Entre tantos assuntos importantes e urgentes e tristes e preocupantes, segue a praga do etarismo. Modernamente, o preconceito contra pessoas de mais idade que existe desde o tempo do Ariri Pistola – para usar uma expressão que apenas pessoas de mais idade entenderão.
Quem é Ariri Pistola? Não faço ideia. Deve ser contemporâneo da vó do Badanha. Frequentador da casa da Mãe Joana. Alguma coisa assim.
Escrevi uma coluna sobre esse tema, o etarismo, a propósito das universitárias de Bauru que debocharam da colega de 40 anos. Com exceção de um cidadão de 67 anos que volta e meia escreve para pautar o que deve ou não ser publicado nesta coluna e que declarou nunca ter sofrido qualquer preconceito por conta da idade, muitos queridos leitores se identificaram com o assunto e contaram suas experiências ao adquirir o selo de qualidade Não Cozinha na Primeira Fervura.
Com muito orgulho. O Rolnei Correa Pinto é médico em atividade e, aos 72 anos, pedala 20 quilômetros por dia. Há quatro anos, de bicicleta na estrada, foi atropelado por um jovem e imprudente barbeiro – não o profissional, mas o mau motorista. O Rolnei conta que, ao acordar, ouviu o rapaz dizer, chorando: nunca pensei que atropelaria uma pessoa de idade!
Foi a pior parte da desventura, diz brincando o Rolnei, que escapou com o capacete rachado e uma concussão cerebral. Nada que o impedisse de, tão logo curado, continuar pedalando seus 20 quilômetros por dia. Todos os dias.
O seu Sidney, que casou novamente depois dos filhos já formados e dos netos crescidos, conta que continua aproveitando a vida e o tempo. Com mais de 90 anos, acaba de renovar a carteira de motorista e segue circulando pela cidade.
Mais de 90 anos também tem o seu Jorge, que fez concurso para Auditor Fiscal depois de uma carreira de muitos anos como bancário. Bem-humorado, ele diz que só não vai dar o conselho de Nelson Rodrigues aos netos – “Envelheçam!” – porque poderia soar como uma praga.
A Silvia, advogada de 73 anos, acorda às 6h30min, cuida da filha, alterna o trabalho remoto com o presencial e não pretende parar tão cedo. A Iara e suas oito décadas seguem fazendo aula de dança e de pilates e tratando pessoalmente de todos os seus negócios, com uma memória de dar inveja a qualquer um. Já a Priscila revela que ouviu absurdos em entrevistas de emprego, com as justificativas mais furadas dos recrutadores para disfarçar – sem conseguir, óbvio – que o único problema era a idade dela.
A Anna Maria Petrone Pinho respondeu com poesia a um deselegante que a lembrou de sua idade. “Quando estou comigo mesma/ Pouco me importa a verdade/Não tenho certidão de nascimento/ Nem cédula de identidade/ Tenho a idade do momento/ Não a do documento”.
Tirando o colágeno perdido, viver muito é a maior de todas as vantagens. Mas isso não é todo mundo que percebe. Carece de ter muitos e muitos anos para entender.