A apropriação de um espaço público (areia) para uso privado (barracas de praia) se tornou tema de discussão no Litoral Norte. A polêmica em torno das estruturas que protegem do sol - e do nordestão - encorpou na semana passada, quando a prefeitura de Xangri-lá liberou cada quiosque a instalar 30 estruturas na orla aos finais de semana e no feriadão de Carnaval antes mesmo que os "inquilinos" chegassem. O Batalhão Ambiental da Brigada Militar desaprovou, e o Ministério Público Federal (MPF) rejeitou a licença.
O texto do Executivo explica que a autorização pretendia "sanar um problema detectado durante a temporada para montagem das barracas devido à falta de mão de obra durante o verão e o grande fluxo de pessoas ao mesmo tempo junto à orla marítima". Suspenso pelo MPF, o ofício contrariava declaração da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) que proíbe a instalação de barreiras que impeçam o acesso público à praia e a livre circulação.
- Estão delimitando um espaço público, bem comum de todos, para uso privado. Não se pode demarcar uma área. Assim que um usuário chegar, se monta a barraca onde ele quiser - explica o sargento Edson dos Santos, do 1º Batalhão Ambiental de Xangri-lá.
Conforme a orientação da Fepam, nenhum comerciante pode delimitar uma área sem que o veranista esteja no local - ou seja, não se pode a reservar a sombra ao cliente antes que ele coloque os pés na areia. Com base no texto, em reunião na sexta-feira entre prefeitura, Batalhão Ambiental e MPF, ficou acordada a restrição.
- Foi um mal entendido. O município não pode autorizar que se armem as barracas antes de as pessoas chegarem. Foi um equívoco, já está tudo resolvido - abranda o prefeito de Xangri-lá, Cilon Rodrigues da Silveira.
Batalhão ambiental recolheu estruturas
Na costa de Xangri-lá - desde o limite com Capão da Canoa, até Rainha do Mar - 14 quiosques, vencedores de licitação municipal, estão autorizados a alugar os itens. Apesar de alegarem prejuízos com a proibição, os "barraqueiros" ouvidos por ZH garantem que respeitam a determinação. Mas há quem desobedeça: no final de janeiro, oito barracas de um comerciante foram recolhidas pelo Batalhão Ambiental por estarem desocupadas e invadirem a faixa delimitada aos salva-vidas.
- Nós só queremos trabalhar sossegados. Só pedimos a liberdade para colocar as barracas nos sábados e domingos. Os clientes chegam todos ao mesmo tempo, e é uma correria - aponta José Barros da Silva, 62 anos, que aluga as tendas há 39 anos junto à plataforma de Atlântida.
A defesa dos proprietários dos quiosques é que, instalando as barracas entre 8h30min e 9h, a beira-mar fica organizada. E, segundo eles, não há bloqueio na passagem de banhistas. A instalação das estruturas ocorre aos fundos da faixa de areia - sempre atrás a "linha" da guarita dos salva-vidas.
- Acusam que demarcamos espaço na praia. Mas aquilo ali não demarca? - questiona o comerciante Manoel Lopes Alves 49 anos, apontando o indicador para uma estrutura com toldo, mesas e cadeiras em frente a um restaurante.
ZH tentou contato com o procurador da República que participou da reunião sobre a discussão, Cláudio Terre do Amaral, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.
Aluguel mensal é quase um salário mínimo
Fenômeno litorâneo gaúcho, as estruturas armadas na orla - com tecido do topo até a areia de um lado para proteger do vento, e dois suportes de alumínio do outro - não são novidade da temporada 2015. Tradicionais nas areias de Xangri-lá e Capão da Canoa, as barracas têm aluguéis mensais ao custo de quase um salário mínimo nacional (R$ 788).
O custo, que varia entre R$ 624 e R$ 777 (conforme o ponto), não afasta banhistas - ao contrário. Pela comodidade de garantir um resguardo do sol e não ter de carregar gazebos e cadeiras à beira-mar, há famílias que alugam as estruturas durante todo o veraneio por décadas. Exemplos como o da empresária Eloana Tusi Mann, 52 anos, que há 30 é cliente do mesmo "barraqueiro" em Atlântida.
- Sempre foi assim e sempre deu certo. Por que complicar uma coisa que está funcionando? Nunca vi nenhum veranista brigando por causa do lugar das barracas. Não é delimitação de espaço, mas organização da praia. Se for armada uma linha de barracas, há lugar para todo mundo - opina.
- Se não atrapalhar o público, não tem problema. O ideal é que já esteja montada, facilita a localização - engrossa o coro a aposentada Elisabeth Lopes, 62, que há seis recorre às tendas próximas à plataforma de Atlântida.
Guarda-sol pode ser opção mais econômica
Concorridas, as barracas nem sempre estão disponíveis a quem quer usá-las por apenas um dia. Alguns quiosques trabalham somente com o aluguel mensal, mas outros dispõem das tendas para empréstimo diário, por R$ 50. Quem fica de fora tem de recorrer a um guarda-sol. Apesar de proporcionar uma menos sombra, o alento é a economia: o aluguel de um sai, em média, R$ 15 em Xangri-lá.