Livro de formação curricular na Escola de Magia de Hogwarts, Animais fantásticos e onde habitam foi escrito 70 anos antes de Harry Potter começar seu aprendizado no mundo bruxo. No universo ficcional da escritora J. K. Rowling, a publicação tem como autor Newt Scamander, ex-aluno de Hogwarts, integrante da casa Lufa-Lufa, expulso da escola em razão de seu interesse por criaturas mágicas – a vocação do rapaz tímido e brilhante para a chamada ciência magizoologia foi avaliada como potencialmente perigosa pela direção da escola.
Um personagem com esse potencial não poderia ser ignorado pela bilionária franquia que apresentou oito filmes entre 2001 e 2011. A diferença é que Animais fantásticos e onde habitam, em cartaz nos cinemas a partir desta quinta-feira, não teve o enredo previamente testado e aprovado pelos fãs em livro. O roteiro do filme é original, escrito pela própria J. K. Rowling, que havia lançado em 2001 a publicação homônima como um catálogo ilustrado pela bizarra fauna estudada e colecionada por Scamander em suas viagens pelo mundo. É, portanto, um reencontro aberto ao impacto de muitas surpresas.
"Animais fantásticos e onde habitam" expande universo "Harry Potter"
Como foi a pré-estreia de "Animais fantásticos e onde habitam" em Porto Alegre
Junto à autora, também está nos créditos da nova produção David Yates, diretor que assinou os quatro últimos longas da série Harry Potter. Como protagonista, foi escalado um ótimo ator, Eddie Redmayne, ganhador do Oscar com A teoria de tudo e novamente indicado com A garota dinamarquesa. A reunião desses bons ingredientes, combinada à expectativa dos fãs diante desse novo arco de histórias e ao apetite da indústria cinematográfica por mais uma franquia bem-sucedida nas bilheterias – esta deverá ter cinco títulos –, resulta em um programa muito eficiente como entretenimento e negócio. Não se tem aqui um produto com a aparência e o gosto de pratos requentado, impressão recorrente em iniciativas similares para fisgar público com o apelo afetivo.
Em vez do Reino Unido, o cenário de Animais fantásticos e onde habitam é a Nova York dos anos 1920, onde Scamander desembarca carregando na mala seu peculiar zoológico de fabulosas criaturas – de monstrinhos fofinhos a gigantes alados –, que estão sendo catalogadas para o livro que mais adiante lhe dará grande fama em Hogwarts. Quando algumas delas escapam e começam a causar problemas na cidade, o viajante se lança na complicada missão de capturá-las. Terá como ajudantes amigos que conhece em meio à caçada: Jacob Kowalski (Dan Fogler), um humano operário com que deseja abrir uma confeitaria, e as irmãs Porpentina (Katherine Waterston) e Queenie (Alison Sudol) Goldstein. A primeira é funcionária do Congresso Mágico dos Estados Unidos, versão local do Ministério da Magia. A outra tem a habilidade de ler pensamentos.
Os bichos exóticos de Scamander, porém, não são nada perto da ameaça que representam o bruxo das trevas Gellert Grindelwald (Johnny Depp em rápida participação) e o espectro maligno raro e mortal que ronda Nova York. Essa agitação toda coloca em polvorosa o Congresso Mágico, entidade zelosa na convivência pacífica com "trouxas" humanos (nos EUA chamados de "no-majs", os sem magia), que destaca seu mais talentoso bruxo, Percival Graves (Colin Farrell), para impedir que o mal triunfe.
Animais fantásticos e onde habitam tem como trunfo preservar em sua estrutura narrativa o equilíbrio de aventura, suspense e humor consagrados na franquia Harry Potter . A dinâmica da interação entre os protagonistas adultos também é muito parecida com a que amarrava a relação dos jovens bruxos de Hogwarts. A conexão de Scamander com Alvo Dubledore, diretor de Hogwarts, lança para os próximos filmes a possibilidade de uma aproximação mais afinada entre as duas sagas de J.K, Rowling.
Dois elementos, entretanto, parecem um tanto fora de sincronia com o universo lúdico dos filmes anteriores. O primeiro diz respeito aos efeitos visuais. Ao mesmo tempo em que tornam impressionantemente críveis os animais esquisitos de Scamander, a tecnologia se mostra excessiva nas reiteradas sequências de destruição de Nova York. O segundo está representando pelo ritmo mais frenético da ação. É como se a ruidosa e acelerada pirotecnia fosse a contrapartida exigida pelo novo cenário, onde é comum o espetáculo explícito se sobrepor ao poder de sugestão da fantasia. Mas são detalhes que a força do conjunto, sobretudo aos pottermaníacos, tende a tornar irrelevantes.