Em tempos olímpicos, diante de matérias que celebram os casos de superação, tendo a ser solidário com os totalmente derrotados, com os que nunca conseguirão se redimir, com os que estão na quinta Olimpíada e seguem caindo sentados no salto decisivo, engolindo água, errando o último tiro que os levaria às finais. Porque os persistentes premiados redesenham os esforços de suas vidas. Se, aos 40 anos, contra a descrença geral, alguém petisca um bronze, se for brasileiro (mas creio que no mundo todo precisemos de histórias edificantes), terá um tempo sob os holofotes, falarão familiares, professores do colégio, primeiros empregadores. Comediantes morderão suas medalhas, dançarinas as envolverão em sensuais requebros, quiçá ladrões as cobiçarão. Aos que perdem de verdade, no entanto, restam tão-somente os encontros furtivos na vila olímpica (que hoje o Tinder dessacralizou), o folclore dos amigos, "bah, fulano tem um casaco da época em que competiu no Rio". Aos perdedores, impõe-se a volta à rotina dos homens e das mulheres comuns.
Na literatura, adoram citar os casos motivadores da autora do Harry Potter, do Paulo Coelho, que sem quaisquer incentivos, por puro mérito, conquistaram a fama e os milhões de dólares em direitos autorais. Pois esses são justamente nossos medalhistas. São os símbolos da luta (contra quem?). Queria ver a J. K. Rowling se tivesse seguido anônima, tendo de autografar na Feira do Livro ao lado do David Coimbra ou do Fabrício Carpinejar, com suas filas acachapantes, enquanto ela, abandonada. Será que haveria ainda alguma alma caridosa para fotografá-la com a caneta na mão, em um ângulo fechado o suficiente para dar a impressão nas redes sociais de que ali havia leitores?
Bem-aventurados os que caem nas eliminatórias, os que queimam as largadas, os que sucumbem nas quartas de final.
O que sentirão ao soar o hino? À imagem da bandeira? Sentirão menos ou mais frustração do que aqueles que, como eu, perdem em surdina?