Que as redes sociais nos sequestraram, novidade nenhuma. É a primeira coisa que se faz pela manhã, com o olho semiaberto: ver que horas são no aparelho celular. Daí em diante, entramos em cativeiro digital. Somos abduzidos pelo telefone que não é mais telefone, e sim fonte de informação, fofoca, entretenimento e egotrip.
Da simples bisbilhotagem passamos para a hipnose consentida. Para minimizar o estrago, sigo uma turma de reconhecida credibilidade e inteligência. São jornalistas, filósofos, psicanalistas, médicos, escritores, fotógrafos, músicos, atores, humoristas e alguns canais de notícia.
Em troca, recebo dicas de leitura, vídeos turísticos e de arte, poemas, muito ativismo, entrevistas e trechos de programas que perdi – uma cachaça cultural que entusiasma e estimula. O problema é que os algoritmos não sossegam enquanto não nos capturam, e então surgem os milagreiros comerciais no meio da “programação”. Quer emagrecer 30 quilos em 10 dias? Quer acabar com a insônia de forma definitiva? Quer ter um rosto sem marcas de expressão? Clique aqui e saiba mais.
“Saiba mais” é uma minhoca na ponta do anzol se enrabichando para um bagre. Você não é um bagre, mas, quando vê, está estendido na margem do rio, fisgado.
“Saiba mais” conduzirá para um vídeo de 25 minutos onde um estranho vestindo um jaleco se anunciará como especialista em algo que vai mudar sua vida em seis prestações.
“Saiba mais” apresentará roupas que ficam perfeitas em mulheres que pesam 40 quilos. “Saiba mais” é um teste sobre o quanto você sabe sobre você: pouco ou nada?
Nas poucas vezes em que cliquei no “saiba mais”, perdi um tempo precioso em que poderia estar lendo um livro e realmente sabendo mais. Eu, de novo, insistindo em leitura, mas se alguém te convida a saber mais, você busca o quê? Um catálogo de vendas?
Investir em conhecimento é o antídoto para o impulso de comprar por comprar. Temos sido seduzidos pela facilitação de realizar nossos desejos, sem perceber que, na maioria das vezes, são desejos provocados pelo imediatismo da oferta. A gente coloca nossa carência no carrinho, confirma a aquisição e parabéns, você acaba de ficar um pouco mais falido.
Abro a gaveta do banheiro e penso: três batons não seriam suficientes? Encontro um creme que perdeu o prazo de validade antes que eu o abrisse. E a ciranda das ilusões segue girando. Inglês fluente em um mês. Sapatos que nunca apertarão. O fim da queda dos cabelos. Enquanto isso, ninguém procura formas consistentes de combater o próprio vazio, poucos discutem essa sociedade que se alimenta da frustração e já não há controle para os elevados índices de ansiedade. Contrariando os apelos tecnológicos, o benefício de saber mais é, entre outros, não precisar consumir tanto.