Existem atrizes que marcam seu tempo. Sandra Dani é uma delas. Seja qual for o espetáculo que participe, é garantia de qualidade avassaladora. Tive o privilégio de contar com ela em obras teatrais marcantes. A mais emblemática foi Medeia.
Após ver Maria Callas no filme de Pasolini, sonhei com a própria. O rosto de Sandra foi se sobrepondo ao da grande diva. Minha Medeia era Dani. Acordei, liguei, contei meu sonho. Decidimos que era hora de encarar Eurípides. Depois, orgulhosos espanhóis de carteirinha, montamos Bodas de Sangue, como se estivéssemos na Andaluzia de Lorca. No futuro, nos espera a adaptação de Precisamos Falar sobre o Kevin.
Antes, amanhã, vamos estrear O Lugar Escuro, texto de Heloisa Seixas. O mal de Alzheimer e as relações por ele disseminadas, a impotência e a raiva ao lidar com essa situação terrível - pois o Alzheimer é uma doença impiedosa. Perda da memória, agressividade, culpa, despreparo, convivência familiar áspera. Abismo sem chão e sem identidade. Inferno gelado. O lugar escuro.
Vika Schabbach e Gabriela Poester, chamadas para completar o elenco, encararam Sandra de igual para igual e transformaram os ensaios em momentos eletrizantes. Sem Vika e Gabriela, não haveria o resultado teatral já testado no Recife, quando as três receberam ovação digna das grandes artistas que são. A diretora Cibele Forjaz, presente à estreia, não cansava de colocá-las no primeiro time das atrizes brasileiras.
Tema pesado, espetáculo redentor, pequena pérola dramatúrgica. Portadores da doença, levados por parentes ansiosos, revestiram aquelas apresentações com carga incomum de emoção. Alguns me pediram autógrafos no livro da autora, coisa que obviamente não fiz. Mas aproveitei para indicar a leitura de Sobre a Morte e o Morrer, de Elisabeth Kübler-Ross, que me auxiliou a entender os complexos desafios dessa morte viva.
É possível aceitar e conviver com o mal de Alzheimer? O Lugar Escuro, sem demagogias redutoras, aposta que sim.
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