Há dois anos a Criativitá ensina o ofício da joalheria em Porto Alegre | Foto: André Ávila, Agência RBS Criativitá Escola de Joalheria | Foto: André Ávila, Agência RBS Alice Floriano exibe joias que expõe em sua galeria | Foto: André Ávila, Agência RBS As peças que levam a assinatura da joalheira | Fotos: reprodução Telefone: (51) 3377-5879 Valéria Sá é referência na joalheria sustentável | Foto: Bruno Alencastro, Agência RBS Fotos: reprodução Lisia Barbieri comanda a escola que também funciona como loja e espaço de exposições | Foto: André Ávila, Agência RBS Criativitá Escola de Joalheria | Foto: André Ávila, Agência RBS Eduarda Cadore aposta em ouro e prata, com destaque para gemas gaúchas | Foto: Bruno Alencastro, Agência RBS Fotos: reprodução Telefone: (51) 99875-0078 Entre as peças mais representativas do trabalho de Marcos Rosemberg, estão as criadas na técnica mokume gane| Foto: Bruno Alencastro, Agência RBS Fotos: reprodução Telefone: (51) 99913-3817 :: Rihanna lança coleção de joias em parceria com a Chopard :: #DonnaIndicaPoa: três lugares para comprar roupas, joias e acessórios com muito estilo em Porto Alegre :: Conheça a E’dore, grife gaúcha de joias feitas à mão
Por Ana Carolina Bolsson, especial
Nas etapas de desenvolvimento de uma joia, o atual momento da joalheria autoral gaúcha corresponde ao da solidificação: o metal assume forma e corpo. O cenário positivo é resultado do crescente trabalho que vem sendo realizado por profissionais e artistas, revelando força, diversidade e um consumidor receptivo. Empenhados em disseminar a produção de peças autênticas e feitas à mão, Alice Floriano, Marcos Rosemberg, Eduarda Cadore e Valéria Sá são alguns dos nomes que vale conhecer.
O sopro otimista do mercado também contribui. Retraído ao longo de 2016, o setor se recuperou no fim do ano, quando superou as estimativas de venda em 50%, e a Associação do Comércio de Joias, Relógios e Óptica do Rio Grande do Sul (Ajorsul) aposta em um grande 2017. Mais: as joias com pedras estão em alta - uma boa notícia para o Estado que está entre os maiores produtores do país de gemas como ametista, citrino e ágata. Mas também o consumidor vem surpreendendo. Se antes peças com design e materiais tradicionais eram as preferidas, hoje a demanda é mais diversificada.
– O consumidor gaúcho ainda é conservador, mas é um excelente comprador, que está mais exigente, ávido por novidade. Por isso o designer é fundamental - celebra Celso Stürmer, presidente da Ajorsul.
Se há demanda, cresce a oferta. Cursos práticos e teóricos de joalheria, de módulos rápidos a extensão profissional, são cada vez mais frequentes. Um deles é a Criativitá Escola de Joalheria, que abriu as portas em 2015 na Capital pelas mãos da designer Lisia Barbieri. Em dois anos, mais de 250 alunos passaram por lá em busca de refinamento e atualização.
– O trabalho manual já vem sendo valorizado, mas temos alto déficit de profissionais para algumas técnicas da joalheria. Por isso, é tão importante ter locais que ensinem cada vez mais os interessados em aprender – destaca Lisia.
Muitos nomes do Sul se consagraram no ramo, como Adriana Cauduro, Debora Ioschpe, Debora Dvoskin, Luciana Ceratti, Fabi Jorge, Bruna Heeman, Cesar Cony, Celso Dornelles e Rosa Leal. Com uma coleção recém-lançada, Rosa destaca que há lugar certo no mercado para quem investir em atendimento top de linha, estratégia online e, claro, design exclusivo:
– Em tempo de crise, o negócio que não se reinventar acaba.
De fato, está em curso uma mudança dentro e fora do porta-joias. As peças foram além do cofre e das ocasiões especiais e estão presentes no dia a dia. Conheça alguns dos criadores responsáveis por esta transformação e que estão lapidando tanto as preciosidades que têm nas mãos quanto o próprio ofício de fazer joia.
Garimpo de joias
Abandonar os conceitos do que se entende por joia. Pronto. Só assim se está apto para mergulhar no trabalho da artista joalheira Alice Floriano, 33 anos, em sua pioneira galeria de joias contemporâneas em Porto Alegre. Ela busca nas peças que garimpa o mesmo olhar autoral, exclusivo e inovador que imprime em suas obras, resultado de sete anos de estudo e aperfeiçoamento em escolas especializadas em Lisboa, Londres e Florença.
– Há uma infinidade de técnicas, e quanto mais se domina, mais liberdade se tem. Não temos grandes joalheiros contemporâneos no Brasil nem uma cara definida pela falta de uma escola técnica forte - destaca.
Em Portugal, ao trabalhar na galeria da renomada joalheira Tereza Seabra, Alice concebeu o projeto que inaugurou na capital gaúcha em 2015: a galeria de joias Alice Floriano, a primeira da Capital e uma das poucas do Brasil. No espaço, expõe e vende a partir da própria curadoria obras de 40 artistas consagrados e novos talentos promissores do cenário mundial e também do Brasil. Seu sonho é difundir a joalheria contemporânea como movimento artístico e expressão cultural:
– Percebi que havia mais sentido em mostrar o trabalho também de outros e não apenas apenas o meu.
As peças reunidas são mais do que colares, anéis e broches. "São objetos que se relacionam com o corpo", explica Alice, que selecionou criações de materiais inusitados, como carvão e cogumelo. Para ela, o valor da joia está na qualidade artística de sua criação. Por isso, usa as mais variadas matérias-primas e se autodenomina uma "catadora de coisas".
– Encontro no chão, no caminho, na praia, em uma viagem. São elementos que parecem pedir para virar uma peça - conta, garantindo ter uma clientela fiel e em crescimento dominada por mulheres com mais de 60 anos.
Empreendedora em meio à crise econômica, Alice não menospreza a joalheria comercial e admite que produzir peças em série seria mais simples em meio às dificuldade enfrentadas por uma concorrência tradicional e um mercado reticente.
– Foi uma escolha mais difícil, por vezes é desestimulante, mas é no que acredito. Ainda não dá lucro, pois todo o ganho volta em investimento para a galeria, mas recebo cada vez mais interessados e consigo me manter. E se manter já é uma grande coisa hoje em dia.
♦ As peças de Alice Floriano custam a partir de R$ 150, à venda na Galeria Alice Floriano (Rua Félix da Cunha, 1.143, Bairro Moinhos de Vento).
Mina de prata
Há 20 anos presente no mercado porto-alegrense de joias, Valéria Sá deu novo rumo para a sua marca na última década: virou referência quando o assunto é joalheria sustentável. Atenta às discussões sobre consciência ambiental em um momento em que a relação moda e sustentabilidade ainda era incipiente, a designer passou a desenvolver produtos que não agredissem a natureza, substituindo a produção predominante em ouro por peças feitas a partir de prata reciclada extraída de chapas de raio-x de hospitais.
– É um trabalho verde e limpo que vai contra o consumo desenfreado. É um luxo ser sustentável, saber de onde saiu, como foi manipulado e que está aquecendo a economia local. É um estilo de vida. Desde então, passei a consumir com mais consciência e até meu guarda-roupa mudou – conta a designer que tem cursos realizados em São Paulo.
Suas criações desbravaram um mercado tradicional até serem consideradas um dos melhores exemplos locais de upcycling - processo de transformar resíduos descartáveis, evitando o desperdício. Também precisou vencer a resistência de clientes em relação à prata reciclada e a seu processo de extração. Inúmeras vezes precisou garantir que as joias não eram radioativas
– A prata sempre foi vista como um metal de segunda. Hoje, qual a grande joalheria não tem coleções inteiras feitas com ela? – questiona.
Além de colares, brincos, pulseiras e anéis em prata, também tem uma linha feita de vidros verde e azul de garrafa com a mesma lapidação de pedras preciosas e outra com pneu de bicicleta reciclado. E Valéria mantém ainda seu trabalho de reforma em ouro, serviço cada vez mais procurado depois da crise.
– Reaproveitar é a única forma de se manter vivo, e com a joia não é diferente. Ganhei novos clientes que em vez de adquirir uma peça, agora trazem as suas não utilizadas para reforma. Nunca trabalhei tanto.
♦ Peças a partir de R$ 30, à venda no site e no ateliê da marca (com hora marcada) e também no Coletivo 828, iniciativa que reúne criadores com o mesmo conceito na Capital.
Em valeriasa.com.brTelefone: (51) 3331-8937
Partilhar paixão
Lisia Barbieri atuava havia 10 anos como advogada quando foi apresentada à joalheria como arte e ofício pelo joalheiro gaúcho Cesar Cony. Maravilhada com o processo artesanal de produção de peças autorais, não teve dúvida quando comunicou o pai que mudaria de área de atuação "para ser mais feliz". Estimulada pelo mestre, estudou por um tempo em Florença, berço da joalheria, na Alcchimia Scuola di Gioielleria, e participou de exposições pela Europa.
Vinte anos depois, dedica-se a criar joias com um conceito contemporâneo, mas é à frente da Criativitá Escola de Joalheria que realiza seu maior projeto: ensinar e compartilhar conhecimento com quem nutre a mesma paixão pela joia autoral, tal qual aprendeu com seu mentor.
– Muitos profissionais que aprenderam técnicas de ourivesaria na família nos procuram, mas também já recebi filhos de dono de joalheria querendo aprender porque não tinham o ensinamento transmitido dentro da própria casa – diz Lisia.
Inaugurada no início de 2015 em Porto Alegre, a Criativitá tem 10 cursos, desde os iniciais até os mais específicos. Lisia revela que já recebeu pessoas com recomendação médica para o curso de joalheria - trabalho manual lento e meticuloso -, mas a maior parte é de homens e de mulheres dispostos a trocar de profissão, além de uma parcela que tem a atividade como um hobby.
Além das aulas, a escola, instalada em uma ampla casa no bairro Boa Vista, funciona ainda como loja e espaço para exposições e workshops com instrutores de outras localidades do Estado e do país. Tudo é fruto do esforço de Lisia em difundir a ideia da joalheria autoral.
– Ainda há quem creia que fazemos a partir de molde, sem entender que alguém desenhou e fez à mão. A joalheria fascina porque permite a qualquer hora desmanchar e começar novamente.
Em criativitaescolajoalheria.com.brNa Alameda Sebastião de Brito, 90, em Porto Alegre.
Telefone: (51) 3019-8055
Preciosidades daqui
Eduarda Cadore começou a criar suas próprias joias depois de uma longa busca sem sucesso no mercado tradicional joalheiro. O desenho das peças não lhe agradava nem lhe despertava desejo. Curiosa, a designer de produto formada pela UFRGS fez o primeiro curso de joalheria em 2014. Nascia ali a E'Dore, marca de joias em pequenas séries e encomendas personalizadas, lançada oficialmente um ano depois em Porto Alegre.
No início, a ansiedade para colocar a mão na massa e usar peças próprias era tão grande que Eduarda criou um conjunto de anéis já no primeiro dia de aula na Escola Gaúcha de Joalheria.
– Moldei direto no metal e já saí da aula usando - lembra a designer de 25 anos, que seguiu com treinamentos teóricos e práticos por três anos.
Hoje, ela busca preencher uma lacuna que percebe no mercado da joalheria: mira nos consumidores que não se identificam com as marcas atuais, não gostam do design encontrado ou simplesmente acham as peças muito caras.
– Busco chegar neste público, mostrando que joia é um investimento possível.
Segundo Eduarda, a joalheria autoral, assim como outros nichos de mercado, não apenas se beneficia como é resultado do surgimento de um novo tipo de consumidor, mais informado, consciente e, principalmente, ávido por autenticidade.
– Isto é ótimo, pois além da joalheria autoral ser uma expressão artística única, também valoriza a produção slow made e local.
Seus anéis, chokers, argolas, braceletes, colares e brincos em ouro e prata para pronta-entrega têm desenho minimalista, atemporal e delicado, mas de personalidade. Em encomendas, também utiliza pedras tradicionais, como diamante, rubi e safira, mas tem predileção pelas gemas gaúchas, especialmente as de sua terra natal, Alegrete, como ágata e quartzo. Esta última, inclusive, têm chamado a atenção das clientes no ateliê pela variedade de cores e de formas:
– Buscamos mostrar as belezas da nossa terra porque muitas pessoas nem imaginam as preciosidades que temos.
♦ Peças a partir de R$ 169, à venda no site da marca e, em breve, na loja Pandorga.
Em edore.com.br
Caminho próprio
O porto-alegrense Marcos Rosemberg, 36 anos, percorreu diferentes caminhos até se tornar um dos destaques da joalheria contemporânea no Brasil, com reconhecimento internacional. Autor de peças inspiradas na natureza, cria coleções com técnicas variadas, que rompem a linguagem visual das joias tradicionais.
Foi por influência da namorada que Marcos se interessou por joalheria e fez um curso técnico no Senai-RS. Autodidata, aprendeu e desenvolveu técnicas que mais tarde contribuíram para transformar o hobby em profissão. Chegou a se formar em Comércio Exterior, com MBA em Negócios Internacionais, mas percebeu durante as madrugadas de testes em metais que ali estava o seu caminho.
– Descobri que a gente tem de ser apaixonado pelo que faz. Mas só me permiti sentir isso naquele momento e então fazer o que de fato queria.
Em 2007, Marcos mudou-se para a Dinamarca, país referência em design, onde aperfeiçoou-se no Instituto de Metais Preciosos. Seu ingresso atípico sem certificação exigiu que comprovasse de forma prática o domínio de técnicas.
– Tive um mestre também autodidata que, antes de ensinar a técnica, fazia eu me questionar como executar cada procedimento. Então, eu ia tentando e, neste processo, aprendi a buscar minha própria maneira de fazer as coisas – conta.
Os materiais que mais usa são ouro, prata e cobre, mas mantém especial afeição por elementos inusitados, como um milenar dente de tubarão encontrado no Marrocos que adorna um de seus pingentes, ou uma ágata amarela de rio não lapidada em um de seus anéis. Entre as peças mais representativas de seu trabalho, estão as que faz com a técnica mokume gane: levam até 36 camadas de ouro, prata, cobre e diferentes ligas que, quando finalizadas, exibem aspecto singular em anéis, broches, pulseiras, brincos e pingentes.
♦ Peças a partir de R$ 400, à venda no Instituto Ling, na Loja Pandorga e na Fundação Iberê Camargo. Também comercializa em pontos físicos de Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo, Estados Unidos e Dinamarca.
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