Martha Medeiros está em férias e retorna na edição do dia 14 de dezembro.
O presente perfeito deveria saltar aos olhos como um grande pacote vermelho sobre um jardim coberto de neve inconfundível, inescapável. Todo nosso carinho condensado em um único objeto, que por acaso custaria exatamente o que podemos pagar e nem um centavo a mais. Nenhuma hesitação, fila ou mesmo uma data compulsória determinando o dia e o motivo da entrega. Um presente tão espontâneo e único quanto o afeto que inspirou a vontade de presentear.
Ao abrir o presente perfeito, o destinatário seria tomado de surpresa e incredulidade. Como alguém poderia ter adivinhado que era exatamente aquilo que povoava seus sonhos? Neste momento, os olhos de quem dá e os olhos de quem recebe se cruzariam em um breve e intenso instante-presente, cheio de cumplicidade e reconhecimento mútuo.
Mais do que agrado protocolar, sinal de gratidão ou simples obediência ao ritual das datas comemorativas que exigem trocas de gentilezas, o presente perfeito seria aquele que se dá e se recebe com alegria. Na maior parte das vezes, porém, escolher presentes é tão prazeroso quanto cumprir um compromisso obrigatório. Queremos nos livrar da tarefa como de uma reunião de condomínio ou de uma ida ao supermercado: com eficiência, mas no menor tempo possível.
Compra-se rápido, talvez, porque descarta-se mais rápido ainda. Adivinhar o que uma pessoa gostaria de ganhar tornou-se o menor dos problemas hoje em dia. Todo mundo deseja alguma coisa - ainda que não por muito tempo. Vivemos cercados de possibilidades de consumo, desejos insatisfeitos e frustrações difusas, habituados a preencher com objetos diferentes tipos de vazios. Nesse ambiente, torna-se cada vez mais difícil emprestar a algo que se pode comprar algum tipo de significado que não seja o de ser consumido e substituído logo em seguida.
Para transformar uma mera troca de mercadorias em uma verdadeira troca de presentes, é preciso um pequeno exercício de subversão. Dizer não às compras apressadas, burocráticas, obrigatórias, cansativas. Mas se for impossível escapar delas, que cada presente chegue ao destinatário acompanhado de um gesto ou palavra surpreendente, pessoal, intransferível.
Talvez nossas tias não estivessem apenas nos enrolando quando diziam, envergonhadas, com um pacotinho vermelho da Sloper na mão: "É só uma lembrancinha, viu?".
Porque, no fim das contas, o presente perfeito, o que vale a pena dar e ganhar, é aquele que se transforma em lembrança assim que a gente o abre.