A previsão de nova cheia não tirou o foco de Rosângela Riet, 61 anos, e Sérgio dos Santos, 71. Moradores da Ilha da Pintada, os dois aproveitavam o tempo seco da última terça-feira (18) para prosseguir com o trabalho de desenterrar e separar seus pertences, que se misturaram a entulho e lama no quintal do casal, localizado na Avenida Presidente Vargas.
A força-tarefa tem acontecido passinho por passinho. Como a água demorou a baixar na região, Rosângela só conseguiu acessar a residência há cerca de duas semanas. Quando chegou, levou um susto.
— Quando eu tentei abrir a casa, o sofá tinha trancado a porta. Já tive que quebrar ele para conseguir entrar. No quarto de hóspedes, não dava para entrar. A beliche, as coisas todas se desmancharam, parece que deu um redemoinho dentro de casa. Parece que martelaram e quebraram tudo — recorda a idosa.
A sorte do casal foi ter construído uma casa mais elevada do que a anterior em que moravam, que fica na parte de trás do mesmo terreno. Lá, as próprias paredes cederam, e só sobraram destroços.
— A minha guria ia morar ali, daí deu a enchente de setembro e encheu de água. Depois teve a de novembro e, agora, desmanchou tudo — lamenta Rosângela.
Depois que acessou a casa, a dupla passou a se dedicar à retirada do entulho e à faxina dos cômodos. Agora, está em uma nova fase: desenterrar o que dá o lamaçal que se instalou no pátio e separar o que vai dar para aproveitar. Sobre um pedaço de madeira, os dois equilibravam louça de cozinha e outros objetos de vidro e plástico que tentariam recuperar. Em um carrinho de mão, despejavam peças de roupa e outros itens impossíveis de consertar.
— Eu ainda mexo com a mulher: "Mas o vestido está bom aqui, você não quer?" — brinca Sérgio.
Rosângela explica a situação com uma metáfora:
— A gente está juntando os fiapos de cabelo para fazer peruca, depois da careca. A gente junta todos os fiapos de cabelo, guarda e, quando fica careca, vai ter peruca — resume, com bom humor.
Costureira, Rosângela tinha quatro máquinas de costura em casa, todas estragadas pela água. As roupas foram todas perdidas, mas o casal já ganhou várias, por doação. Faltam, porém, móveis, para poderem voltar para casa.
Apesar das perdas, a dupla mantém o riso e a vontade de seguir na Ilha da Pintada.
— Quem quer morar em ilha está sujeito a isso, mas é legal aqui — defende Sérgio.
Rosângela pondera que essa não foi uma enchente normal: antigamente, se repetia a cada 100 anos, depois a cada 80 e, agora, acha que será a cada 40 ou 50 anos. Na sua opinião, é preciso se adaptar a essa realidade.