Com mais de 250 salas de cinema confirmadas em todo o Brasil, Chama a Bebel será a maior estreia em questão de circuito da carreira do gaúcho Paulo Nascimento como diretor. E este é um motivo de comemoração para o cineasta de 59 anos. O outro é ver que a obra, que começou a nascer ao observar o comportamento pró-meio ambiente de sua filha, Alice Nascimento, quando adolescente, já está em cartaz nos cinemas para ser apreciada pelo Brasil inteiro.
A trama do longa acompanha a jornada de Bebel (Giulia Benite, a protagonista de Turma da Mônica: Laços e Lições), uma brilhante menina que precisa se mudar do interior para a cidade grande para continuar os seus estudos no Ensino Médio. A jovem, que é cadeirante, no novo ambiente, terá que enfrentar desde colegas de escola maldosos até empresários poderosos que fazem testes de cosméticos em animais para defender suas causas ambientais — sendo a ativista sueca Greta Thunberg a sua grande referência.
Com 90 minutos de duração, o filme dedica-se quase que inteiramente a bater na pauta da importância da mudança de hábitos para a preservação do planeta Terra — destacando que os pequenos gestos também são fundamentais para reverter as mudanças climáticas e criar um mundo mais sustentável. Desta forma, a jovem Bebel é intrépida e inabalável na luta e angaria aliados nesta jornada, ao mesmo tempo em que vai fazendo inimigos.
Entretenimento para as férias
Além de diretor, Nascimento também é roteirista da obra e explica que, para ele, era importante colocar a sua personagem vivenciando o choque de realidades que uma pessoa tem ao trocar uma cidade pequena por uma metrópole. E, para dar esta dimensão, o cineasta gravou o filme na beira de uma estrada em Guaíba, em uma região que dá a impressão de ser remota, e o restante foi feito em Porto Alegre.
O elenco, que é de diversas partes do Brasil, tendo nomes do Rio de Janeiro, de São Paulo, da Bahia e, claro, do Rio Grande do Sul, entre outros locais, reuniu-se para as 15 diárias realizadas na Região Metropolitana no começo de 2023 — menos de um ano depois, a produção está chegando aos cinemas.
E vem para ser uma opção para as férias da criançada, uma vez que Nascimento destaca que o público na faixa dos 10 anos é o que mais está se conectando com a história, após exibições prévias — incluindo, na Alemanha.
— Acredito que os jovens dessa faixa etária, dos 10 aos 15 anos, a Bebel tem 14, atualmente, são muito mais compromissados do que a gente era quando tinha essa idade. E venho observando muitas "Bebéis" que fazem parte dessa turma que te xinga se tu joga um chiclete pela janela — explica o diretor.
Pontos delicados
Colocar Greta Thunberg como heroína de Bebel no longa-metragem, desde o começo do roteiro, já era sabido por parte de Nascimento que iria gerar polêmica, uma vez que a ativista não é bem aceita por todos os grupos políticos do Brasil — o ex-presidente Jair Bolsonaro, inclusive, disparou xingamentos contra a sueca, chamando-a de "pirralha" em um dos seus discursos. O cineasta, porém, ponderou que mencionar a jovem no filme teria mais a acrescentar do que os possíveis haters que receberia.
— A questão da Greta, a gente sabia que não ia ter saída. Fazer um filme que agrade ao Brasil inteiro é impossível. E, sobre isso, inclusive, teve uma escola particular de Porto Alegre que nos negou de filmar por causa disso. O diretor da escola nos liberou, mas, depois, o conselho não aceitou quando soube que era um filme baseado em uma menina que era admiradora da Greta — recorda Nascimento, destacando que o revés foi positivo, pois as locações mudaram para a escola estadual Senador Ernesto Dornelles, no Centro Histórico, que foi muito elogiada pela produção.
Outra questão que pode gerar debate é a escalação de Giulia Benite para viver uma cadeirante, uma vez que a atriz não é uma pessoa com deficiência (PCD). Hoje em dia, o público mais progressista vem batendo na tecla sobre a importância de escalar artistas deficientes para viverem personagens com as mesmas características, abrindo espaço para estes talentos aparecerem e aumentando a diversidade nas telas.
Segundo Nascimento, esta questão foi levantada antes do começo das filmagens do longa-metragem, mas o cineasta afirma que está tranquilo com a decisão final, visto que a sua produtora, a Accorde Filmes, tem um grande envolvimento com a questão da acessibilidade há quase 15 anos.
Dentro deste processo, eles escalam atores — PCD's ou não — para papéis variados. De acordo com ele, o professor de Bebel, Dênis, vivido por Rafa Muller, que é PCD, não precisava ser cadeirante, mas chamaram o ator pelo talento do mesmo — e, com isso, em várias cenas, há duas cadeiras de roda em quadro.
— A decisão foi colocar uma atriz que trouxesse atenção para o filme mostrando que a protagonista, a Bebel, consegue fazer tudo que outra pessoa faria, mesmo a personagem sendo cadeirante. A ideia foi, realmente, trazer o tema pra frente. E, assim, tirando os haters da internet, a reação do público está sendo 90% favorável, com as pessoas entendendo que isso é atuação — detalha o diretor e roteirista, afirmando que o tema é o meio ambiente e a heroína ser PCD é tão natural quanto se ela caminhasse.
Inclusive, logo nos primeiros segundos de projeção do filme, Bebel deixa isso bem claro em um monólogo:
— Se eu andasse, continuaria sendo a mesma pessoa. Duvidam? Eu tenho as minhas dificuldades, mas aposto que eu faço o que qualquer um de vocês faria. Eu sou independente.