Ele tem seis metros de altura e pesa 900 quilos. É monstruoso, mas seus criadores esperam que também seja comovente. E está vindo para a Broadway nesta temporada.
King Kong chega em outubro com a peça homônima em um musical de U$35 milhões, que vem sendo desenvolvido há quase uma década, em meio a idas e vindas de scripts, músicas e equipes criativas, enquanto os produtores tentam realizar um show digno deste personagem.
Ele vai funcionar como um robô, ao contrário de qualquer boneco que a Broadway experimentou antes – uma escultura em movimento, com olhos tristes e um rugido temível, que exige 14 pessoas, além de 16 microprocessadores, para ser operado.
A marionete é de certa forma tão realista quanto suas coestrelas – ele não canta nem dança, mas se move e emite sons como um gorila de verdade.
— É um personagem expressivo com uma gama incrivelmente ampla de emoções, e tive que intensificar a minha atuação para competir com ele. Quando nos vimos pela primeira vez, ele rugiu e eu comecei a soluçar – não parece pertencer a este mundo, e isso é a coisa mais comovente nele — disse Christiani Pitts, a atriz interpretando Ann Darrow, cuja relação com o Kong é o cerne do musical.
King Kong é o primeiro empreendimento para a Broadway da Global Creatures, uma produtora australiana audaciosa que está tentando desenvolver quatro espetáculos musicais ao mesmo tempo. Antes de produzir peças para o teatro, a Global Creatures fez milhões de animais animados para o show de arena com foco em turismo chamado "Walking With Dinosaurs", bem como uma versão de Como Treinar o seu Dragão.
O Kong do espetáculo é de muitas maneiras um descendente desses dinossauros – ele compartilha suas entranhas robóticas. Mas sua árvore genealógica tem outros galhos – particularmente o bunraku, a forma tradicional de teatro de marionetes japonês em que o titereiro pode ser visto pelo público, bem como o sucesso do século 21 em Londres e na Broadway, War Horse, que estrelava um cavalo em tamanho natural em forma de boneco conduzido por humanos que era visivelmente inanimado, mas também afetivamente realista.
Kong é indiscutivelmente o avanço mais significativo em fantoches da Broadway desde O Rei Leão, a obra de Julie Taymor. E, como Taymor, Sonny Tilders, que projetou o King Kong, diz que foi influenciado pelo tempo que passou na Indonésia. Sua inspiração, particularmente as representações indonésias de um rei macaco hindu chamado Hanuman, ajudaram-no a pensar a relação física entre o fantoche e aqueles que o operam.
— Se você atingir um realismo sublime, será perdoado por existirem coisas que não fazem realmente parte dele — disse Tilders, que é o diretor criativo da Creature Technology Co., empresa de animações, separada da Global Creatures em 2015, que foi responsável pela produção de Kong e as criaturas da arena.
— É a pergunta que sempre me faço: por que posso pegar um saco de papel ou uma meia, colocar na minha mão e imediatamente reconhecer vida? Porque você quer ver vida. É claro que você sabe que não é real e você senta ali sabendo que é um palco e que todos são atores, mas nós amamos usar nossa imaginação. É o que nos separa dos outros grandes primatas — disse Tilders.
Kong, gorila musculoso e careca, tem o esqueleto de aço e o crânio de fibra de carbono. Suas costas e quadris são moldados em conchas de fibra de vidro; seu peito e abdômen são airbags infláveis, permitindo que se movam, enquanto seus braços e pernas são tubos infláveis de alta pressão, reduzindo o risco de lesão para os atores e para o set. Seu corpo, que dos assentos do teatro parece ser tenso e resistente, é realmente suave ao toque, coberto com uma pele feita de tecido cinza.
E seus olhos – completamente pretos (como muitos primatas não humanos, Kong não tem a parte branca do olho visível), feitos de com um acrílico que brilha como se estivesse úmido.
— Todo mundo vai ficar impressionado com o peso, o tamanho e sua versatilidade, mas a coisa que realmente impactante são seus olhos poderosos — disse Drew McOnie, diretor do musical, que voou de Londres para Melbourne para conhecer o boneco em um armazém antes de começar o trabalho.
“Isso pode me fazer parecer um esquisitão, mas ele definitivamente tem uma aura que está relacionada com os olhos – reflete a pessoa que o observa e isso acaba sendo muito teatral e bonito.”
Apesar de seu peso, Kong pode correr, deslizar pelo chão e saltar no ar; ele também parece segurar Ann Darrow e escalar as paredes do set.
É preciso uma equipe de 10 artistas no palco, apelidados de Companhia do King, para mover manualmente seus membros. Eles empurram, puxam (através de cordas), e até mesmo usam torque nas costas da criatura para forçar os seus punhos para cima.
— Eu sinto que somos ele – não daria certo se funcionássemos como indivíduos — disse Lauren Yalango-Grant, aluna da companhia de dança Pilobolus, que faz sua estreia na Broadway como membro da Companhia do King, normalmente trabalhando com a pata traseira direita e às vezes com seu cotovelo direito. "Parece que está vivo. E quando está sofrendo, você quer consolá-lo", disse ela.
Yalango-Grant é uma das duas mulheres da Companhia do King. Em uma produção anterior, em Melbourne, em 2013, o grupo era todo composto por homens; para a Broadway, McOnie sugeriu que mulheres fossem contratadas e elas atuam com o grupo quando Kong não está no palco.
Três "operadores vudus" nos bastidores controlam parte da ação em um estande à prova de som. São responsáveis por manipular os quadris, ombros, pescoço, cabeça e as expressões faciais usando joysticks e pedais que operam motores e partes hidráulicas dentro de seu corpo.
Kong também tem seu próprio diretor de movimento, Gavin Robins, que saiu do mundo do teatro físico e tem experiência em acrobacias e coreografias aéreas. Ele assistiu documentários, vídeos do YouTube, e até mesmo os filmes "Planeta dos Macacos". Em seguida, a Creature Technology fez estudos de animação para descobrir como manter Kong se movendo de forma realista.
E claro, mesmo um gorila tem que descansar: Robins disse que um sinal de sucesso na Austrália era que, quando ele bocejava, parte da plateia fazia o mesmo, sugerindo uma identificação.
Kong é dublado, ao vivo, por um dos operadores vudus, Curt James, que cria sua respiração pesada, seus rosnados, gemidos, gritos, suspiros, espirros e grunhidos. A voz de James é digitalmente modulada – processada e misturada com amostras sonoras – em tempo real para torná-la mais profunda e animal.
— Quero soar o mais próximo possível de um gorila — disse James, ator britânico que participou de produções bunraku em Londres e, em seguida, passou anos em "War Horse" e o recriação recente de "Angels in America" (ajudando a animar as asas do anjo).
— Talvez a gente desvie um pouco do naturalismo, como toda peça de teatro, mas não queremos entrar em um território antropomórfico. A única maneira de esta história funcionar é mantê-lo o mais animalesco possível — disse ele.
O musical King Kong segue a história do filme original de 1933: uma criatura terrivelmente grande vivendo em um lugar chamado Skull Island, que se encanta por uma jovem (Ann Darrow), é capturada por um cineasta (Carl Denham) e transportada para Nova York para que sua a monstruosidade possa ser monetizada. Ele se liberta, sai irado destruindo a cidade e depois escala o Empire State com Ann, para então ser abatido e morrer.
Mas a monstruosidade de Kong está em debate, já que qualquer versão da história nos tempos atuais levanta a questão de quem é o monstro quando uma criatura selvagem é enjaulada.
— A megalomania por trás de tudo isso se torna mais forte quando você está vendo uma criatura cheia de realidade. Quanto mais perto que ele chegar de um animal selvagem, mais poderosa a história pode ser — concluiu Robins.
Por Michael Paulson