É interessante espelhar Therese Desqueyroux em duas outras fortes personagens femininas à frente de dramas de época em cartaz nos cinemas: Anna Karenina, no filme homônimo, e Caroline Mathilde, de O Amante da Rainha. As três aproximam-se por simbolizarem mulheres vítimas das amarras sociais de suas respectivas épocas, que as colocam diante de desejos reprimidos e trajetórias à sombra de casamentos infelizes.
Mas, diferentemente das apaixonadas Anna e Caroline, que assumiram os riscos para dar uma guinada em suas vidas, a protagonista do filme francês Therese D. é o retrato da frieza carnal e emocional. Therese, personagem apresentada em 1927 no romance Therese Desqueyroux, de François Mauriac, no filme interpretada por Audrey Tautou, é uma jovem que cresce e vive numa região rural da França dos anos 1920.
Ela se casa com Bernard (Gilles Lellouche), irmão de sua melhor amiga, Anne (Anais Demoustier), movida mais pelo pragmatismo de ser a união conveniente para os negócios de sua próspera família e para sua própria ambição. Audrey faz de Therese uma personagem interessante na sua ambiguidade. Ao mesmo tempo em que parece conformada com seu papel secundário ao lado do marido autoritário, ela mostra-se incomodada com a paixão proibida que Anne consuma com um rapaz português que costuma velejar nas proximidades - uma imagem que repete-se no filme como um símbolo da liberdade idealizada, mas nunca plenamente perseguida por Therese e Anne.
A inquietação da protagonista se manifesta na aversão física a Bernard, na negligência afetiva à filha e numa atitude tresloucada que provoca sua ruína familiar e social, trajetória que o diretor Claude Miller, que morreu em 2012, pouco antes do lançamento do filme, encena de forma uma tanto exasperante.
Se Miller é preciso na reconstituição do ambiente - os pinheirais que cercam os personagens podem ser vistos como grades que tanto os preservam do mundo exterior quanto impedem que dali saiam -, o excessivo formalismo de uma narrativa arrastada faz de Therese D. uma obra tão apática e desidratada de emoção quanto sua protagonista.