Bingo - O Rei das Manhãs é o primeiro longa metragem dirigido por Daniel Rezende, paulistano de 42 anos que está longe de ser um iniciante no cinema. Começou sua carreira alcançando uma histórica indicação ao Oscar de melhor montagem por seu trabalho em Cidade de Deus, de Fernando Meirelles. Editou também Diários de Motocicleta (2004), de Walter Salles, Tropa de Elite 1 e 2 (2007 – 2010), de José Padilha – é parceiro recorrente desses diretores – e está na equipe de editores de A Árvore da Vida (2011), do americano Terrence Malick. O curta Blackout (2008), premiado no Festival de Gramado, foi seu primeiro filme como diretor. Rezende, em entrevista por telefone a ZH, disse que esperou até 2017 para apresentar seu primeiro longa porque esperava pelo projeto certo.
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Veja um resumo da conversa.
Em 2008, você apresentou no Festival de Gramado seu primeiro filme como diretor, o curta Blackout, que foi bastante elogiado e ganhou o prêmio de melhor ator (para Augusto Madeira, que está no elenco de Bingo). Na ocasião, fizemos uma reportagem em ZH apontando para uma promissora carreira na direção que foi se concretizar com o primeiro longa só agora em 2017. Por que a demora?
Sua pergunta meio que já responde. Tenho uma carreira consolidada na montagem, que amo fazer e nunca pensei em deixar de fazer. Eu estava procurando o projeto certo para fazer da maneira que gostaria: um filme com qualidade dramatúrgica, qualidade da produção, uma boa história, com um bom personagem e que pudesse ter apelo para com o público. Ficamos muitos anos trabalhando no roteiro (de Luiz Bolognesi) porque eu não estava com pressa. Sempre fui muito criterioso. Queria fazer um filme que gostasse de assistir.
Quando se deu seu contato com a história do Arlindo Barreto?
Participei do projeto desde o início. Li uma reportagem sobre a vida do Arlindo e achei que sairia um filme dali. Encontrei o Luiz Bolognesi e começamos a trabalhar juntos. O que me interessou no Arlindo foi a história do personagem que está buscando seu lugar sob os holofotes, que vem de uma vida artística com uma mãe que é atriz, mas quando encontra reconhecimento é por trás de uma máscara. É um personagem que apresenta um programa infantil com crianças e, ao mesmo tempo, vai se distanciando do filho.
Você assistia ao programa do Bozo?
Fui uma criança nos anos 1980 que era fissurada por televisão. E sempre fui curioso sobre o que tinha nos bastidores de novelas, programas de entrevistas, como aquilo era feito, adorava ver making of. E ver a vida de Arlindo é também poder olhar para a nossa cultura pop do anos 1980.
A trilha do filme é muito boa, vai de Echo & Bunnymen e Devo a Gretchen, Tokyo e Titãs, passando por Dr. Silvana & Cia. Você mesmo escolheu as músicas?
Sim, e foram escolhidas no processo de confecção do roteiro. São canções que definem o "mood" (humor) do personagem. Do Echo & Bunnymen (presente com Bring on the Dancing Horses, que toca duas vezes na trama), por exemplo, era outra música que eu queria colocar.
The Killing Moon?
Óbvios (risos). Escrevi uma cena para usar ela, mas decidi mudar. O que é legal no filme é que é música é como um personagem que te leva aos anos 80.
Por que razão o Arlindo virou Augusto?
A gente tinha com preocupação fazer o filme com 100% de liberdade criativa, do registro de época à vida real. Arlindo serviu de inspiração e foi generoso em entender que a gente queria criar nosso próprio personagem. Bingo é inspirado na vida do Arlindo mas é o Augusto, que é um palhaço muito comum no Brasil. Nossos anos 1980 é atemporal, nunca identificamos o ano exato.
E por que a Gretchen é a Gretchen?
Porque sou um fã brutal de Conga, Conga, Conga (risos). A Grethen foi muito generosa. E Emanuele (Araújo) incorpora ela maneira "gênia".
Você é um dos mais renomados montadores do mundo, mas não edita seu próprio filme, trabalho feito pelo Marcio Hashimoto. Por quê?
Sempre foi bem pensado que nos meus trabalhos de diretor eu não seria o montador. Como montador, gosto de trazer uma outra visão do filme para o diretor, de contribuir nesse processo. Não queria perder essa relação, agora no sentido inverso. O Marcio é um grande montador, já trabalhei com ele em outros projetos.