Geoff Emerick é direto quando questionado sobre o conteúdo da master class que dará de sexta a domingo em Porto Alegre:
– Não faço a mínima ideia do que vai rolar.
Engenheiro de som dos Beatles, o britânico de 72 anos é responsável por inovações sonoras dos álbuns Revolver (1966), Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band (1967), The Beatles (1968) e Abbey Road (1969). Explica que pretende levar para o estúdio Audio Porto (Rua Câncio Gomes, 609), que sediará as aulas, o clima criativo das gravações dos discos do quarteto de Liverpool:
– Não faço planos. Quando entro em um estúdio, não tenho ideia de como vou começar ou terminar. Costumo atuar sob um ponto de vista mais artístico do que técnico. Não digo como é preciso gravar uma coisa ou outra, mas por qual motivo algo pode funcionar melhor com um instrumento ou outro, em uma tonalidade ou outra.
Nesta quinta-feira, às 20h, o engenheiro de som, que também trabalhou com Elvis Costello, Badfinger e Supertramp, explica seu processo de trabalho, conta bastidores de gravação e conversa com o público em uma palestra, também no estúdio Audio Porto.
Como na master class, Emerick não costuma seguir um roteiro nessas ocasiões. Mas deve narrar peripécias que realizou com Paul McCartney, John Lennon, George Harrison e Ringo Starr. Ele lembra que Paul era mais profissional e objetivo, enquanto John falava por meio de metáforas. Para a faixa Tomorrow Never Knows (de Revolver), por exemplo, John queria que sua voz soasse "como o Dalai Lama pregando do alto de uma montanha". Emerick precisou desmontar um órgão Hammond e retirar seu alto-falante giratório Leslie, que servia como modulador do instrumento. Ao projetar a voz do beatle na caixa, conseguiu uma sonoridade intensa, mas distante e entrecortada.
– Naquela época, não existiam plug-ins, softwares de edição ou coisa parecida. Você precisava inventar as coisas. E nós queríamos criar algo novo. Não queríamos mais aquele som morno que todo mundo já havia alcançado. Havia um padrão como a EMI gravava seus discos, um modo de posicionar microfones e tudo mais, que estava sendo reproduzido há 10 anos. Os Beatles chegaram me provocando a conseguir algo a mais do que isso. Foi assim que começou uma postura mais criativa dos engenheiros de som – diz Emerick.
Vivendo atualmente nos EUA, Emerick se mostra pouco contente com o mainstream musical atual:
– Vivo em Los Angeles, onde o negócio da música é mais negócio do que música. É claro que há grandes músicos na cidade, além daqueles que vão até lá para gravar. O problema é que há muita confiança na tecnologia para ajudar os artistas. Por exemplo, usam aplicativos para afinar a voz, coisa que não gosto de usar. Quando o Grammy premia o melhor vocalista, está premiando um cantor ou um software? Para mim, isso soa engraçado, estranho.
Leia entrevista com Geoff Emerick
O senhor tem realizado palestras e workshops para a América Latina. Como começou essa interação?
Nossa conexão começou há três ou quatro anos, quando meu empresário foi ao Grammy Latino. O pessoal é legal, e a música é demais. Atualmente, vivo em Los Angeles, onde os estúdios usam muita tecnologia, como plug-ins e softwares para afinar músicos e cantores. Fiquei muito impressionado com os artistas latinos, que tocam e cantam de verdade.
Sua primeira vinda ao Brasil foi em abril, para uma palestra no Rio de Janeiro. Antes disso, conhecia música brasileira?
Ouvi algo no passado, quando a Capitol Records começou a contratar muitos músicos brasileiros. Então, estive em algumas gravações com alguns deles, especialmente baixistas e percussionistas. Foi a única conexão que tive. Não lembro o nome de ninguém.
O senhor também levou sua master class para a Argentina, em abril. Lá, chegou a tocar com Charly Garcia. Como foi isso?
Foi uma surpresa. Eu não poderia imaginar. Já sabia quem era Charly, tinha um enorme respeito por seu trabalho. É um músico com um enorme passado, e a quem é preciso estar atento ainda hoje. Nossa conexão foi magnífica. Nós até pensamos em gravar um álbum juntos. Ainda não tenho certeza, mas estou pensando a respeito.
Apesar das críticas ao uso excessivo da tecnologia digital na indústria da música, há algo do mainstream que o senhor gosta de ouvir?
Não. Só coisas com as quais eu trabalho. Lidando com isso por tantos anos, as pessoas me perguntam: "O que você gosta de ouvir quando está em casa?". A resposta é: "Nada". Se você ouviu música por 56 anos, trabalhou em estúdio a maior parte de sua vida, não tem como voltar para casa e ouvir mais música. Você tem que dar uma escapada disso.
Geoff Emerick em Porto Alegre
Palestra
Nesta quinta-feira, às 20h.
Estúdio Audio Porto ( Rua Câncio Gomes, 609), em Porto Alegre.
Abertura da casa: 18h. Show com Pedro Verissimo e grupo Marmota: 19h.
Ingresso: a R$ 200 (2º lote), à venda em bit.ly/GeoffTS.
Master class
De sexta-feira a domingo, das 10h às 18h.
Estúdio Audio Porto.
Inscrição: R$ 1.750 no link bit.ly/GeoffMC.