Vocês já devem ter percebido que desenvolvi uma certa empatia pelos leitores que reclamavam de spoilers nos meus comentários sobre MasterChef profissionais. Não postamos a foto do eliminado nem cito seu nome nos títulos. Assim, cá estou eu, enchendo linguiça enquanto não falamos sobre o que aconteceu terça à noite, dando tempo para VOCÊ, AQUELE QUE AINDA NÃO ASSISTIU AO EPISÓDIO desta semana, parar de ler antes de deparar com a revelação de quem foi embora.
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"No 'MasterChef profissionais', torta de limão rima com eliminação"
"Quero que o João chegue à final do 'MasterChef profissionais'. E perca"
"No "MasterChef profissionais", o único ingrediente que vem faltando nos pratos não é sal, mas humildade"
O bom é que MasterChef profissionais vem sendo um programa eletrizante, ou seja: não dói nada adiar o papo sobre a eliminação; temos bastante assunto. A primeira temporada mostrou-se um acerto atrás do outro – desde a escolha dos participantes (cheios de personalidade, para o bem ou para o mal, e distintos em habilidades) até a dinâmica das provas (criativas e tensas).
O episódio desta terça-feira foi sensacional. Começou com uma batalha de cinco rounds – cinco! – entre duas equipes: Marcelo liderou a azul, com Fádia e João, e Ivo chefiou a vermelha, com Dário e Dayse. Um especialista no comércio e no preparo de carnes, István Wessel chamou alguns convidados para ajudar a avaliar o trabalho dos dois times. A missão inicial era destrinchar um cordeiro para separar quatro cortes: carré, picanha, pernil e tranche. Espantosamente, na equipe azul a tarefa, bastante braçal, sobrou para Fádia (e seu "bracinho raquítico", como definiu João), o que deve ter contribuído para o resultado – os vermelhos ganharam porque seus cortes estavam mais bonitos, apesar de não terem entregue o pernil; os azuis, por sua vez, apresentaram patinho como se fosse picanha. (Em tempo: evidentemente, eu só saberia diferenciar o que é carne e o que é osso.) O veredicto causou indignação de Marcelo, que foi deselegante com os jurados e levou um merecido pito.
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No segundo round, os trios tinham de preparar um prato com tranche. Como já é um saudável hábito do MasterChef, a edição nos levou a crer em derrota da equipe azul – um dos convidados disse que a churrasqueira estava muito quente, o que prejudicaria o ponto, e a Paola lamentou com Jacquin e Fogaça quando viu o molho de iogurte ser jogado em cima da carne, tapando aquela que deveria ser a estrela do prato. Mas os azuis empataram a disputa. E tomaram a frente no terceiro round, o do carré ao ponto, em que Fádia tomou bronca de Paola por estar usando o maçarico em cima das bocas do fogão ("É muito perigoso!") e em que o lado machista do Ivo apareceu de novo – ele queixou-se de trabalhar com mulher na cozinha ("Ela acaba sendo um pouco mais frágil") e disse a Dayse, que estava descontente com o jeito centralizador do pernambucano, que pegasse uma vassoura e fosse varrer o chão. Tsc, tsc.
O quarto round consistia em fazer um hambúrguer. Os dois times usaram bacon, o que Wessel desaprova, mas no vermelho o complemento mascarou menos o sabor do cordeiro: 2 a 2. O quinto e decisivo round pedia que os candidatos servissem um picadinho de cordeiro. Os azuis foram mais ousados, os vermelhos optaram pelo clássico ("Um clássico de faculdade", alfinetou Marcelo, referindo-se ao purê de mandioquinha com redução de vinho do porto), e talvez um erro cometido por João tenha custado caro – ele picou demais a carne. Wessel deu a vitória para Ivo e companhia.
A prova de eliminação foi emocionante. Não bastassem estarem cansados, não bastassem carregar o peso da derrota, Marcelo, Fádia e João ainda teriam que competir um contra os outros depois de terem atuado bem como equipe. O desafio era fusion cuisine: juntar as culinárias do Japão e da Itália. Difícil para qualquer chef, que dirá em uma competição na qual você está lutando por sua sobrevivência.
Marcelo, que estava com 20 milhões de ideias e 300 mil receitas fervilhando na sua cabeça e agitando seu corpo, soube ouvir o alerta de Paola ("Respira, Marcelo. Duas vezes"). Entendeu que precisava diminuir a complexidade, ainda que, mesmo assim, tenha feito mágica (Dayse comentou: "Com três panelas, o Marcelo faz milhares de coisas. Eu preciso de milhares de panelas para fazer três coisas!"). A recompensa veio em uma declaração arrepiante de Paola, finalizada com lágrimas tanto da chef argentina quanto do competidor paulista (e com o flagrante do queixo caído de Dário, no mezanino):
– Você tocou meu coração com a comida. Está muito bom porque quando você come você sente a trufa, o tarê, o peixe na textura certa, o creme de leite, é uma sinfonia perfeita. Não sei se você vai ganhar essa competição, mas você é um dos maiores talentos que esse país tem em gastronomia.
Fádia, que se perdeu todinha quando Jacquin pôs em xeque o plano dela de fazer yakisoba, acabou contando com a ajuda do mezanino: Dário apareceu como seu anjo da guarda ou amigo da onça – dependeria do destino da candidata.
– Você vai dormir com a consciência pesada hoje – Ivo cutucou Dário, que estimulou Fádia a preparar batuta (uma espécie de tartar italiano) sobre um tempurá (típico da cozinha japonesa).
Mas quem se deu mal foi o nosso querido João, o Insuportável. Ele achou que seu prato estava bonito, com um peixe, um pesto e uns tomatinhos a cumprirem o papel de cores da bandeira italiana. Eu achei que seu prato parecia insosso, sem vida. Fogaça disse que não se sentiu nem na Itália, nem no Japão.
– Parece um prato da França dos anos 1980 – ironizou.
Jacquin, mordido, chegou a elogiar o peixe do professor pernambucano, mas, no fim, disse que ele não executou o pedido; não fundiu Japão e Itália.
O adeus de João aos jurados foi tão sem sal e sem graça quanto seu prato, contrastando com o abraço comovido de Fádia e Dário. O melhor ainda estava por vir. Nos depoimentos, o professor deu sua aula de prepotência:
– As pessoas podem me achar autossuficiente, arrogante, mas quem me conhece sabe quem eu sou. Deus me conhece.
Eu sei o que ele quis dizer, mas, convenhamos, na boca dele, "Deus me conhece" soa como "Eu sou tão bom que até Deus me conhece".
A sobremesa foi servida no vestiário. Ana Paula Padrão pediu para João abrir seu coraçãozinho, dizer como estava se sentindo. O pernambucano reclamou da decisão de Wessel no quinto round da batalha do cordeiro, disse que a equipe dele deveria ter vencido por ser mais ousada. Ana Paula questionou se sabor também não era um critério importante, e João resolveu menosprezar a apresentadora do programa:
– Mas você é leiga.
Pra quê.
A réplica de Ana Paula foi como o serrote destrinchando o cordeiro:
– Eu sou leiga mas sou a ponta final da tua profissão. Se eu não gostar da comida, não adianta nada a técnica, o conhecimento.
Que chapuletada!
Dormi feliz.