Um “chá de bar” viabilizou a casa de show mais referencial de Porto Alegre. Era 1983 quando os amigos Alemão (Alexandre Lopes) e Magrão (Cláudio Fávero) tiveram a ideia de abrir o próprio bar. O desejo dos dois estudantes de engenharia da PUCRS era beber e reunir os amigos. Coisas de universitário. Só que o orçamento era estreito. Como conseguiriam bebidas para os clientes?
Dois dias antes da inauguração do estabelecimento, então, eles cozinharam um carreteiro. Cada um dos amigos (ou futuros clientes) levou alguma bebida — como uísque ou vodca. Feito o “chá de bar”, foi inaugurado o Bar Opinião no dia 18 de outubro de 1983, que, ao longo de 40 anos, virou palco de muita história na capital gaúcha.
A casa recebeu praticamente todos os principais artistas locais que surgiram desde então. Grandes atrações nacionais passaram por ali primeiro — vide Jota Quest, Skank e Planet Hemp — quando conheceram a cidade. É um palco internacional também: subiram naquele tablado nomes do porte de Bob Dylan, Mercedes Sosa e Morrissey.
Na noite de inauguração em outubro, o Opinião se localizava na Rua Joaquim Nabuco, 469. Era um estabelecimento com sete mesas e cozinha. A estreia contou com apresentações de Antonio Villeroy e Maria Rita Stumpf. Havia muita euforia no ar, convidados e cerveja gelada a rodo, como lembra Villeroy:
— Tivemos que mudar o rumo do show, transformando a festa em uma grande celebração musical, com sambas e marchinhas de Carnaval.
A ocasião também foi marcante para Maria Rita Stumpf, pois era um de seus últimos shows na capital gaúcha antes de se mudar para o Rio de Janeiro.
— Lembro de um rapaz do público que levantou, parou na minha frente e disse: “Por favor, podes não cantar enquanto vou ao banheiro? Não quero perder nem um segundo desse show”. Até onde me lembro, paramos e esperamos... — recorda a cantora.
O bar era palco de artistas da Música Popular Gaúcha (MPG) nos primeiros anos, como Bebeto Alves, Gelson Oliveira, Nelson Coelho de Castro, Zé Caradípia, entre outros. Como a estrutura era menor, o local recebia shows no formato voz e violão. Apesar de incipiente, a casa já cumpria um papel importante:
— O Opinião chegou para engrossar o caldo cultural da cidade e se tornar um dos palcos mais importantes para os artistas que estavam surgindo — pontua Villeroy.
Em 1987, o bar se transferiu para a José do Patrocínio, 834, na mesma vizinhança da Cidade Baixa. Foi neste endereço que o Opinião se firmou como casa de espetáculos, com as posteriores compras de terrenos vizinhos e reformas internas ao longo dos anos. Hoje o espaço comporta 1,7 mil pessoas.
Magrão sublinha que o bar sempre se renova a cada ano. Mas não só na estrutura: o conteúdo que sobe ao palco também. A agenda de shows da casa se fortaleceria a partir de 1992, quando foi criada a Opinião Produtora.
— É preciso sempre estar atento às tendências ou descobrir coisas legais que futuramente possam estourar — expõe Magrão, que hoje é um dos seis sócios-diretores da Opinião Produtora. — Quando você traz isso de coisas novas que estão rolando, muitas vezes põe cem ou 200 pessoas, sequer paga a passagem, mas precisa trazer esses conteúdos que não são rentáveis. O importante no final do ano é que a história esteja azul.
Esse olhar para novas atrações ajuda a refrescar o público do Opinião, como frisa Magrão. Ele cita como exemplo o show do trapper Teto, realizado na sexta passada (13), que encheu a casa com jovens. Quem observar a agenda do bar, irá deparar com artistas de rap, rock, metal, pop, MPB, pagode etc.
Magrão recorda que o Opinião teve uma fase mais roqueira, ganhando uma alcunha de “templo do rock” ou então de “Bambonera do rock” durante algum tempo. O sócio-diretor admite que a casa teve algumas rejeições a alguns estilos em certos momentos, as quais se arrepende.
— Em relação ao pagode, que era uma coisa muito legal, mas a gente era mais purista com uma veia mais rock and roll, então não rolava. Hoje uma das melhores festas que nós temos é a Pagode 90’s. Talvez não tenha dado oportunidade a coisas legais daquela época. Mas a gente vai envelhecendo e vai aprendendo — reflete.
Por outro lado, embora seja um dos ritmos mais executados nas rádios e plataformas digitais do país, o sertanejo ainda não adentrou o Opinião. Magrão nega restrições e ressalta que os produtores entendem que a casa não tem uma história nesse nicho. Também destaca que o estilo privilegia o uso de camarotes, algo que a casa não dispõe. O DNA é de bar, mesmo.
Além do tradicional bar, a Opinião Produtora hoje administra outros espaços — Auditório Araújo Vianna, Pepsi On Stage e Teatro de Câmara Túlio Piva. Para o espaço onde tudo começou, não há mais o que mexer em relação ao local, como salienta Magrão. Ele observa que a casa está justa em seu propósito, com palco e mezanino bem posicionados.
Para marcar os 40 anos, serão instalados painéis com artistas que já se apresentaram no Opinião. Essas imagens foram criadas por meio de inteligência artificial, em um projeto produzido por Tiago Faccio, CEO da Woodoo Oficina Web. Também integrando as comemorações estará o show Beto Bruno Convida Grandes Estrelas do Rock Gaúcho, previsto para ser realizado no dia 26, a partir das 22h.
Sobre longevidade, Magrão opina que o bar precisa propiciar o melhor naquilo que se propõe, mas essencialmente no básico.
— Tem que ter uma boa luz, um bom som, a batata frita, a cerveja gelada, banheiro limpo toda hora, atendimento legal. Vai escalonando na pirâmide até atingir o diferencial que nos mantém até hoje, que é o conteúdo. A entrega que tu põe no palco — explica.
Jornalista e colunista de GZH, Juarez Fonseca pondera que poucos palcos chegam aos 40 anos. Ele realça que dezenas de casas noturnas foram abertas e fechadas nesse tempo na cidade. O próprio Opinião enfrentou dificuldades — sejam crises financeiras ou a própria pandemia que obrigou a paralisação das atividades.
— Só o tempo de existência, 40 anos, já é suficiente para se entender a importância do Bar Opinião para Porto Alegre — diz Juarez. — Um dos “segredos” dessa longevidade é a diversidade e a administração democrática.