A Entrevista, comédia estrelada por James Franco e Seth Rogen, tinha estreia prevista para o dia 25 de dezembro nos cinemas americanos. Tinha. A première, entre outras coisas que envolviam o filme, foi cancelada pela Sony, depois que um grupo de hackers ameaçou as salas de cinema de ter "um destino amargo" caso passassem o filme. "Lembrem-se de 11 de setembro", dizia o comunicado. Mas o que essas pessoas querem, quem são elas e o que uma simples comédia adolescente tem a ver com essa história?
O começo de tudo
Em algum momento no fim de novembro, computadores da Sony Pictures Entertainment foram invadidos. A Gawker conta que as telas de alguns funcionários tinham desenhos de caveiras e os computadores estavam totalmente desprotegidos, permitindo que outras pessoas fizessem o download de dados secretos. Isso permitiu que e-mails pessoais de funcionários vazassem. Neles, produtores da empresa chamavam Angelina Jolie de "pirralha mimada" e diziam que o comportamento de Leonardo DiCaprio era "desprezível". Além disso, dados pessoais, salários, históricos médicos e números das contas bancárias de funcionários da empresa também tornaram-se acessíveis.
Isso fez com que filmagens do estúdio fossem imediatamente canceladas - entre elas a do novo Homem-Aranha e 007. Versões prévias, ainda não finalizadas, de longas de Brad Pitt e Kevin Hart acabaram vazando na rede.
Ninguém sabe quem é o responsável
Quando acessaram seus computadores, os funcionários leram a mensagem "Hacked By #GOP" - posteriormente, o grupo de hackers foi identificado como Guardiões da Paz (Guardians of Peace, em inglês). O problema é que ninguém sabe quem eles são e de onde vêm. Mas suspeitas começaram a surgir quando o grupo exigiu que a estreia de A Entrevista fosse cancelada. O filme apresenta uma versão escrachada de Kim Jong-un - os personagens de Rogen e Franco, que são responsáveis por um programa de TV popular nos EUA, são convidados pelo ditador asiático para conhecer o país, mas são interpelados pela CIA, que pede a eles que matem o líder norte-coreano. As suspeitas viraram-se imediatamente para a Coreia do Norte.
Cena da morte de Kin Jong-un em A Entrevista, vazada nesta quinta-feira
"Mostraremos claramente que os locais de exibição de A Entrevista no dia da estreia terão um destino amargo... O mundo verá em breve que filme ruim fez a Sony Pictures. O mundo estará repleto de medo. Lembrem-se do 11 de setembro de 2001. Recomendamos que fiquem longe dos cinemas", dizia a nota. De acordo com a revista Vulture, o governo norte-americano passou a suspeitar que a Coreia do Norte estaria "centralmente envolvida". Para o dia 25, os ciberterroristas prometeram "um presentinho" - impossível saber do que se trata.
Sony cancela tudo
Depois das ameaças, a Sony anunciou que todos os eventos promocionais envolvendo o filme estavam cancelados - e apoiou cinemas que se recusassem a passar o filme em suas salas. Na quarta-feira, em entrevista ao canal de TV ABC, o presidente Barack Obama disse que o "ataque cibernético é muito sério" e garantiu que os Estados Unidos "estão investigando e levando isso muito a sério". O departamento de segurança americano, porém, garantiu que não havia "indicativos de uma ação contra salas de cinema nos Estados Unidos"
Mas como isso foi possível?
Há algumas formas de invadir um sistema protegido. Porém, as duas mais comuns incluem alguém com informações internas que compactua com o crime ou brechas de segurança, explica o cientista da computação Cauane Silva. Na primeira opção, algum funcionário da Sony poderia ter ajudado os criminosos a entrarem no sistema da empresa.
- A grande sacada destes hackers é criar uma rede de computadores "zumbi", que são controlados remotamente por eles. Quando querem atacar um peixe grande, a Sony, por exemplo, eles ativam o exército de computadores zumbi e, assim, atacam os servidores. Para a Sony, o ataque foi feito pelo Joãozinho, mas tinha um cara controlando o PC do Joãozinho - explica Cauane.
É possível que essas pessoas sejam pegas?
Na opinião de Leonardo Zanatta, advogado especialista em direito digital, é muito difícil:
- Beira o impossível. É provável que tenha sido um ataque massivo, de força bruta. A partir de um longo processo de rastreamento, é possível chegar a 50 endereços usados para a invasão. O problema é que podem ter sido usados wi-fis livres, lan houses, a internet do MC Donald's, qualquer coisa. Não dá para identificar o responsável, a não ser que isso tenha sido feito no conforto do lar, sem qualquer procedimento de segurança - explica.
Em alguns países, como os Estados Unidos, há a tipificação do crime de ciberterrorismo. No Brasil, não - esse crime seria enquadrado como estelionato ou ameaça, explica o advogado.