"Eu tenho algo a dizer e explicar pra você, mas não garanto, porém, que engraçado eu serei dessa vez", já dizia o início da letra de Voz Ativa, um dos clássicos do grupo Racionais MC's escrito por Edi Rock, Ice Blue e Mano Brown. A música, lançada em 1992, faz parte do álbum Escolha o seu Caminho e procura incentivar a confiança e o potencial das pessoas negras.
Quase 30 anos depois, Brown ainda tem algo a dizer, mas, também, quer escutar, discutir e refletir. Por isso, nesta quinta-feira (26), chega ao Spotify o podcast Mano a Mano, original da plataforma, no qual o rapper encara uma nova experiência: a de ser entrevistador. E, na atração, o papo promete ser reto.
Em coletiva de imprensa, da qual GZH participou, Brown fez questão de salientar que a ideia de sua estreia na podosfera é apresentar diversidade de pensamentos, construir pontes e se aprofundar em histórias de pessoas que, concordando ou não com os seus posicionamentos, são relevantes para a sociedade.
Um dos casos é o vereador paulista Fernando Holiday, que, por defender pautas de direita, avessas ao pensamento de Brown, gerou estranheza na internet ao ser anunciado como convidado do Mano a Mano. Porém, o rapper destacou que, mesmo que não concorde com as ideias do político, ele é uma figura que precisa ser ouvida.
— Esse era um cara que ninguém queria ouvir, daí me interessei. Ele é uma inteligência negra, mesmo que eu discorde de suas ideias. Não é deixando de falar com ele que ele vai deixar de existir — explicou Brown, reforçando o caminho pelo qual quer seguir com o seu programa e a importância de aprender a conviver com quem pensa diferente.
Liberdade
Durante a coletiva de imprensa, Brown mostrou que, ao ser entrevistado, não tem a mesma agilidade para as respostas como em seus versos musicais. Ele, nitidamente, gosta de estar no controle da situação e, talvez por isso, no seu podcast, com ele no comando, tendo total liberdade e com um microfone a sua frente, a sua desenvoltura seja outra, mais solto.
Ao responder as perguntas, a questão da liberdade, por sinal, foi muito abordada pelo rapper. Tanto é que ele afirmou que, na escolha de Karol Conká para participar do programa, a produção não lhe deu apoio, mas ele bateu o pé, decidido a levar a rapper e ex-BBB para a atração, por acreditar que também seria rejeitado em um programa como o reality show.
— Existem temas em que não tem como se acovardar, que temos que nos posicionar. Mas, também, estamos sempre em transformação. Por isso, há momentos em que temos que deixar a pessoa falar. Não é preciso sempre se posicionar, ainda mais se for só para reafirmar o óbvio. Não estou fechado para ideias novas — explicou Brown.
Com uma equipe formada por uma maioria negra, o Mano a Mano, para o líder dos Racionais, não terá espaço para hipocrisia, apesar de avisar que é um ser humano e, por isso, "passível de erro". E, ainda batendo na tecla da liberdade, o rapper quer que os ouvintes absorvam apenas o que quiserem do seu podcast, sem direcionamentos. O que Brown pretende é que, no final dos 16 episódios da primeira temporada de seu programa, ele tenha sido relevante.
— Se eu conseguir, da minha maneira, ser útil, vou estar satisfeito. Quero que faça diferença para o público jovem e, por isso, não posso trazer as soluções dos anos 1990, que para mim foram importantes, para essa nova geração. Eles querem ir mais longe do que a gente pretendia ir — reflete.
Feito apenas em formato de áudio, Mano a Mano foge dos atuais modelos de podcasts, em que as entrevistas são gravadas em vídeo e disponibilizadas em ambos os formatos. E Brown defende a decisão:
— A palavra ganha mais força quando só tem o áudio. Não há distrações e, até na respiração do cara, é possível perceber se tem honestidade no que ele está falando. Esse é o diamante do negócio.
A estreia de Mano a Mano será com Karol Conká e, já confirmados, estão, além de Holiday, o médico Drauzio Varella, o pastor Henrique Vieira e o técnico de futebol Vanderlei Luxemburgo. Os episódios semanais do programa serão disponibilizados gratuitamente sempre nas quintas-feiras.