"Peguei o metrô para trabalhar e fiquei observando mulheres entrando no vagão e correndo para assentos onde a vizinha é outra mulher. Faço isso sempre, no automático. Dependendo de como o sujeito sentado olha pra nós, viajo em pé, como faço agora. É horrível viver apreensiva e desconfortável."
O parágrafo acima foi postado por uma amiga, dias atrás, em sua página no Facebook. No mesmo dia, outra amiga postou: "O mundo é um lugar horrível para ser mulher". Tenho lido depoimentos similares em blogs, sites, entrevistas e crônicas. Sempre dados por mulheres esclarecidas, inteligentes – e em pânico.
As mulheres (e alguns homens) lutam para combater o machismo e não há como ser contra esse movimento. Dois casos recentes ganharam projeção na imprensa e provocaram justa revolta. O de Clara Averbuck, escritora a quem sempre admirei e atual colega de ZH, que foi estuprada por um motorista do Uber, e o do homem que ejaculou sobre uma mulher dentro de um ônibus em SP – aliás, duas vezes na mesma semana. Parece que ele foi diagnosticado com problemas mentais, mas isso não atenua o abuso, só muda a forma como ele deve ser tratado.
Por essas e outras, as mulheres continuam brigando por seus direitos. O discurso alarmista ajuda a chamar a atenção para os problemas, mas discordo quanto ao mundo estar se tornando pior para as mulheres. Ao contrário, está melhorando para as mulheres. Trabalhamos, estudamos, viajamos sozinhas, casamos se quisermos, temos filhos se quisermos, temos liberdade sexual, presidimos micro, médias e grandes empresas, assim como Estados e países. Além de secretárias e professoras (as clássicas profissões "femininas"), somos policiais, juízas, jogadoras de futebol, jornalistas, cineastas e o que mais desejarmos ser. Ainda em menor número, sim. Com salários menores, sim. Sofrendo violência doméstica, sim. Ainda sem direito ao aborto legalizado, sim. Logo, é preciso continuar batalhando para conquistar ainda mais espaço e respeito, como vem acontecendo de forma crescente, e não decrescente.
Horrível o mundo se tornará se passarmos a não sentar ao lado de homens nos coletivos, se mudarmos de calçada a cada vez que um sujeito vier em sentido contrário, se considerarmos cada um deles como um tarado em potencial. Isso não seria parecido com o que se faz com negros? Com pobres? Horrível é a paranoia e o preconceito. Devemos continuar denunciando crimes e não aceitando desaforos, mas sem mudar nosso comportamento, ou voltaremos para o confinamento doméstico, de onde saímos com tanto orgulho um dia. Não temos chance ao enfrentar um homem fisicamente, mas a razão está conosco e é com ela que fundaremos uma sociedade cada vez mais unissex e civilizada, sem precisar promover apartheid nenhum.
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