Quando o torrão natal fica pequeno demais para uma banda? O que é preciso para que ela busque novos desafios em outras geografias? Ao sair de Santa Maria para Porto Alegre no início dos anos 2000, a Vera Loca tinha certeza que o destino a levaria para além do Mampituba. Hoje, lançando seu novo disco, A Certeza de Como Valeu Navegar Nesse Mar, a perspectiva é outra.
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– Quando lançamos nosso primeiro disco, a indústria estava em plena transformação. Era preciso prensar 200 bolachinhas e fazer com que elas chegassem de alguma forma às pessoas – diz Fabrício Beck, vocalista da Vera. – Hoje, é só apertar "enter".
Com mais de 15 anos de carreira, a Vera Loca (Verinha, para os íntimos) é uma banda consolidada na cena musical do Rio Grande do Sul. O que significa que ela vive – e vive bem – por aqui. São sete discos lançados, dois deles registros ao vivo em palcos nobres da Capital (Opinião e Theatro São Pedro); uma base de fãs sólida que garante shows quase todos os finais de semana – a maioria, lotados. E ainda a benção de totens locais: o primeiro álbum foi produzido por Duca Leindecker, enquanto o mais recente tem a participação de Humberto Gessinger (na faixa Amanhã Pode Ser Bem Melhor).
Não que a vontade de explorar a geografia do País tenha esfriado entre o quinteto. Tanto que a turnê de lançamento de A Certeza... começou no final de semana por São Paulo, passa nesta terça por Belo Horizonte, segue para Rio de Janeiro e Paraná e finalmente chega ao Rio Grande do Sul, no dia 13. A diferença, aponta Fabrício, é que a vida se tornou maior – e mais interessante.
– Passamos todos por um processo de amadurecimento musical e pessoal nesses 15 anos. Começamos a banda antes dos 20, hoje todo mundo já passou dos 30 e virou pai de família (risos). Ainda temos muito viva a vontade de crescer, mas estamos mais tranquilos.
Esse momento refletiu em A Certeza... Fabrício, Diego Dias (teclados), Hernan Gonzalez (guitarra), Filipe "Mumu" Bortholuzi (baixo) e Luigi Vieira (bateria) levaram um ano na pré-produção, enquanto seguiam na divulgação do álbum ao vivo lançado em 2015. Quando se reuniram em estúdio, decidiram pela primeira vez tomar as rédeas do trabalho e assinar a produção total do disco. Pela primeira vez também entraram composições de todos os integrantes, que gravaram as faixas em formato ao vivo.
– Pensando nessa história, nesse público que acompanha a gente por todo esse tempo, esse disco não poderia ter um título melhor – define Fabrício.
LANÇAMENTOS
[A]
Erick Endres
Erick Endres tem arte no coração e na alma. Isso já estava claro no seu primeiro disco, lançado em 2013. Na época, especulava-se que Erick ainda tateava em busca de um caminho. [A], terceiro EP de uma trilogia iniciada no ano passado, mostra que ele não está em busca de caminho algum. E como é gratificante a frustração por não conseguir achar rótulos que o definem. Claro, o menino continua discípulo da psicodelia, Jimi Hendrix é seu pastor e nada lhe faltará. Mas, a exemplo dos trabalhos anteriores, Erick segue expandindo seu universo de influências. É possível, por exemplo, ver muito do space rock moderno do Muse na faixa de abertura, You Have Lost Your Soul, enquanto She incorpora elementos eletrônicos. Icarus bebe do metal clássico, puxado para o blues, e poderia bem estar em qualquer disco da primeira fase do Deep Purple. Excelente aperitivo para Mystic Love, trabalho completo previsto para o meio do ano. Rock, 4 faixas, Loop Discos, disponível para audição nos serviços de streaming.
IN-TER A-LI-A
At the Drive-In
Dezessete – eu disse, DEZESSETE – anos depois, finalmente temos um novo disco do At the Drive-In. E mesmo sem a presença do fundador Jim Ward, dá para garantir: que belíssima tijolada é esse In-ter A-li-a. Trazendo Cedric Bixler-Zavala e Omar Rodríguez-López (a dupla do The Mars Volta) na linha de frente, o álbum é um moedor de tímpanos do mais alto quilate. Claro que, a exemplo dos trabalhos anteriores, nada aqui é gratuito. A começar pela base de sustentação, o duelo do vocal dramático de Cedric com a guitarra venenosa de Omar, como se um não pudesse existir sem o outro, deixando o restante da banda na posição de coadjuvantes de luxo. É interessante como faixas como Continuum e Torrentially Cutshaw tem um sabor nostálgico, de uma época em que era possível fazer música incrível tendo o punk e o hardcore como base, apenas retrabalhando elementos dos dois gêneros. Já outras, como a abertura No Wolf Like the Present, são pancadas do começo ao fim e só. Claro que eles não negam o DNA da esquisitice, presente aqui na poderosa Ghost-Tape No. 9. Rock, 11 faixas, Rise Records, disponível para audição nos serviços de streaming.
POLLINATOR
Blondie
O Blondie sempre foi um corpo estranho. Quando surgiu, em 1977, apresentava seu new wave no CBGB, berço do punk rock. Voltando de longo hiato, no final dos anos 1990, deu de se aventurar em discos mais orientados para experimentações eletrônicas. Agora, aposta em um disco que relembra seus primeiros anos, um pop dançante, tocado em sua maior parte com vigor e brilho. Debbie Harry, que nunca foi uma vocalista das mais poderosas, continua compensando o curto alcance de sua voz sendo versátil: aos 71 anos, ela vai segura da disco Fun a punk pop My Monster, passando pela country When I Gave Up on You. Mas o ponto alto de Pollinator é a faixa de encerramento, Fragments. Com quase 7 minutos, é uma DR épica, acelerada, com Debbie mandado uma real atrás da outra: Do you love me yet? Fucking prove it / Try to ask yourself / Are you really different? Em 2017, o Blondie continua sendo um corpo estranho. Ainda bem. Pop, BMG, 11 faixas, disponível para audição nos serviços de streaming.