Aclamada com o Kikito de melhor atriz no Festival de Gramado por sua impressionantemente realista interpretação da cantora Elis Regina ( 1945 – 1982 ), Andréia Horta fez questão de incluir uma parada adicional na sua passagem por Porto Alegre nesta terça-feira, dia dedicado à promoção da cinebiografia Elis, que estreia nos cinemas no dia 24 de novembro: o apartamento no térreo do número 21 da Rua Rio Pardo, na Vila Iapi, onde Elis morou antes de se mudar para o Rio de Janeiro.
– Perguntei no caminho se a gente tinha conseguido autorização para entrar, e disseram que não tinham pensado nisso. Então falei: "Vou entrar de qualquer maneira" (risos). A porta estava aberta, tinha um moço pintando o apartamento. Foi arrebatador, porque os espaços guardam as energias, assim como nosso corpo. Conheci uma amiga de infância da Elis e ficamos conversando. Foi lindo – disse Andreia na entrevista coletiva realizada após a sessão do filme para a imprensa, no cinema GNC do shopping Praia de Belas.
A atriz veio à Capital acompanhada pelo diretor do longa, Hugo Prata, do colega de elenco Júlio Andrade, que vive o coreógrafo norte-americano Lennie Dale, e do produtor Fábio Zabala. Sobre o seu envolvimento no projeto, Andréia destacou:
– A primeira música que escutei na voz da Elis e me marcou foi No dia em que eu vim embora, que me deu muita força por ser bem o que eu estava sentindo quando deixei Juiz de Fora (MG) para estudar Artes Cênicas em São Paulo. Aí eu comecei a escutar muito a Elis. Quando li sobre a vida dela, vi muitas semelhanças com a minha história pessoal e familiar. Fiquei fascinada pela maneira como a Elis conduziu sua vida e foi abrindo seu caminho. Foi fiel às suas posições, tinha um temperamento reluzente, honesto, que vai reto para a frente. Anos atrás, quando li uma reportagem sobre o projeto do filme, quis fazer parte dele, mas não conhecia ninguém envolvido. Por um acaso do destino, um amigo me fez cruzar na rua com a roteirista (Patrícia Andrade) que, à época, estava trabalhando com o Hugo e me apresentou a ele.
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Andréia se preparou ao longo de três intensos meses para viver Elis Regina, tanto para reproduzir particularidades físicas quanto para dar veracidade às interpretações de grandes clássicos da MPB imortalizados pela cantora. Apesar de a voz no filme ser de registros de Elis, Andréia cantou de verdade para alcançar a intensidade dramática característica da artista, empenho que a fez ficar sem voz em algumas diárias das filmagens. O excelente resultado tem impressionado público e crítica.
Estreia de Hugo Prata no cinema, Elis faz um recorte cronológico da trajetória da cantora porto-alegrense, da sua chegada ao Rio de Janeiro, em abril de 1964, até sua morte, em janeiro de 1982, aos 36 anos, em decorrência de uma overdose de cocaína combinada com álcool. A trama destaca momentos emblemáticos da carreira de Elis, como a temporada no Beco das Garrafas, templo da boemia carioca – onde conheceu figuras como Miele (Lúcio Mauro Filho), Lennie Dale e Ronaldo Bôscoli (Gustavo Machado) –, a consagração com a canção Arrastão no Festival da TV Excelsior de 1965, a consolidação como maior cantora do Brasil, o turbulento casamento com Bôscoli, a parceria afetiva e musical com César Camargo Mariano (Caco Ciocler), o antológico espetáculo Falso brilhante, em 1975, e as reinvenções que promoveu em sua carreira na busca por maior autonomia artística.
Também tem destaque em Elis os problemas que a artista enfrentou no Brasil sob a ditadura, primeiro com as críticas que fez aos militares, chamados por ela de gorilas em uma entrevista na França, e depois atraindo a antipatia de parte da esquerda por aceitar cantar em um evento militar – no filme, após ter sido coagida em razão da declaração anterior e da amizade com artistas considerados subversivos.
– Infelizmente, o filme é muito atual (nessa abordagem política). Seria lindo a gente dizer que está lidando com uma realidade de anos atrás, mas ela está muito atual. A censura está infiltrada nas cabeças – destacou Andréia.