O cinema drive-in nasceu muito antes deste repórter. Quando estreou em Porto Alegre, na década de 1970, meu pai tinha quase a minha idade. Cheguei ao mundo em 1991, e minhas memórias afetivas em relação à cultura se direcionam a Spice Girls, Sandy e Junior e filmes da Sessão da Tarde. Um deles, inclusive, traduz muito a sensação que é conferir uma sessão no formato Os Flintstones em Viva Rock Vegas.
Parece ironia do destino, mas esse foi o primeiro filme que assisti no cinema com meus pais, no mesmo dia em que completava nove anos. Nesta quinta-feira (11), o carro do jornal me buscou em casa para me levar a uma sessão do cinema drive-in: deparamos com a fila de cerca de 15 veículos para adentrar o Estacionamento da ADVB-RS (Avenida Edvaldo Pereira Paiva, 1.505) por volta das 18h30min, meia hora antes da exibição. Mesmo com lugar marcado, é bom chegar um pouco antes.
Naqueles segundos na entrada, eu ouvia mentalmente a trilha sonora que iniciava os episódios de Os Flintstones – quem cresceu na década de 1990 vai lembrar que, na abertura do desenho, de William Hanna e Joseph Barbera, Fred junta Wilma, as crianças e os vizinhos Barney e Betty Rubble para irem a um drive-in.
Sentado no banco do carona, quando mal estacionamos, já fiz questão de sintonizar na frequência de rádio FM que os telões anunciavam – nele, o áudio de Meia-Noite em Paris, filme que iniciaria às 19h, poderia ser escutado sem a necessidade de abrir a janela.
Antes da exibição começar, a programação tocava clássicos do blues, como Barry White, com Can’t Get Enough of Your Love, Babe; ou então Gladys Knight e The Pips, com Midnight Train to Georgia. Ou seja, uma trilha ambiente muito semelhante a qualquer sala de exibição. Entre uma faixa e outra, a gravação informava que, em caso de qualquer problema, era apenas necessário acionar o pisca-alerta.
Com tudo preparado, fomos ao filme. Meia-Noite em Paris, de Woody Allen, para quem não lembra, é aquela história em que Gil Pender (Owen Wilson) vive um jovem escritor em busca da fama e curte as férias na capital francesa com sua noiva Inez (Rachel McAdams). Enquanto está ansioso com seus escritos, em andanças pelas ruas, acaba tendo encontros noturnos inusitados com ninguém menos que Ernest Hemingway e Pablo Picasso. Os agitos com a reencarnação dessas personalidades lhe trazem questionamentos sobre a vida, o amor e o futuro.
Viagem no tempo
O longa de Allen venceu o Oscar de Melhor Roteiro Original em 2012 e nos remete aos encantos de Paris. Com o som no carro impecável, saindo por quatro alto-falantes (um em cada porta), me sentia dentro do filme.
Se fosse apenas pelo som, tudo estaria perfeito. Quando decidi pedir uma pipoca (o cheirinho ao redor do carro estava gritando por um balde), veio a espera. Foram exatos 30 minutos entre o momento em que o pedido foi confirmado, feito pelo WhatsApp (em número que foi divulgado no telão, antes do filme começar), e a entrega no carro. O pagamento foi pelo cartão de débito, e a atendente estava com equipamentos de proteção individual. A pipoca média, que estava fria, mais um refrigerante em lata saíram por R$ 14. Em qualquer bomboniére de shopping, o valor seria duas vezes maior.
Havia quatro banheiros químicos disponíveis, sem fila. O evento recomendou, diversas vezes, que os espectadores fossem ao toalete antes mesmo de sairem de casa – e o pedido foi atendido, pelo visto. Entrei tranquilamente e, quando mal deixei o banheiro, já veio um funcionário realizar a limpeza completa com álcool gel no engate da porta, nos cantos do vaso e na piazinha.
O telão em alta qualidade permitia a visão completa de todos os carros, mas é importante lembrar: a experiência é mais garantida para o motorista e o carona. Ao arriscar levar alguém junto, apenas uma terceira pessoa pode ser bem-vinda, para ficar no banco do meio, atrás. Ou seja, os ocupantes da parte traseira não podem nem sonhar em ter uma sessão pipoca decente. Drive-in é para um casal, dois amigos ou no máximo uma família com uma criança pequena. Mais que isso, é torcicolo garantido na manhã seguinte para as pessoas extras.
O staff organizou bem a saída dos carros na hora de ir embora. Como qualquer grande evento, foi necessário um pouco de paciência: os veículos foram liberados por filas, garantindo fluidez. O portão por onde todo mundo entrou também se tornou local de saída, sendo uma opção extra. Ponto para a organização.
Ao final, a experiência é diversa: para uns, pode ser positiva por relembrar momentos que ficaram no passado; para outros, por vivenciar uma situação até então desconhecida. Mas há uma certeza: está longe de substituir qualquer sala de exibição. Na falta delas, eu, particularmente, prefiro maratonar séries ou assistir a um filme no sofá de casa, com uma cobertinha e um chocolate quente.