Em cartaz desde 1º de junho, o Mirage Circus já recebeu quase 100 mil espectadores nesta temporada em Porto Alegre. O espetáculo celebra a tradição do circo tradicional, mas investindo em recursos inovadores e um profundo trabalho de pesquisa para entregar o conteúdo mais adequado para cada lugar por onde passa.
O empreendedor cultural e ator Marcos Frota é o nome por trás de uma equipe que chega a 200 pessoas, para dar conta de tamanha estrutura. Quem passa ao lado do estádio Beira-Rio, na Avenida Padre Cacique, se depara com uma cidade, como ele define. São escritórios, restaurantes, oficinas, carretas, trailers, moradias, casas de máquinas e contêineres que fazem do Mirage Circus uma grande referência no Brasil quando o assunto é arte circense.
A simbiose com o público gaúcho teve na solidariedade um dos pontos mais altos. Diante das dificuldades encontradas por diversas regiões em função do ciclone extratropical de junho, o circo promoveu uma sessão extra com a finalidade exclusiva de arrecadar doações.
– A adesão foi impressionante. Logo nas primeiras horas do dia o público já fazia fila na porta do circo para reservar ingressos, trocando por alimentos, agasalhos e produtos de higiene – lembra Frota.
Com estacionamento próprio, ar-condicionado e um telão de LED que confere um elemento a mais ao espetáculo, o circo recebe o público com conforto e atenção em cada detalhe. Tanto que Frota costuma brincar que o banheiro é a principal atração, prova irrefutável do cuidado com as pessoas, que se sentem à vontade para levar toda a família.
– Um fenômeno que está acontecendo em Porto Alegre é as pessoas não irem embora quando a sessão termina. Ficam ali, admirando, como se estivessem em um grande parque temático. E nosso tema é a alegria. Nós propomos, fundamentalmente, a alegria – conta o ator.
Em entrevista, ele fala sobre a descoberta da paixão pela arte circense, o esmero do trabalho de toda a equipe do Mirage Circus e a expectativa com o período de férias escolares nas próximas semanas. Confira:
Como surgiu o encantamento com o circo?
Outro dia, uma pessoa que me acompanha com essas questões circenses há muitos anos, mas não é da área, falou que eu vim para o circo para servir. Isso foi bacana porque o artista é um pouco vaidoso, trabalha com a questão do ego. Eu entrei para servir quando pedi para a Globo fazer uma novela com esse tema, que foi Cambalacho, em 1986.
Minha intenção era usar a imensa audiência daquela época para tirar o circo da condição de uma arte decadente, em final de ciclo. Ter uma novela bem humorada, no horário das 19h, com grande elenco, falando de circo, deveria contribuir para que surgisse uma nova geração de produtores, professores, artistas e empresários. O começo foi com esse espírito, com o qual me mantenho até agora – e a consagração é o Mirage, que consegue uma gestão de excelência, uma produção de ponta e um olhar respeitoso do público.
Todo mundo sabe que, hoje, está em Porto Alegre a maior referência do circo brasileiro. Digo isso sem arrogância nenhuma, pois é fruto do trabalho de uma equipe que dá tudo. O Jefferson [Souza, diretor geral do circo] trabalha de forma humilde, impondo esse estado de espírito para a equipe, sem acomodação. E vamos querer cada vez mais.
É importante ter um comando, que olha para a questão como um todo. Sabemos o lugar que ocupamos hoje e sabemos que foi por trabalho, estratégia, gestão, planejamento, um orçamento executado com coragem, sabendo o que a gente quer, que é realizar um circo brasileiro, com B maiúsculo, com padrão e nível internacional.
Esse encantamento que você teve em 1986 é o mesmo que cativa o público até hoje?
Meu estado de espírito é esse e encontrei na nossa equipe esse comprometimento. Ninguém pensa pequeno. Estamos pensando grande realmente, para valer. É um investimento de alma, trabalho, disciplina, tempo, para oferecer esse estado de alegria para o público.
O circo é um elemento diferencial, não só na formação do caráter, da leitura lúdica das nossas crianças, mas de colocar uma esperança. O mundo está muito complicado e o circo tem que ter esse compromisso de propagar a alegria, grande combustível da esperança. Espero que o Mirage Circus não perca isso. Quem olha o dia a dia do circo vê o Jefferson misturado com a nossa equipe toda. Não tem outra atitude que não sermos também servidores deste projeto, em pensamento e atitude.
Como está sendo essa passagem por Porto Alegre?
A presença do circo em Porto Alegre foi marcada por duas ações diferentes. Primeiro o reconhecimento por parte da crítica. Pela primeira vez o circo brasileiro recebe um olhar crítico sobre o que o espetáculo fala, qual o lugar dele. Nosso espetáculo celebra a tradição do circo. Um circo que a gente chama de tradicional, mas com muita tecnologia, inovação e proposta de pesquisa.
Temos compromisso com a qualidade, mas também com a pesquisa. Tanto é que em Goiânia o espetáculo foi de um jeito, em Florianópolis, de outro, e chegamos em Porto Alegre com esse compromisso de conquistar mesmo. A gente sabe que é uma cidade difícil de ser conquistada, voltada para a parte acadêmica, intelectual, acostumada a grandes eventos e o circo tinha que ter esse carisma de conquistar.
Outro momento marcante foi quando nossa equipe toda definiu uma campanha social: abrir um espetáculo, uma sessão extra, para que a gente arrecadasse contribuições contando com a solidariedade do público gaúcho.
Muitos gaúchos vêm de outras cidades para assistir ao espetáculo. O que você acha disso?
Eu vejo, em primeiro lugar, como a força da comunicação do projeto que o Sócrates [Silva, diretor de marketing] comanda. Tem que colocar as antenas altas, já que não é possível fazer uma turnê pelo Estado para se encontrar com o público. Por isso nós convidamos para vir, curtir a gastronomia e o lado turístico, e ainda ver o circo brasileiro.
Recebemos pessoas de Pelotas, Santa Maria, Bagé, São Gabriel, Caxias do Sul – toda essa região da Serra, muitos amigos meus de Gramado, onde sempre vou para o Festival de Cinema. Todo mundo ligado. Por isso a casa está sempre lotada: é toda a Região Metropolitana e mais o interior que estão tendo a oportunidade de conhecer de perto esse trabalho.
O período de férias é mais uma oportunidade para o público gaúcho ir ao Mirage Circus?
Estamos esperançosos, porque o público é impressionante, as bilheterias estão esgotadas. É como ver um grande show: compra com antecedência, se programa e vai curtir um circo que está tomando conta do coração e da emoção do povo gaúcho.
Recentemente dei uma entrevista à Rádio Gaúcha e repercutiu muito, mas as pessoas vão ao circo e percebem que é ainda mais do que eu falei. Isso dá um conforto porque você pode falar com ênfase, um certo didatismo até, mas com segurança porque não está iludindo ninguém, nem aumentando nada. Não é uma verborragia sem sentido, sem propósito. O que tenho dito é o que eu sinto e procuro compartilhar com o público.
Com 50 anos de carreira, olho para o Mirage e me sinto plenamente realizado, feliz por participar de uma equipe que acredita no circo como instrumento de lazer, cultura e congraçamento. Um circo que vive seu presente, que graças a Deus é muito bom, mas que olha para o futuro também, porque não para de se preparar para oferecer muito, mas muito mais ainda.