O Ministério Público Federal no Rio de Janeiro (MPF-RJ) entrou com uma ação civil contra o ministro da Cidadania, Osmar Terra, por improbidade administrativa. A ação contesta a portaria 1.576, editada por Terra, que suspendeu, “pelo prazo de 180 dias, prorrogável por igual período”, um edital para seleção de projetos audiovisuais que seriam veiculados nas TVs públicas.
Segundo o MPF, a portaria foi motivada por discriminação contra projetos com temática LGBT+. O órgão especifica que os documentários Sexo Reverso, Transversais, Afronte e Religare Queer, que integram a lista de projetos selecionados, foram desmerecidos pelo presidente da República em vídeo publicado no dia 15 de agosto de 2019.
O inquérito civil aponta que a suspensão do concurso causou dano ao patrimônio público federal no valor de quase R$ 1,8 milhão (R$ 1.786.067,44), referente aos gastos já realizados até o momento.
O MPF pede que a portaria seja anulada e o concurso, concluído. Além de querer a condenação de Osmar Terra conforme a Lei de Improbidade Administrativa, a ação solicita:
- Ressarcimento integral dos valores dispendidos com a realização do concurso – R$ 1,8 milhão;
- Perda da função pública exercida;
- Suspensão dos direitos políticos por oito anos;
- Pagamento de multa civil em valor equivalente a duas vezes o valor do dano causado;
- Proibição de contratar com o Poder Público Federal ou dele receber benefícios, incentivos fiscais ou creditícios, pelo prazo de cinco anos.
Procurada pela reportagem de GaúchaZH, a assessoria do ministro Osmar Terra informou que o "edital suspenso não foi discutido por este governo". "Por se tratar de recursos públicos - R$ 70 milhões - que financiariam séries para serem exibidas em TVs públicas, este governo resolveu suspender com a intenção de analisar os critérios de sua formulação. O próprio edital previa a possibilidade de suspensão ou anulação", acrescentou, em nota oficial.
O que o inquérito apurou
O processo aberto pelo MPF no início do mês passado procurou esclarecer todas as etapas do edital de seleção de produções audiovisuais. O concurso iniciou em março de 2018 e, em agosto de 2019, quando houve a alteração da portaria, já estava em fase final.
Ao todo, 801 propostas foram inscritas, sendo que 613 delas passaram por análise. No final, foram cinco projetos restantes em cada um dos 14 blocos temáticos, em um total de 289 produções contempladas.
O inquérito apurou que, logo no dia seguinte às manifestações negativas de Jair Bolsonaro, o ministro Osmar Terra determinou a elaboração de pareceres sobre a minuta da portaria, a fim de suspender o edital. A justificativa era de que a medida era necessária para recompor membros do Comitê Gestor do Fundo Setorial do Audiovisual.
O ex-secretário Especial da Cultura, José Henrique Pires, foi ouvido pelos procuradores no dia 26 de setembro e alegou que recebeu um pedido "com urgência" de Terra para a realização de uma análise e uma manifestação sobre a portaria. Segundo Pires, a minuta não se encontrava devidamente justificada e se tratava, em seu entender, de “mais uma tentativa de chancelar o que o presidente havia dito, isto é, não veicular conteúdos que não lhe agradem”.
— O Ministro, em declarações posteriores, disse que não tinha a obrigação de seguir o que um funcionário do governo anterior havia falado, mas isso não é verdade, pois o concurso em andamento era o resultado de um conjunto de deliberações feitas pelo Conselho Nacional de Cinema e pelo comitê gestor do FSA — afirmou, ao MPF.
Logo em seguida, Pires pediu demissão do cargo.