Por Marcelo Perrone
Que peso tem o Oscar na carreira de um ator? Eddie Redmayne, inglês de 33 anos pouco conhecido até a consagração com a estatueta dourada no domingo passado, está agora em um novo patamar. O troféu da Academia fechou com pompa a lista de prêmios que ganhou na temporada por um filme badalado, A Teoria de Tudo, mas não é garantia de um futuro entre os grandes, visto e sabido que, no fugaz mundo do showbiz, manter-se no topo é bem mais difícil do que a escalada até lá.
Já o Oscar erguido por Julianne Moore, norte-americana de 54 anos reconhecida como uma das mais talentosas estrelas do cinema de sua geração, tem o sabor de uma reparação tardia. A estatueta celebra uma trajetória repleta de filmes memoráveis e vai dividir espaço com os troféus que ela já conquistou nos três mais importantes festivais do mundo: melhor atriz em Berlim, com As Horas (2002) - honraria compartilhada com as colegas de elenco Meryl Streep e Nicole Kidman; em Veneza, por Longe do Paraíso (2002); e em Cannes, com Mapas para as Estrelas (2014). É a chamada tríplice coroa da atuação cinematográfica, mérito alcançado por poucos no ofício.
Tudo sobre o Oscar!
Este sabor de reparação é acentuado por ser Para Sempre Alice (2014), trabalho que valeu Julianne o Oscar - e mais uma penca de prêmios -, uma produção modesta à qual ela deu visibilidade com mais uma de suas vigorosas atuações. Sob a direção de Richard Glatzer e Wash Westmoreland, Julianne interpreta Alice Howland, respeitada professora de linguística que subitamente começa a ter lapsos de memória. Diagnosticada com Alzheimer, aos 50 anos, ela encara a precoce manifestação da doença e a progressiva deterioração de sua mente espelhada no vigor de seu corpo. É uma provação terrível para Alice, por mais conforto e carinho com que lhe cerquem o marido (Alec Baldwin) e as filhos (Kate Bosworth, Hunter Parrish e Kristen Stewart). A estreia de Para Sempre Alice no Brasil está prevista para 12 de março.
Esta fantástica temporada vivida por Julianne tem como ápice Mapas para as Estrelas, de David Cronenberg, projeto por demais ácido para figurar na festa da Academia de Hollywood, justamente pela forma com que retrata o mundo das celebridades em sua própria casa. Entre tipos desajustados como um chofer que aspira ser ator, um milionário guru de autoajuda e um astro da TV adolescente que já cumpre temporada em clínicas de reabilitação, Julianne vive Havana, atriz decadente que sonha em fazer o remake do filme que levou sua mãe ao estrelato nos anos 1960. Entra em cartaz no Brasil dia 19 de março.
Em meio a estes dois filmes que lhe renderam os mais cobiçados prêmios do cinema, Julianne desfilou talento e versatilidade em 2014 por produções tão distintas como um novo capítulo do blockbuster Jogos Vorazes e o thriller de ação Sem Escalas. Da mesma safra, a aventura fantástica O Sétimo Filho chega ao circuito nacional em 12 março.
A filmografia de Julianne tem a diversidade de gêneros como característica, da comédia romântica ao terror, de projetos independentes e produções assinadas por diretores renomados, entre eles Robert Altman (Short Cuts - Cenas da Vida e A Fortuna de Cookie), Paul Thomas Anderson (Boogie Nights: Prazer Sem Limites e Magnólia), Steven Spielberg (O Mundo Perdido: Jurassic Park), Ridley Scott (Hannibal) e irmãos Coen (O Grande Lebowski). Também prestigia amigos e iniciantes no ofício, como o estilista Tom Ford (Direito de Amar).
Com o diretor brasileiro Fernando Meirelles, Julianne fez Ensaio Sobre a Cegueira (2008), experiência que ela diz estar entre as mais desafiadores e estimulantes de sua carreira. Para estrelar a adaptação do livro homônimo, elogiada pelo próprio autor, o escritor português José Saramago, Julianne encarou transformações físicas sugeridas pelo diretor para compor sua personagem. E foi além de cortar o cabelo e usar enchimento nas roupas para ampliar as formas do corpo esguio. Por iniciativa própria, pintou de loiro os cabelos ruivos, sua marca visual mais característica.
— Quando se encontra um diretor no qual se tem plena confiança, cabe ao ator oferecer o melhor de si. Achei que o loiro combinava mais com o tom do filme, que retrata a cegueira pelo excesso de luz, com muito branco e cores saturadas — disse Julianne quando veio ao Brasil promover o filme.
#RuivoMania
— Julianne é extremamente generosa, criativa e defende suas ideias. Eu a adorava ruiva e não queria que ela pintasse o cabelo. Mas, um dia, ela simplesmente apareceu loira e me convenceu — complementou Meirelles.
Na ocasião, Julianne revelou que, após filmar cenas em São Paulo, voltou ao Brasil para conhecer a Amazônia na companhia de seus dois filhos com o diretor Bart Freundlich, companheiro da atriz desde 2003 e a quem ela dedicou apaixonadamente o Oscar no palco do Teatro Dolby semana passada.
Nascida na cidade na Carolina do Norte, em 3 de dezembro de 1960, Julianne viveu em diferentes países por conta do trabalho do pai militar. Quando a família assentou moradia em Boston, ela dedicou-se ao estudo de artes dramáticas e, no começo dos anos 1980, foi tentar a sorte em Nova York percorrendo palcos do circuito off-Broadway. Após a estreia diante das câmeras, na minissérie de TV I'll Take Manhattan (1987), galgou papéis secundários na TV e no cinema - pouca gente deve lembrar dela fazendo figuração em filmes como A Mão Que Balança o Berço (1992) e O Fugitivo (1993).
Uma característica de Julianne que a faz ser admirada por todos que com ela trabalham é que, mesmo após reconhecida como grande atriz, segue abraçando projetos nos quais nem sempre tem papel protagonista, seja um blockbuster ou um filme independente. Trabalha com uma pouco comum combinação de talento, prazer e dedicação, como quem sabe que sempre será notada - e não apenas por sua cabeleira vermelha.
* marcelo.perrone@zerohora.com.br