Mick Jagger e Keith Richards já comprovaram que ao rock aplica-se a lei física dos opostos que se atraem. Mas, depois do que se viu com essa dupla em ação na noite histórica desta quarta em Porto Alegre, ficou claro que eles são, na verdade, dois fios desencapados soltando as faíscas que detonam a explosão de energia do som e da performance dos Stones.
Nesses mais de 50 anos de banda, os dois já passaram por algum bocado, sendo, por isso, os remanescentes de uma era do rock. Foram colegas de colégio e reencontraram-se na adolescência, já com a paixão em comum pelo rock, pelo blues e pela música negra norte-americana que os levou a criar os Rolling Stones em 1962. Juntos (e com os outros integrantes), Jagger e Richards percorreram o olimpo e os subterrâneos da fama, inventando praticamente sozinhos e sem nenhum tipo de alerta o estilo de vida sexo, drogas e rock'n'roll. É verdade que testaram limites, muitas vezes os ultrapassando.
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Ver Jagger e Richards tocando juntos ao vivo é testemunhar a parceria mais longeva do rock. Eles nos fazem lembrar que fizeram do gênero musical não só a trilha sonora de gerações, mas o mais potente veículo a catalisar a ânsia por revoluções no comportamento e nos costumes. Continuam, por isso, sendo símbolos de liberdade e hedonismo, e também de excessos e megalomania. Ajudaram a moldar a cultura pop como a conhecemos, mas alcançaram o estrelato mundial e fizeram fortuna enfrentando, nesse caminho, momentos de apuros, escândalos, tragédias e dramas pessoais. Se ficaram conhecidos nos anos 1960 como indecentes e provocadores, hoje, ambos aos 72 anos, mantêm um comportamento mais adequado à idade e a quem sobreviveu a tanta coisa.
Jagger e Richards já foram unha e carne, passaram temporadas afastados sem se falar por conta de brigas e, nos últimos anos, têm dado provas de que se entendem respeitando as diferenças. Em palco, fica claro que formam a dupla mais potente ainda em ação no rock. E que cada um deles entende muito bem o seu papel.
Richards já reconheceu muitas vezes que Jagger é o melhor frontman que uma banda poderia ter. Da maneira que dança e se movimenta no palco, ele criou um estilo próprio, que faz parecer imitação qualquer um que emule o mínimo trejeito. Jagger corre, pula, mexe os braços, contorce-se, não para um minuto. E, além de cantar, ainda nos lembra que é um grande gaitista de boca, como se viu na performance de Out of Control.
Já Richards fica na sustentação, como um maestro a comandar a massa sonora da banda. Parece o tempo todo um garoto faceiro, fazendo com sua guitarra o que parece ser a mais prazerosa das coisas da vida. Vê-lo tocando músicas como Satisfaction, Jumpin' Jack Flash e Brown Sugar é como um chamado à certeza de que ele inventou alguns dos mais marcantes e inesquecíveis riffs da história do rock.
Nos momentos em que Jagger e Richards se aproximam ou se entreolham, é como se alguma magia se estabelecesse, formando um núcleo de tensão e confronto de onde sai a potência dos Stones. Os dois já fizeram discos e projetos solo fora da banda, mas não deram muito certo em suas tentativas de separação. A verdade é que parecem funcionar apenas juntos.
E que é apenas e somente nos Stones que se encontram com suas reais identidades e conseguem extravasar o seu melhor – para sorte e privilégio dos que viram ao vivo e a cores esses imortais do rock.