na altura dos olhos, me deixou hipnotizada. Eu não conseguia desviar o olhar. Ela era turista em Istambul, assim como eu. Nós duas empunhávamos uma máquina fotográfica e estávamos paradas em frente à mesma mesquita. Éramos duas mulheres num país estranho, mas será que haveria mais alguma semelhança entre nós?
Gostaria tanto de poder conversar com ela, saber mais sobre sua vida, mas tive receio de me aproximar. Sempre tenho a impressão de que elas - as que usam burca - não gostam muito do contato com as outras pessoas. Eu pensava em uma maneira de quebrar o gelo (quem sabe pedir que ela fizesse uma foto minha? Será que iria negar?) mas logo um homem se aproximou e ela o seguiu. Bem que eu estava achando estranho vê-la assim, desacompanhada, fazendo turismo. Por lá, isso não é comum. A moça de preto seguia alguns passos atrás de seu companheiro. Por que não andava ao seu lado? Há alguma lei que impede isso também?
Dias depois já tinha visto várias mulheres de véus de todos os tipos, mas confesso que não conseguia ficar indiferente a elas. Continuei "espionando". Famílias inteiras passeando pela Turquia, os homens de calças jeans e tênis, as crianças (meninos e meninas) também de roupas normais e elas sempre com aqueles vestidos pretos até os pés, e mais panos pretos na cabeça e no rosto. Como alguém pode correr atrás de um filho, pegar o pequeno no colo, alimentar a prole, fazer tudo o que uma mãe faz com aquela roupa toda? No bufê do hotel pude matar uma curiosidade: para comer, elas levantam só um pouquinho o véu do rosto para que o garfo possa chegar à boca. Que sacrifício!
Será que elas sentem inveja das mulheres que são livres para se vestirem do jeito que querem? Mostrariam o rosto e usariam roupas normais para sair à rua se fosse permitido? Que direitos elas têm na sociedade em que vivem? Queria muito saber o que elas pensam sobre tudo isso, e se nunca ficam indignadas por terem de seguir leis e costumes que, na minha opinião, não cabem mais no mundo de hoje.
Não foi desta vez que consegui me aproximar de uma mulher de burca. No máximo, cruzei o olhar com uma moça que, me pareceu, sorriu de volta. Quem sabe tenha mais sorte numa próxima oportunidade. Elas ainda são para mim um grande enigma a ser decifrado.