O menino tem seis anos e fala durante todo o percurso entre as nossas casas (é meu vizinho) e a sua escola, que também fica na vizinhança do meu trabalho, o que lhe garante a carona diária. Todo dia, tem uma novidade para me contar. Hoje me assusta com uma pergunta:
- Quer saber como se faz uma bombinha?
Meu primeiro pensamento é dizer que não, não quero saber de bombas. Sou um pacifista radical. Será que esse piá andou espiando o que não deve na internet? Já ouvi dizer que tem receita até para bomba atômica. Porém, como também sou um homem de diálogo, dou corda para o moleque:
- Como se faz?
Seu engenho não poderia ser mais ingênuo:
- A gente pega um prendedor (ele fala "perendedor", mas logo se corrige), pega um clipe, um parafuso grande e amarra com uma cordinha. Aí é só soltar.
Não entendi muito bem a operação, mas ouço o resultado. A bombinha faz um "plac" quase inaudível no banco de trás, onde ele viaja no seu assento de elevação. Ele acha graça e faz um comentário adulto:
- Tô orgulhoso do meu invento.
Eu também, penso, aliviado. É tranquilizador constatar que uma criança é apenas uma criança e que não há limite para ela quando conjuga inocência e imaginação. Um prendedor de roupas pode ser um lançador de bomba _ felizmente uma bombinha de araque. Meia dúzia de riscos coloridos numa folha de papel podem representar pessoas, coleguinhas, parentes, casas, brinquedos, ainda que pareçam só rabiscos. Toquinho canta exemplarmente essa possibilidade: "Com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo".
Com seis anos, então, tudo é possível. Outro dia, fiz um barquinho de papel e deixei estrategicamente no console do carro, ao seu alcance. Ele levou o barquinho, possivelmente para uma viagem pelos mares da fantasia, e deixou no mesmo lugar um bichinho amarelo de plástico, com aparência estranha. No outro dia, me questionou:
- Brincou com o meu Pikachu?
Respondi que sim. Afinal, vem aí o Dia das Crianças e não convém desapontar o meu orgulhoso caronista.
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