Comecei a entender melhor depois do segundo tombo - escorreguei no limo à beira dágua, caí de costas sobre as pedras e olhei para cima. Era como se aquele amontoado de árvores tentasse me levantar, solidário, me convidando para entrar logo no Poço da Caranha.
Trata- se de uma piscina natural a 12 quilômetros da foz do Rio Tijuípe, limite entre Uruçuca e Itacaré, no sul da Bahia. Um espelho dágua claro e morno. E cercado por pequenas cachoeirinhas - são elas que se encarregam de dar sequência à correnteza do Tijuípe, para frente e para trás.
Recebe esse nome, Poço da Caranha, porque pescadores relatam histórias tenebrosas de um peixe violento que aparecia por lá. A caranha costuma ter cabeça grande e dentes afiados, atingindo um metro e meio de comprimento, mas aquela caranha do poço, a lenda fala em três metros. Ou mais.
- Depende do tamanho do braço do pescador - explicou um dos nossos guias, Felipe Marahu.
Não que o bicho fosse assassino, a história conta que ele só arrancava braços e pernas, o que também é meio chato. Donde o meu receio, estirado de costas à beira do poço, em aceitar o convite das árvores.
À frente delas, aliás, surgiam as três cabeças das jornalistas de São Paulo que me acompanhavam na viagem. Riam do meu tombo - embora tivessem rido mais de outro que sofri meia hora antes.
Foi bem feio.
Vínhamos de caiaque pelo Tijuípe - só assim para chegar ao Poço da Caranha - e, como nunca fui um exímio remador - na verdade, nunca havia remado na vida -, cometi uma barbeiragem espetacular quando avancei o caiaque sobre a vegetação costeira e enfiei a testa num galho pontudo. Daí a canoa virou. O que é especialmente desagradável para quem, como eu, não sabe nadar.
Nota-se que minha intimidade com rios, pedras, vegetação e limo era muito menos profunda que aquele corte latejando na minha testa. Mas as coisas começavam a mudar. A tal " integração do homem com a natureza", principal propósito da viagem, impunha- se à minha frente com a cena que relatei no primeiro parágrafo (dê uma lidinha de novo).
Ao levantar- me das pedras à beira do Poço da Caranha, ao finalmente mergulhar na piscina natural (no rasinho, claro), enfim aceitei o amparo daquele espelho dágua rodeado de arvoredo e cachoeiras - tudo bem que essa conversa parece de uma pieguice atroz, mas vale ressaltar que, enquanto eu resistia à natureza, ela até meteu um galho na minha cara.
Subimos um morro íngreme para almoçar numa fazenda de coco e, enquanto me dava conta da exuberante paisagem que surgia, o garçom anunciou num prato de barro a primeira recompensa da viagem que recém começava.
- Caranha à milanesa - gritou ele.
O repórter viajou a convite do Txai Resorts