Passados quase um ano e três meses de pandemia, o Rio Grande do Sul ultrapassou, nesta sexta-feira (7), a marca de 1 milhão de casos oficialmente confirmados de infecções por coronavírus, segundo dados da Secretaria Estadual da Saúde (SES).
As estatísticas apontam 1.003.065 casos e 25.807 mortes (o equivalente à população de Guaporé). Do total de casos, 961.336 estão curados – o que significa que mais de 40 mil pessoas estão com o vírus ativo e podem passá-lo adiante a familiares, amigos e colegas de trabalho.
Se fossem ignorados os diversos casos de reinfecção já documentados, o coronavírus teria entrado em contato com menos de 10% da população gaúcha – o Rio Grande do Sul tem cerca de 11,4 milhões de habitantes.
Com base na realidade atual da pandemia, com grande número de vítimas, não há mais espaço, afirmam médicos e cientistas, para a tese de imunidade coletiva causada pela doença, ventilada no início do ano passado, quando o coronavírus ainda era desconhecido. A estratégia foi adotada pela Suécia e pelo Reino Unido e posteriormente abandonada.
Após semanas de bandeira preta, o Rio Grande do Sul testemunhou forte redução no número de casos: nesta sexta-feira, a média móvel de novas infecções era de 4.032 novos casos por dia – quase metade do pico da terceira onda, em março.
Lidamos com a primeira onda muito depois de outros Estados, o que deu tempo para adaptar a rede e abrir novos leitos. Lidamos bem com a segunda onda, em dezembro. Mas a terceira onda foi sem precedentes
JERUZA NEYELOFF
Médica epidemiologista do Hospital de Clínicas
Mas a queda parou, e a pandemia parece ter estabilizado em cerca de 4 mil novas infecções diárias – 16% abaixo do ápice da segunda onda, em dezembro, e quase 45% mais alta do que o pior momento da primeira onda, no inverno passado.
— Lidamos com a primeira onda muito depois de outros Estados, o que deu tempo para adaptar a rede e abrir novos leitos. Lidamos bem com a segunda onda, em dezembro. Mas a terceira onda foi sem precedentes. Tivemos duas semanas dobrando o número de pacientes, mas demoramos para atuar. Entre duas a três semanas depois das maiores restrições, começamos a ver estabilização da curva, mas, se tivéssemos imposto restrições antes, a curva teria se estabilizado em patamares inferiores e teríamos salvado mais vidas. Esse mesmo desafio pode se apresentar para o futuro — afirma Jeruza Neyeloff, médica epidemiologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).
Comparado a outros Estados, o Rio Grande do Sul está, oficialmente, na 13ª posição em número acumulado de casos por 100 mil habitantes. O médico Ronaldo Hallal, membro do Comitê Covid-19 da Sociedade Sul-Riograndense de Infectologia (SRGI), destaca que o Estado mantém uma alta "taxa de positividade".
Ou seja, de todos os testes PCR feitos, uma média de 40% dão positivo, enquanto que a orientação internacional para o retorno às atividades, diz o infectologista, é de que fique abaixo de 5%.
Provavelmente temos um número bem maior de casos do que 1 milhão. A cobertura de testagem sempre foi baixa, o que é demonstrado pela alta taxa de positividade. A política de prevenção é frágil e há estímulo para circulação praticamente normal de pessoas
RONALDO HALLAL
Médico, membro do Comitê Covid-19 da SRGI
— Provavelmente temos um número bem maior de casos do que 1 milhão. A cobertura de testagem sempre foi baixa, o que é demonstrado pela alta taxa de positividade. A política de prevenção é frágil e há estímulo para circulação praticamente normal de pessoas. Isso pode impor nova aceleração da pandemia ao longo das próximas semanas, ainda mais com a chegada do inverno. Mas, de outro lado, há elementos que podem impedir uma aceleração maior: a vacinação de parte dos grupos de risco e a recente exposição de parcela da população à P.1, o que pode conferir imunidade por algumas semanas — diz Hallal.
O gerente de Atenção à Saúde do Hospital Universitário da Universidade Federal de Rio Grande (Furg), Fábio Lopes, destaca que a melhora na pandemia não é uma constante em todo o Estado: na Região Sul, onde atua, a pressão hospitalar ainda é grande.
— Vemos um número de pacientes ativos elevado e muitos pacientes jovens. A média de idade de hospitalização caiu bastante, também. Do hospital para dentro, vemos que estamos longe do patamar ideal. Diminuiu um pouco o número de pacientes fora de hospital, em UPAs, mas aqui no hospital a lotação é máxima e estável — afirma Lopes.