Nunca fui correspondente de guerra, como o Luiz Antônio Araujo, nem estive envolvido em entreveros policiais complicados, como o Humberto Trezzi. Mas posso dizer que a cobertura do Rock in Rio para ZH, exatos 30 anos atrás, foi a mais pesada que fiz. E a mais inesquecível, por alguns motivos além do óbvio de presenciar o primeiro e o maior festival de rock já realizado no Brasil. Hospedado no discreto Hotel Canadá, em Copacabana, depois de parcas horas de sono (os shows terminavam de madrugada), eu redigia meus textos e rumava à tarde para as entrevistas coletivas com as atrações da noite em um hotel de Ipanema. Do mesmo hotel, mandava os textos para ZH e ia para a Cidade do Rock, em Jacarepaguá, tipo uma hora de ônibus.
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Tinha que ser de ônibus, pois de táxi custava muito mais e durava o mesmo tempo, devido à lentidão do trânsito. Cheguei por volta das 18h no primeiro dia, 11 de janeiro, a tempo de enviar um telex para a abertura da matéria em ZH, direto da sala de imprensa instalada em parte de uma estrutura de madeira que incluía camarotes para convidados, distante uns cem metros do gigantesco palco. Foi ali que entrevistei Roberto Medina, o idealizador do festival. No primeiro dia, os jornalistas se aventuraram em uma espécie de passarela exclusiva em frente ao palco. O som era tão ensurdecedor, que precisaram improvisar bolinhas de seus papéis de anotação, inserindo-as nos ouvidos para suportar o volume. E a multidão era impressionante.
O Rock in Rio durou 10 dias, ficou marcado pelos metaleiros e afirmou o nascente rock brasileiro dos anos 1980. Mais do que tudo, abriu o Brasil para os grandes shows internacionais. A visão daquelas noites de milhares de pessoas está impregnada em mim. Muitas vezes saí do abrigo dos camarotes para me misturar à massa e também não me esqueço da sensação de absorver Freddie Mercury e Queen, Nina Hagen, AC/DC, Rod Stewart, James Taylor e tal. Eram multidões felizes, mais de 1,3 milhão de ingressos vendidos. No dia 15 de janeiro, uma terça-feira, assisti pela TV, no Hotel Canadá, à vitória de Tancredo Neves no colégio eleitoral, encerrando quase 21 anos de ditadura. À noite, a Cidade do Rock estava verde-amarela. E aí...
Limpando a barra do rei
Tim Maia foi um cara complicado e Roberto Carlos é um senhor ainda mais. Mas a palavra que me vem para definir o "encontro" dos dois no especial da Globo Tim Maia - Vale o que Vier foi usada dias atrás por Luis Fernando Verissimo para definir o novo ministério de dona Dilma: esdrúxulo. Não dá para entender por que a Globo pegou a boa cinebiografia Tim Maia, de Mauro Lima, e a transformou em um canhestro documentário, enxertando depoimentos, em especial de Roberto. Sabe-se que eles eram desafetos e que Tim não perdoava o antigo parceiro dos Sputniks por, já famoso, tê-lo humilhado quando o procurou em busca de ajuda.
Além de ter suprimido a cena que mostra isso no filme, a "produção" da Globo foi nitidamente feita para limpar a barra de RC, que aparece no documentário dizendo o quanto admirava Tim e quão generoso foi com ele. Mas por que limpar a barra de RC? Talvez porque nos últimos tempos o "Rei" tenha aberto o flanco a críticas como nunca fez antes em 50 anos, algumas trazendo episódios reveladores de um caráter egoísta e que gosta de exercer o poder. Musicalmente, há pelo menos 20 anos RC não sai do lugar. Envelheceu em sua redoma, passa uma imagem plastificada e perde a oportunidade de mostrar ao público que lhe resta o que a vida lhe ensinou.
ANTENA - lançamentos
MARIANA DE MORAES
Desejo
Considerações românticas e realistas sobre o cotidiano de uma mulher tranquila, vestidas por melodias fluentes com acabamento instrumental convincente. É assim o terceiro álbum da ex-modelo paulista de voz aconchegante que, com ele, promete engrenar na carreira musical. O norte-americano Jesse Harris (de Norah Jones) e o brasileiro Adriano Cintra (Cansei de Ser Sexy) estão à frente da produção feita em Nova York e em São Paulo e que, entre os convidados, tem David Byrne e Mauro Refosco, do Red Hot Chili Peppers. As belas canções de Tiê e parceiros são ouvidas no nível de pop-rock internacional, como a que abre o disco em inglês, Gold Fish, e a que o fecha, parceria com Byrne, All Around You, clima beatle em inglês e português. Mas há uma certa MPB aqui e ali, e até tempero rítmico do leste europeu em Vou Atrás. Harmonizações vocais e um trio de cordas particularizam os arranjos. Warner, R$ 25.
ANGELA MARIA
Rainha do Rádio